Título: Decisão pode precipitar abertura de painel da soja
Autor: Assis Moreira, Mauro Zanatta e Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2005, Especial, p. A12

O governo brasileiro comemorou efusivamente a decisão da OMC contra os subsídios dos EUA aos produtores de algodão. De Genebra, o coordenador-geral do Departamento de Contenciosos do Itamaraty, Roberto Azevedo, afirmou que ficou "satisfeito" com o resultado do Órgão de Apelação da OMC. Esse resultado também condena alguns subsídios concedidos para a soja, o que pode dar fôlego para que o Brasil entre com um novo processo contra os americanos na OMC . Para Marcos Jank, presidente do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), a existência de um painel para soja depende da realização de estudos para tornar o processo viável. "Esses estudos devem ser realizados", disse. Roberto Azevedo lembrou que a decisão da OMC também ajudará países da África cuja economia é altamente dependente da riqueza gerada pelo algodão, como Benin, Costa do Marfim e Gana. A questão, agora, é o tempo que o governo dos EUA demorará para aplicar a decisão. "O governo brasileiro expressa sua confiança de que os Estados Unidos vão cumprir a decisão da OMC no menor prazo possível", disse Roberto Azevedo. "Se os americanos não mostrarem resultado até o final do ano, será difícil segurar uma explosão de casos na OMC", disse Jank. Pelas regras da OMC, há dois tempos para acabar com os subsídios americanos. Primeiro, devem acabar os subsídios à exportação. Os EUA têm até o próximo dia 1º de julho para adequar programas como o financiamento à exportação com prazos e juros distorcivos, garantias de crédito pela Casa Branca aos importadores e os pagamentos das diferenças de preços entre os mercados doméstico e internacional a indústrias e exportadores. Depois, em até 15 meses, os americanos são obrigados a retirar os chamados apoios domésticos. Azevedo explica que o haverá uma tentativa de acordo com os EUA para reduzir o prazo de aplicação da decisão da OMC. Do contrário, pode haver uma ação de implementação, com a designação de um árbitro para estabelecer um prazo final aos EUA. Ao final, se não ficar satisfeito com as modificações feitas pelos EUA, o Brasil pode pedir autorização da OMC para retaliar. Para Marcos Jank, o resultado do painel também pode servir como forma de pressão para que o executivo americano realize uma ampla reforma em seu programa agrícola. Jank lembrou que a reforma anterior, a de 2002, foi realizada em um período de superávit no país. "Hoje o cenário é de déficit. O executivo americano tem sofrido pressão para conter os gastos." Outro ponto importante da decisão, lembrou Jank, é que os programas americanos de crédito de exportação foram colocados na mesma posição de à exportação. "Esse case coloca os americanos na mesma posição da União Européia, que tem programas clássicos de subsídios à exportação", disse. Os produtores brasileiros vão acompanhar de perto o desdobramento do painel. Para Jorge Maeda, presidente da Abrapa (associação brasileira dos produtores), "foi uma decisão para escrever Brasil com letra maiúscula." "Vamos acompanhar bem de perto as mudanças na Lei Agrícola para ver se eles não vão apenas trocar o nome dos programas", afirmou o diretor-executivo da Abrapa, Hélio Tollini. "Tem muita gente contra isso lá nos Estados Unidos. Continuaremos a usar a opinião pública americana, como já fizemos, para combater essa distorção", observou Tollini. (MZ, com Mônica Scaramuzzo, de São Paulo)