Título: Decisão torna incerto futuro da companhia
Autor: Daniel Rittner e Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2005, Especial, p. A18

A decisão do Ministério da Fazenda de não acatar decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de reajustar em mais 6,13% a tarifa da Light aumenta as incertezas com relação ao futuro da companhia no Brasil. O reajuste da tarifa permitiria reequilibrar o caixa da companhia, dando início a uma série de eventos em cascata. A Light deve US$ 1,5 bilhão, sendo US$ 660 milhões a 17 bancos credores privados, e outros US$ 400 milhões à própria controladora, a Electricité de France (EDF).

Com a decisão do Ministério da Fazenda, a distribuidora fluminense vai amargar perda estimada entre R$ 136 milhões e R$ 300 milhões na geração operacional de caixa em 2005. No ano passado, apostando nesse ganho que viria com a correção da Aneel - que foi frustrada pela redução da base de remuneração dos seus ativos - a Light anunciou o acordo com os bancos, que por sua vez está atrelado à adesão da companhia ao Programa de Capitalização das Distribuidoras, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Agora, sem um caixa que permita honrar seus compromissos, ela poderá ser "barrada" pela área técnica do BNDES ainda na fase de análise de crédito, o que inviabilizaria sua adesão. Um agravante é que esse programa - onde o BNDES faria uma capitalização na companhia - se encerra no dia 30 de junho, antes, portanto, do próximo reajuste tarifário da Light, que acontece anualmente em novembro. Até agora, a empresa tem garantidos os 6,13% que o Ministério da Fazenda não aceitou antecipar, e que serão corrigidos pela taxa Selic até novembro, como explicou ao Valor o diretor-geral da Aneel. O analista Pedro Batista, do Banco Pactual, avalia que a decisão da Fazenda poderá dificultar o processo de reestruturação financeira da Light. Ele lembra que, ao adiar o aumento em 2005, o governo estará "tirando" inflação deste ano, mas incorporando mais inflação para 2006. "O consumidor (da Light) vai pagar caro", alerta Batista. Sem gerar receitas que permitam cumprir suas obrigações como prestadora de serviço público, e ao mesmo honrar suas dívidas, a Light terá que partir, segundo fontes próximas à companhia, para uma renegociação dos termos do acordo com os bancos. Agora, terá que propor novos prazos de amortização, provavelmente aumentando a carência, com os bancos alterando suas exigências na concessão de recursos à empresa. "Não é impossível, mas deve ser difícil chegar a um novo acerto", prevê Batista, lembrando que são 17 credores. "Como ela não vai ter geração de caixa suficiente, mas tem previsão de uma entrada de receita em novembro, a questão é saber como ela vai dispor da atual receita até lá", resume o analista. No mercado, há quem ache que a Aneel errou no ano passado, quando reduziu de R$ 4,9 bilhões para R$ 3,5 bilhões a base de remuneração da Light, ambas fixadas de modo provisório. "Se era para ser provisório, porque a Aneel fez um corte desse tamanho?", questiona uma fonte do setor elétrico. "O que a Aneel estava pensando quando cortou 40% dos ativos da companhia?", questiona outra fonte, que também pediu para não ter seu nome identificado. A avaliação de ambos é que sob a gestão anterior, de José Mário Abdo, a Aneel tinha uma atuação mais parecida com a de um Procon do que com a de uma agência reguladora. (CS