Título: Tratores pequenos puxam indústria
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Fonte: Valor Econômico, 25/02/2009, Agronegócios, p. B8

A indústria brasileira de máquinas agrícolas jamais produziu tanto quanto em 2008. Foram 85 mil unidades. Para repetir o desempenho, o segmento teria de ter um 2009 estupendo. Por ora, com produção em queda, estoques elevados, demissões e encolhimento das exportações, a euforia virou depressão. Mas as vendas de tratores, ainda fortes, têm ajudado a evitar um cenário ainda pior.

Em janeiro, as vendas totais de máquinas agrícolas chegaram a 3.075 unidades no país. O volume representou uma queda de 17,1% em relação a dezembro, mas um aumento de 7,3% em comparação com janeiro de 2008. E na comparação entre janeiro de um ano e outro, apenas as vendas de tratores de rodas cresceram.

Segundo análise quase unânime no segmento, os programas de financiamento com juros baixos de tratores de baixa potência criados pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário e pelos governos paranaense e paulista têm sido o sopro de ânimo para a indústria. "Sem os programas, as vendas de tratores estariam em queda parecida com as de outros segmentos", diz Milton Rego, vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

As vendas de colheitadeiras estão entre as mais afetadas. A queda em janeiro foi de 26,5% em comparação com dezembro e de 27,4% em relação a janeiro de 2008, para 313 unidades no mês passado. Essa frente, uma das protagonistas das demissões anunciadas nos últimos meses, sofre não apenas com a escassez de crédito decorrente da crise econômica, mas também com a retração das exportações causada pela estiagem na Argentina, principal destino das vendas dos fabricantes brasileiros ao exterior.

O sucesso das vendas de tratores de baixa potência para produtores familiares deve ampliar o número de beneficiados pelo programa Mais Alimentos. O governo federal avalia elevar o limite de renda bruta anual exigido pelo Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf) para aumentar o acesso aos financiamentos de tratores com prazos longos e juros baratos.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário negocia com a equipe econômica do governo o aumento do limite de R$ 110 mil para R$ 300 mil ou até R$ 500 mil anuais. O principal objetivo do governo é atender aos chamados "integrados", produtores que mantêm parceria com agroindústrias de frango e suínos.

Mesmo com renda bruta anual alta, esses produtores têm um perfil mais similar ao segmento familiar do que da chamada agricultura empresarial. "Eles têm pouca terra, usam mão-de-obra familiar e lucros pequenos", diz o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel. "Querem modernizar a produção, mas está fora dos limites".

Segundo o ministro, a indústria produz até 80 mil máquinas por ano, mas teria capacidade de chegar a 105 mil. Com crédito facilitado e limites maiores aos produtores, os fabricantes ampliariam sua escala de produção, reduziriam custos e baixariam mais os preços.

A importância do Mais Alimentos para a indústria pode ser traduzida com algumas comparações. Cassel usou uma delas em reunião com ministros da área social e o presidente Lula na véspera do Carnaval. Segundo ele, dados preliminares do Censo Agropecuário de 2006, ainda inéditos, mostram que apenas 7 mil proprietários rurais compraram tratores de baixa potência de 1995 a 2006. As fazendas com tratores passaram de 512 mil para 519 mil no período.

Para comparar, Cassel lembra que nos últimos quatro meses, entre outubro de 2008 e janeiro deste ano, foram vendidos 11.355 tratores de até 84 cavalos de potência.

O programa Mais Alimentos, anunciado em junho de 2008, permite aos produtores familiares financiar até R$ 100 mil na compra de máquinas e equipamentos, correção de solo, irrigação, plasticultura, armazenagem, formação de pomares, sistemas agroflorestais e melhoria genética. Na atual safra 2008/09, o Mais Alimentos tem um orçamento de R$ 6 bilhões. Os produtores podem pagar com prazo de até dez anos, com três de carência e juros de 2% ao ano. Os descontos negociados pelo governo com as indústrias do setor chegam a até 17,5% sobre o preço de tratores, máquinas e implementos agrícolas.

No Paraná, o programa Trator Solidário financia a compra de tratores com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) com juros entre 2% e 5,5% ao ano e prazo de pagamento de dez anos, com dois de carência. A potência dos tratores limita-se às faixas de 55 e 75 cavalos de potência.

O sucesso do programa fez o governo do Estado dobrar a meta de entrega de tratores até 2010, elevando-a de 4 mil para 8 mil unidades. "Os estoques cresceram no último trimestre de 2008, mas têm caído e já estão em praticamente níveis considerados normais", diz Luiz Feijó, diretor comercial da New Holland, fabricante que tem exclusividade de entrega no programa paranaense.

Em São Paulo, o programa Pró-Trator oferece financiamento subsidiado, com juro zero, prazo de cinco anos e carência máxima de três anos, para a compra de tratores de cinco diferentes níveis de potência, que vão de 50 a 120 cavalos. Serão oferecidas 6 mil unidades por meio do programa - até a semana passada, 2,8 mil produtores já haviam se inscrito para a aquisição. Com esse ritmo - o Pró-Trator entrou em vigor em dezembro -, a Secretaria de Agricultura já aposta que os 6 mil serão vendidos neste ano, em vez de em 2010, que era a previsão inicial.

A Case, marca tradicional no comércio de tratores de potência mais elevada, passou a importar máquinas de potência menor para ampliar seu escopo de vendas. Máquinas importadas não podem ser financiadas por meio dos programas governamentais, mas existe o plano de fabricação dos tratores menores no Brasil, segundo Sérgio Ferreira, diretor geral da marca no país. "Um dos motivos é justamente para podermos participar dos programas".

Werner Santos, diretor-comercial da John Deere, atesta que os programas governamentais têm evitado o pior no setor e mantém a expectativa de retomada do crescimento ainda em 2009. "Não dá para falar em otimismo, mas há sinais de que as coisas estão um pouco menos ruins. O preço das commodities, com o atual nível de câmbio, tem aumentado a renda dos produtores", disse.