Título: Após cinco anos de alta, investimento recua
Autor: Bouças , Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2009, Especial, p. A14

A demanda doméstica por máquinas e equipamentos encolheu neste início de ano, contribuindo para a deterioração dos investimentos no país. A queda nas importações e na produção de máquinas e equipamentos, somada à retração no consumo de insumos para a construção civil e à perda de confiança dos empresários em relação ao futuro da economia, levou economistas a rever as projeções para a formação bruta de capital fixo (FBCF, que mede o que se investe na construção civil e em máquinas e equipamentos). A maioria prevê para 2009 queda no investimento de 3% em média, mas as previsões vão até 8% de queda. Se confirmado o resultado negativo, ele vai interromper cinco anos consecutivos de alta do investimento produtivo no país - a última queda ocorreu em 2003.

A Tendências Consultoria Integrada estima que, em janeiro, o consumo aparente de máquinas e equipamentos teve queda de 10% em relação a dezembro, em série com ajuste sazonal. Pelos cálculos da consultoria, também houve queda de 10% em dezembro e de 16% em novembro. Para o ano, a estimativa é de que o consumo aparente de máquinas e equipamentos seja reduzido em 12%. Esse cálculo soma a produção local e a importação e subtrai as máquinas exportadas.

De acordo com o economista da Tendências Alexandre Gallotti, a estimativa leva em consideração a expectativa de queda na produção em janeiro e a redução na quantidade importada, que foi de 12,4% naquele mês, conforme dados compilados pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex). Levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) também apontou queda em janeiro no consumo aparente de máquinas e equipamentos, de 21,6% em relação a dezembro, com ajuste sazonal, e de 11,1% comparado a janeiro de 2008, a primeira observada desde novembro de 2006 e a maior desde outubro de 2004.

O volume importado de bens de capital recuou, em janeiro, 22% sobre dezembro e 12,4% na comparação com janeiro de 2008. Os dados de fevereiro indicam nova retração. No bimestre janeiro-fevereiro, a importação, em valor, destes bens, recuou 10% na comparação com igual período de 2008, mas no mês passado a queda foi de 16%, indicando um ritmo de retração superior ao de janeiro.

"A produção de máquinas e equipamentos é muito dependente do desempenho da economia. A expectativa de piora da economia deteriora as intenções de investimentos e o segmento é o que mais sofre no momento", avalia. Para Gallotti, o setor de construção civil manterá a demanda aquecida, reduzindo o impacto da crise sobre a formação bruta de capital fixo, por conta de projetos em andamento e da aprovação de um novo pacote de estímulo ao setor pelo governo federal. Ainda assim, os investimentos no país devem encerrar o ano com queda de 2,5% em relação a 2008, conforme a consultoria.

Há projeções de queda para a formação bruta de capital fixo neste ano de até 8% (caso da Economist Intelligence Unit, divisão de pesquisa do grupo que edita a revista britânica "The Economist"), mas a maioria das estimativas situa-se entre 3% e 3,4% de queda, considerando a aprovação do programa federal para construção de 500 mil casas populares neste ano e outras 500 mil em 2010 e o andamento das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Analistas de mercado observam que obras já em andamento como shoppings e prédios residenciais terão o seu ritmo de construção reduzido neste ano, o que também contribui para a estimativa de queda no investimento total. A base alta de comparação - em 2008, a formação bruta de capital fixo cresceu 14,4% - também afetará o resultado deste ano.

A desaceleração foi significativa já no quarto trimestre do ano passado, quando esse componente do Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 4,5% em relação ao último trimestre de 2007, segundo projeções dos economistas. Nos trimestres anteriores de 2008 as variações ficaram acima dos 16% em relação ao ano de 2007.

A Rosenberg & Associados não faz projeção para o consumo aparente sem os dados de produção industrial divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas estima que tenha havido uma leve recuperação do consumo aparente de máquinas e equipamentos em janeiro, tendo em vista a forte queda ocorrida no fim de 2008. Em dezembro, o consumo recuou 16,6% em relação a novembro, com ajuste sazonal, após já ter caído 11,3% em novembro, segundo cálculo da consultoria.

"Provavelmente ocorrerá alguma recuperação porque a base é muito baixa", observa a economista-chefe, Thaís Marzola Zara. Para o ano, porém, a expectativa é de que haja retração no consumo aparente de máquinas e equipamentos e, em consequência, na formação bruta de capital fixo, isso porque o grupo representa em torno de 52% do total dos investimentos. A consultoria projeta para 2009 queda de 3,5% no investimento total, após crescimento de 16,2% em 2008.

Entre os analistas consultados, o economista-chefe da LCA Consultores Bráulio Borges é o único que prevê crescimento da formação bruta de capital fixo neste ano, de 3%. Ele estima queda nos três primeiros trimestres e forte recuperação no quarto trimestre, com expansão de 10%, mas considera que o resultado também se dará por conta da base de comparação baixa. "A recuperação do investimento e do consumo aparente só ocorrerá quando o empresariado retomar a confiança."

Borges estima para o primeiro trimestre crescimento na formação bruta de capital fixo de 1%, podendo ficar abaixo disso. Pelo cálculo da consultoria, no quarto trimestre, os investimentos cresceram 6% no quarto trimestre em relação ao terceiro. O economista-chefe pondera que houve melhora nas vendas de caminhões e ônibus, o que se reflete no desempenho de bens de capital. Para Borges, a redução na taxa básica de juros e a queda nos preços do petróleo e do aço podem ajudar a reduzir os custos do investimento e, dessa forma, estimular o ímpeto dos investidores. A aceleração dos investimentos da Petrobras também pode favorecer o resultado final da conta de formação bruta de capital fixo. O investimento programado pela Petrobras neste ano responderá por 1,4 ponto percentual do PIB, ante 1 ponto percentual no ano passado, observa Borges.

O economista também cita como fatores que podem estimular os investimentos no ano a aceleração do pacote de investimentos do governo de São Paulo e a divulgação das medidas de incentivo à construção civil. Borges inclui a licitação divulgada para compra de quase 7 mil ônibus escolares por governos estaduais e federal - volume que corresponde a dois meses de produção de ônibus no país. "Esses planos ainda não estão na conta e podem ajudar a aquecer os investimentos ao longo do ano", afirma.