Título: Estados pedem parte da verba do plano de habitação
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2009, Especial, p. A14
Depois de uma reunião de duas horas com a chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, os governadores do Sudeste e do Paraná propuseram que o governo encaminhe recursos para os Estados construírem as casas populares, em vez de centralizar as obras no governo federal. De acordo com o governador de Minas, Aécio Neves, em seu Estado seria possível construir, imediatamente, 10 mil casas populares. Segundo ele, José Serra (São Paulo) e Roberto Requião (Paraná) disseram que poderiam contribuir com outras 120 mil. "Se o governo federal tem os recursos, que repasse aos Estados, sem discutir a paternidade do programa", defendeu o tucano. Ruy Baron/Valor
Reunião para discutir o plano de habitação reuniu a ministra Dilma Rousseff, os ministros Paulo Bernardo, Guido Mantega e Marcio Fortes, e os governadores José Serra (SP), Roberto Requião (PR), Aécio Neves (MG) e Sérgio Cabral (RJ)
Aécio negou que o debate tenha sido influenciado pela presença de três presidenciáveis à mesa de reuniões - ele, Dilma e Serra. "Não estamos querendo discutir marcas, porque seria reduzir o debate a algo menor", desconversou Aécio. O plano do governo federal é construir, até 2010, 1 milhão de casas populares. Dilma tem conversado pessoalmente com os governadores para buscar apoio ao programa.
Para o tucano mineiro, o plano é ambicioso e ousado, mas seria importante aproveitar a estrutura existente nos Estados porque, descentralizado, o programa tem mais condições de sucesso. "Tudo o que é centralizado é mais moroso, mais complexo e mais difícil de ter os resultados fiscalizados", justificou. Aécio disse ainda que Minas já tem dado sua contribuição com a desoneração para o setor, outro ponto presente no programa. "Já desoneramos trinta itens da construção civil", apontou.
Ele discorda da avaliação de que a estrutura das Cohabs - programas habitacionais comuns nas décadas de 70 e 80 - seja um modelo ultrapassado. "Não falta aos Estados know-how tecnológico. O que falta aos governos estaduais são recursos. Se o governo federal têm condições de implementar este programa, repasse uma parte das verbas para os governadores, sem prejuízo do plano nacional."
Aliado do governo federal, o governador do Rio, Sérgio Cabral, minimizou a divergência, dizendo que Aécio expôs sua proposta durante a reunião e que Dilma mostrou interesse por ela. Mas defendeu que o plano deve ter um caráter nacional. "Ele será fundamental para resolver um dos grandes gargalos nacionais, especialmente no Nordeste e no Centro-Sul do país", declarou.
Cabral também elogiou a disposição do governo federal de dialogar não apenas com governadores e prefeitos, mas com os empresários da construção civil. "Dez por cento do mercado da construção é formado por grandes empresas. Os demais 90% são pequenos e médios empresários, players que ficavam esquecidos durante debates deste tipo", completou o pemedebista.
O governador fluminense adiantou alguns pontos que devem fazer parte do pacote de habitação, ainda sem data para ser anunciado. Um deles é a definição de que as residências populares para quem recebe até três salários mínimos serão completamente subsidiadas. Outro ponto destacado por Cabral é o Fundo Garantidor, com recursos do Tesouro Nacional. Ele vai evitar o que governador fluminense chamou de "subprime brasileiro", numa referência ao causador da explosão da bolha imobiliária americana. "O Fundo vai impedir a inadimplência pois o mutuário, em casos de perda de renda, terá direito a ficar até 36 meses sem pagar a sua parcela até encontrar meios de se sustentar novamente."
O governador de São Paulo, José Serra, não deu entrevistas. Mas os demais governadores, disseram que, no encontro, ele sugeriu alterações na Lei 8.666, que define as regras de licitações, para permitir a compra de materiais de construção por pregão eletrônico.
Mais cedo, Dilma e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, conversaram com empreiteiros ligados à Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC). Os empresários propuseram aos ministros a redução de 7% para 1% das alíquotas dos impostos federais que compõem a cesta de produtos da construção civil. Antes os empresários propunham que as alíquotas fossem zeradas.
Segundo o vice-presidente da CBIC, Adalberto Valadão, nem Dilma nem Mantega deram uma resposta final sobre a proposta. O empresário confirmou que os subsídios para a população carente será diretamente proporcional à renda do beneficiado, num teto que chegará aos dez salários mínimos. O tema também foi pauta da reunião da coordenação política mas, até o momento, apesar dos debates intensos, não há prazo para o anúncio do programa. "A ministra Dilma disse que está ultimando as conversas" confirmou o ministro da coordenação política, José Múcio Monteiro.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Melvyn Fox, participa do comitê anticrise que reúne representantes do setor privado e do governo e afirma que o atraso na aprovação das medidas de estímulo ao setor é resultado da falta de consenso entre governos federal e estaduais. "O governo federal quer ter o suporte dos Estados para anunciar as medidas, mas como a arrecadação de tributos caiu, está havendo resistência", afirma, referindo-se à negociação para redução da alíquota de ICMS incidente sobre materiais de construção e à cessão de terrenos para a construção de 1 milhão de casas populares.
Fox observou que as vendas de materiais de construção caem há três meses consecutivos, tendo registrado queda de 15,27% em janeiro, 4,5% em dezembro e 4% em novembro. Apesar dos atrasos, Fox acredita que o programa será concluído e apresentado ao setor privado amanhã, durante reunião do comitê anticrise que será realizada em Brasília. (Colaborou Cibelle Bouças, de São Paulo)