Título: Militares feridos chegam a SP
Autor: Cieglinski, Thaís
Fonte: Correio Braziliense, 16/01/2010, Mundo, p. 27

Catastrofe no Haiti

Na emoção do reencontro com a família, soldados falam dos momentos de horror e caos

Em meio à dor de quem perdeu parentes no Haiti, algumas famílias de militares brasileiros puderam respirar aliviadas. Pouco depois das 12h30 de ontem, pousou na base aérea do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, o primeiro avião com 16 dos 25 militares feridos na catástrofe. Segundo o Exército, outros dois homens que embarcariam no voo decidiram ficar no Haiti. E pelo menos um dos recém-chegados já se diz pronto a retornar. ¿Gostaria de voltar para ajudar o restante da população, porque o Haiti precisa muito da força do pessoal brasileiro¿, afirmou o cabo Carlos Michael Pimentel de Almeida, 23 anos.

Com escoriações leves e arranhões, ele contou aos jornalistas que estava dormindo em um beliche na Casa Azul ¿ um dos três pontos fortes(1) do Exército Brasileiro em Porto Príncipe ¿ quando a terra tremeu. ¿Foi coisa de três segundos¿, contou o militar. ¿Eu não entendi o que estava acontecendo, pensei que era um atentado, que tinha explodido uma bomba. Quando acordei, tinha caído tudo¿, afirmou. Integrante do 5º Batalhão de Infantaria Leve de Lorena, no interior paulista, ele contou que 10 das 16 pessoas que estavam no mesmo cômodo morreram soterradas.

Assim que desembarcaram, os feridos foram recebidos por familiares e, em seguida, encaminhados ao Hospital Militar, no bairro do Cambuci, na região central da capital. Uma ambulância levou dois dos feridos, enquanto o resto do grupo foi transportado em um ônibus. No hospital, eles passariam por avaliação médica e psicológica antes de receber alta. Todos devem permanecer internados por uma semana, cumprindo quarentena, procedimento padrão seguido por todos os militares que retornam do exterior.

Os militares que desembarcaram são: sargento Wilian Mendes Pereira, sargento Tareck Souza de Pontes, cabo Daniel Coelho da Silva, tenente Rafael Araújo de Souza, sargento Gilberto Emílio Marafon, soldado Diovani de Souza Silva Thomaz, cabo Carlos Michael Pimentel de Almeida, sargento Carlos Alberto Fonseca, capitão Renan Rodrigues de Oliveira, cabo Adriano de Barros Cavalcanti, cabo Eugênio Tesaresi Neto, cabo Luís Paulo das Chagas Lima, cabo Alcebíades Orlando dos Santos Ferreira, soldado Wellington Soares Magalhães, sargento Rômulo Cézar de Carvalho e o tenente-coronel Alexandre José Santos.

1 - As bases do Brasil O Exército Brasileiro tem 1.260 homens no Haiti, distribuídos por seis unidades instaladas em Porto Príncipe, em três bases e três pontos fortes. Equipadas com refeitório, garagem e alojamento, as bases Campo Charlie, Tebo e Forte Nacional são centrais de logística situadas em áreas estratégicas da capital. Casa Azul, Fábrica de Gelo e Ponto 16 são os nomes dos pontos fortes, unidades responsáveis por realizar o patrulhamento de rua, em regime de 24 horas. O terremoto destruiu totalmente a base de Forte Nacional, e a de Tebo está condenada. Apesar das rachaduras, Campo Charlie permanece preservada.

Gostaria de voltar para ajudar o restante da população, porque o Haiti precisa muito da força do pessoal brasileiro¿

Carlos Michael Pimentel de Almeida, cabo do Exército Jobim não vê chance de achar desaparecidos

Edson Luiz

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, praticamente descartou que os militares e o funcionário brasileiro das Nações Unidas desaparecidos no Haiti sejam encontrados vivos. Ainda em Porto Príncipe, aonde chegou na quarta-feira para elaborar um plano de emergência para ajudar o país, ele tinha dito que a palavra desaparecido funciona como um ¿eufemismo¿ ¿ forma de atenuar uma ideia desagradável. Ontem, no Rio de Janeiro, repetiu que ¿desaparecido¿ seria um termo técnico para corpos não encontrados. O Comando do Exército não comentou as declarações, mas informou que as buscas continuam. Até ontem, estava confirmada a morte de 15 brasileiros: 14 militares e a fundadora da Pastoral da Criança, a pediatra Zilda Arns.

No Rio, onde visitou obras de um novo terminal no Aeroporto Internacional do Galeão, o ministro explicou suas declarações no Haiti. ¿Nós só chamamos de óbito quando se encontra o corpo. Eles (os quatro militares desaparecidos) foram soterrados. Além disso, temos o brasileiro da ONU, o Carlos (Luiz Carlos Costa), que faleceu e foi soterrado¿, observou Jobim. Costa era o segundo homem da ONU no país, e depois do terremoto não foi mais visto, assim como o coronel João Eliseu Souza Zanin, o tenente-coronel Marcus Vinicius Macedo Cysneiros e os majores Francisco Adolfo Vianna Martins Filho e Márcio Guimarães Martins. Os três primeiros são de Brasília e o outro, do Rio.

Jobim chegou na madrugada de ontem a Brasília, mas de manhã seguiu para o Rio, onde também conversou com o pessoal da Aeronáutica no Galeão, responsável pelo transporte de tropas, suprimentos e equipamentos para Porto Príncipe. Em dois dias, seis aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) decolaram da Base Aérea do Galeão com toneladas de alimentos e água, principalmente, já que esse tipo de suprimento é o mais necessário no momento. ¿A atuação da FAB tem sido extraordinária¿, elogiou o ministro.

Apesar dos atrasos nas transferências de tropa, por causa do terremoto, o Comando do Exército manterá o rodízio entre os militares que estão no Haiti. Os grupos que já estão há seis meses em Porto Príncipe vão retornar, para que outras equipes sejam enviadas. No último domingo, seguiram homens do Comando Militar do Leste (Rio e Espírito Santo). Na terça-feira, outro grupo se juntaria ao batalhão, mas por causa do terremoto ficou retido na República Dominicana.

¿A preparação pela qual passam os integrantes das diferentes missões habilita os militares a cumprirem sua missão mesmo em situação de crise¿, afirmou o Centro de Comunicação Social do Exército (Cecomsex), ao justificar o retorno das tropas que estão atualmente no Haiti. Segundo o centro, neste ano mais um efetivo seguirá para o país caribenho, entre junho e julho. O grupo que chegou ontem a São Paulo já estava na relação dos que retornariam ao Brasil.

Até agora, 14 militares morreram em decorrência do terremoto, sendo que 10 eram do 5º Batalhão de Infantaria Leve, de Lorena (SP). O efetivo desembarcado ontem era de soldados e oficiais que foram feridos na Base General Barcelar, onde está a missão de paz do Brasil. Os desaparecidos e o coronel Emilio Carlos Torres dos Santos ¿ que morreu ¿ estavam no Hotel Cristopher, que desabou com os abalos. Lá funcionava a sede da Minustah, a força de paz da ONU.