Título: A volta do dinheiro
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2009, EU & Investimentos, p. D1

O mercado de previdência aberta recuperou o fôlego no mês passado, e uma parte do crescimento pode estar ligada a uma disputa mais acirrada entre as seguradoras para ganhar posições no ranking em um momento de fusões no setor de bancos. O volume de captação líquida (aportes menos resgates) dos fundos que recebem os recursos destinados aos planos PGBL e VGBL atingiu R$ 1,07 bilhão em fevereiro, quase três vezes mais que os R$ 400 milhões de fluxo do mês anterior. Na comparação com fevereiro de 2008, houve um aumento de 74%, apontam dados do site financeiro Fortuna.

Levando em conta os números agregados de janeiro e fevereiro deste ano, em que a captação líquida somou R$ 1,5 bilhão, os fundos de previdência tiveram o melhor desempenho bimestral desde 2004, e registraram crescimento de 30% em relação ao primeiro bimestre de 2008. "O processo de consolidação bancária deu mais motivação para os participantes brigarem pelos primeiros lugares no ranking", diz o executivo de uma seguradora que preferiu não ser identificado.

Itaú e Unibanco, juntos, reforçam a musculatura para brigar com a tradicional líder Bradesco Vida e Previdência, assim como se distanciam mais da Brasilprev, hoje na terceira colocação no ranking, segundo o critério da carteira de investimentos. Real Tokio Marine e Santander, que ocupavam a sexta e a sétima posições, respectivamente, passam, com a fusão, ao quarto lugar, à frente da Caixa. Vale lembrar que, no segmento de previdência, a sobreposição de clientes é pequena, ou seja, as carteiras, em geral, se somam quando há fusão.

"Com a união, Itaú e Unibanco ficam mais fortes e, se continuarem registrando taxas de crescimento como as atuais, em dois anos chegarão à liderança", destaca o executivo. Pelos números da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), o Bradesco, apesar de manter a liderança, diminuiu sua fatia na carteira total de investimentos ao longo do ano passado, de 41,03% no fim de 2007 para 37,58% em dezembro último. A participação do Itaú passou de 16,40% a 17,20% no mesmo período. Se considerada a fatia do Unibanco, a parcela do Itaú sobe para 23,72%. Já a Brasilprev teve sua fatia elevada de 12,72% para 13,83% na mesma comparação.

Tanto o Itaú quanto a Brasilprev registraram volume recorde de captação no ano, segundo seus representantes. "Este ano começou forte, superando nossas melhores perspectivas", afirma o diretor comercial da Brasilprev, Marco Barros. O crescimento da captação líquida, conta o diretor, ficou acima de 50% no bimestre na comparação com o mesmo período do ano passado. Ainda segundo Barros, "fevereiro foi surpreendente, se não o melhor, o segundo melhor mês da história da Brasilprev".

O diretor executivo de previdência do Itaú, Osvaldo do Nascimento, afirma que também registrou contribuição recorde em fevereiro no Itaú Personnalité, o segmento do varejo de alta renda. "A maior concorrência entre os players é um dos componentes desse crescimento, já que força as empresas a buscarem mais eficiência, mas não o principal", ressalta Nascimento.

Na opinião do consultor sênior da Mercer, especialista em previdência, André Maxnuk, é pouco provável que uma ação de marketing tenha dado resultado tão rapidamente. "O crescimento da previdência depende muito mais da consolidação da economia", diz. Mas ele admite que pode haver uma briga maior entre as instituições pelas primeiras posições, ainda que não veja a competição jogando a expansão do mercado muito para cima.

Maxnuk afirma ainda que mudanças na divisão do bolo da previdência estão associadas às políticas de cada uma das seguradoras no médio prazo. "A Brasilprev cresceu bastante no último ano não por conta de aquisições, mas pela política agressiva de vendas", exemplifica.

A explicação é que, no ano passado, o Banco do Brasil, principal canal de distribuição dos planos da Brasilprev, adotou a estratégia de focar a venda de seguros e previdência. Mais de 7 mil gerentes do banco passaram por treinamento específico em 2008. Barros conta que a Brasilprev vem investindo no conceito de "venda consultiva" há cerca de três anos, que pressupõe educação contínua tanto de quem compra quanto de quem faz a oferta da previdência. "A ideia é oferecer a melhor solução para o cliente e evitar deixá-lo exposto a situações de emergência em que precise resgatar os recursos da previdência", diz.

A Bradesco Vida e Previdência não viu muitas oscilações no volume de contribuições, salvo em alguns dias de outubro , afirma o diretor-presidente Marco Antonio Rossi. "As contribuições (brutas) têm se mantido na faixa de R$ 900 milhões por mês", diz. Em fevereiro, o crescimento foi de cerca de 5%. Segundo Rossi, a Bradesco adota uma estratégia comercial para o segmento de vida e previdência bastante previsível e constante ao longo de todo ano. "Não temos uma política sazonal", ressalta.

Ele reconhece, porém, que há uma forte competição nesse mercado, uma vez que todas as grandes seguradoras e bancos passaram a olhar a área de vida e previdência como uma oportunidade de expandir, dada a maior conscientização da população com o risco financeiro que a longevidade traz. "O potencial de crescimento orgânico é grande."

Na avaliação de outro executivo que prefere não ser identificado, num primeiro momento, a estratégia das seguradoras será buscar uma maior integração com o canal bancário de distribuição. Só então, diz, será possível esperar uma disputa na esfera de preços. "Não será uma guerra generalizada, assim como a briga deverá se restringir ao topo da pirâmide (onde estão os mais endinheirados)", ressalta.

O raciocínio faz sentido, uma vez que o crescimento do mercado está apoiado especialmente no segmento de clientes com riqueza constituída. "O grosso da captação vem de pessoas que já têm uma reserva e estão buscando a previdência como uma alternativa para maximizar os retornos, graças aos benefícios tributários", afirma Barros, da Brasilprev. A alíquota mínima da previdência é de 10%, para 15% dos fundos de investimento. Por isso, em número, acrescenta o executivo, a parcela de clientes que contribuem com pequenos valores todo mês é muito maior, mas os aportes são bem menos representativos.

Nascimento, do Itaú, lembra ainda que muitos investidores que partiram para aplicações em CDBs, para aproveitar as altas taxas oferecidas pelos bancos, hoje estão buscando novas alternativas. "Com a menor atratividade dos CDBs, o dinheiro começa a migrar para outras aplicações e a previdência se destaca."