Título: Sob o impacto da queda do PIB, governo refaz todas as contas
Autor: Safatle, Claudia
Fonte: Valor Econômico, 12/03/2009, Brasil, p. A7

Passado o choque com a brutal queda do Produto Interno Bruto (PIB), de 3,6% no último trimestre do ano passado, a área econômica do governo refaz todas as contas para apresentar o novo Orçamento da União com as metas fiscais para este ano, no dia 20, e o Banco Central (BC) prepara o relatório de inflação do trimestre, que vai traçar os rumos da política monetária daqui por diante.

Ao mesmo tempo, o governo quer concluir até o fim do mês as medidas do pacote habitacional, que pretende construir 1 milhão de casas populares em dois anos, fortemente subsidiadas, para animar a construção civil, e discute o que fazer com os R$ 14 bilhões do Fundo Soberano do Brasil. Uma das hipóteses é retornar os recursos ao Tesouro Nacional para compor o superávit fiscal de 2009, que representa 0,5% do PIB.

Com menos crescimento, ou crescimento nenhum, haverá enorme dificuldade de cumprir a meta de superávit primário de 3,3% do PIB este ano, dada a dimensão da perda de arrecadação que está ocorrendo. Embora a meta original seja de 3,8%, o governo já mira nos 3,3% do PIB (permitido legalmente pela exclusão dos gastos com o Projeto Piloto de Investimento, PPI).

Mesmo para cumprir esse percentual, porém, terão de ser feitos cortes nos gastos públicos. O Ministério da Fazenda, frente à nova realidade da economia, considera a possibilidade de usá-lo para reforçar as receitas, em vez de incorporá-lo ao Orçamento para financiar o gasto público. Outra alternativa menos cotada é aplicar o dinheiro do Fundo Soberano em linhas de financiamento às exportações, através do Banco do Brasil, para suprir financiamentos que a crise global minguou.

A queda da taxa básica de juros, de 1,5 ponto percentual, decidida ontem pelo Banco Central, ajuda as contas fiscais, na medida que cada ponto percentual de redução da Selic representa cerca de R$ 7 bilhões em economia com o pagamento de juros da dívida pública.

Da lista de temas em discussão para readequar os gastos às receitas públicas consta ainda o que fazer com os reajustes salariais para o funcionalismo, concedidos de forma escalonada e que representam uma conta de R$ 28 bilhões para este ano. Inicialmente, pensou-se em adiar a vigência dos aumentos, hipótese ainda não totalmente afastada. Como a primeira parcela dos aumentos para a Polícia Federal já foi paga em fevereiro, a decisão, agora, ficou ainda mais difícil.

Para os economistas da Fazenda, há uma dúvida substantiva: se a retração do PIB entre outubro e dezembro do ano passado "foi ou não um ponto fora da curva". A pergunta, por enquanto, não tem resposta. O fato, porém, é que a esperança de um início de recuperação da economia no fim do primeiro trimestre deste ano, que acalentava as expectativas dos técnicos oficiais, dissipou-se. Agora, é torcer para que haja um bom crescimento no segundo semestre.

Enquanto isso, o Ministério da Fazenda e o Banco Central discutem a projeção mais realista de PIB que vai orientar as contas oficiais a partir de agora, já que os 3,2% de crescimento imaginados pelo BC em dezembro revelaram-se inviáveis.

Até às vésperas do anúncio do PIB de 2008 pelo IBGE, os técnicos oficiais estimavam uma queda do PIB na casa dos 2,5% no último trimestre do ano passado. Parte da diferença entre essa estimativa e o dado oficial do IBGE poderia ser explicada pela mudança da metodologia do instituto, que alterou o cálculo de ajuste sazonal das informações desse período.

Para estimular a economia, o governo conta não só com o pacote habitacional e uma forte queda da taxa de juros - acha que a Selic pode bater na casa dos 9% no fim do ano. Conta ainda com um "arsenal" de possibilidades, assinalou uma fonte, dentre elas a prorrogação da isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos, um estoque ainda grande de compulsórios que podem ser liberados, e os recursos do BNDES, entre outras.