Título: Fundações podem ter mais liberdade
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2005, Finanças, p. C1
Os fundos de pensão terão cada vez menos restrições à liberdade de decidir sobre seus investimentos, se depender do atual comando da Secretaria de Previdência Complementar (SPC). Programado para este mês, o próximo ajuste na resolução que regulamenta esses investimentos ainda será "tópico", anuncia o titular do órgão, Adacir Reis. A agenda de médio prazo da SPC, entretanto, já inclui o debate sobre uma alteração mais profunda, que permita às entidades desenquadramentos propositais e planejados nos limites de aplicação. Como regra geral, os limites continuarão a existir. "Mas poderemos admitir que eles sejam ultrapassados por conveniência do plano de benefícios e mérito do investimento", disse Reis, em entrevista ao Valor. Assim, se os administradores de um fundo provarem que será um excelente negócio concentrar mais do que o permitido em ações de determinada empresa ou em determinado empreendimento, a Secretaria poderá autorizá-lo a fazer isso. A autorização seria dada pela SPC caso a caso, por delegação do Conselho Monetário Nacional (CMN), que regula os investimentos das entidades fechadas de previdência complementar. A mudança a ser aprovada pelo Conselho ainda este mês já é uma flexibilização. Será incluída na norma a possibilidade de a SPC conceder, também caso a caso, prazo superior ao permitido para correção de desenquadramentos não planejados nos limites. A superação não proposital dos percentuais máximos pode acontecer, por exemplo, quando há grande valorização de um ativo, explica o secretário. Pela norma em vigor, o prazo é de 180 dias, o que nem sempre é suficiente para que uma entidade se desfaça de um ativo ou saia de uma aplicação sem levar prejuízo. Afinal, quando se sabe que um grande fundo precisa vender uma grande quantidade de ações, o preço dos papéis tende a cair. "Os limites não podem ser um fim em si mesmo. São apenas um meio de proteger o patrimônio dos participantes, via diversificação de riscos", diz Reis. Portanto, defende ele, se há situações em que a exigência de observância do limite pode causar prejuízo, é preciso dar a elas um tratamento diferenciado. Foi com essa mesma preocupação, de não impor prejuízos, que o CMN admitiu, para 17 fundos, cronogramas específicos de adaptação à última norma que alterou limites, a Resolução 3.121, editada em setembro de 2003. Mas isso só valeu para as situações então existentes. A proposta agora é fazer da possibilidade de concessão de prazos diferenciados uma norma permanente, para acomodar situações de desenquadramento que ocorreram depois da 3.121 e que ainda vierem a ocorrer. Para o titular da SPC, o debate sobre uma flexibilização maior dos investimentos já é possível porque foi antecedido da criação de um novo regime repressivo contra irregularidades e má gestão, em fins de 2003. A responsabilidade e as punições passaram a recair sobre as pessoas físicas dos dirigentes, e não mais sobre a pessoa jurídica do fundo, lembra ele. Além disso, a SPC passou a cobrar das entidades uma definição muito clara das responsabilidades e da alçada de decisão de cada dirigente, para poder punir, em caso de irregularidade. Outra pré-condição já obtida para a concessão de mais liberdade, afirma Reis, é a exigência de que todos os fundos tenham um conselho fiscal, com no mínimo um terço dos conselheiros escolhidos pelos participantes. Antes, podiam existir conselhos fiscais formados só por pessoas escolhidas pelo patrocinador do fundo. Não menos importante, na avaliação do secretário, foi a concessão de poder para que esses conselhos atuem como órgão de controle interno. O aprimoramento das normas prudenciais envolveu não apenas os ativo. Do lado do passivo, ou seja, das obrigações relativas a benefícios concedidos e a conceder, o gerenciamento de riscos passou a ser mais cuidadoso. "Criamos uma nova cultura de identificar, monitorar e neutralizar riscos", diz Adacir Reis. As recentes atualizações de índices de mortalidade, que levaram alguns fundos a apresentar déficit atuarial ou redução de superávit, são reflexo dessa postura mais conservadora na mensuração de riscos, segundo o secretário. "Não podemos punir as entidades por adotar uma postura mais prudente na avaliação de suas obrigações atuariais", pondera. Há, ainda, um processo de reestruturação interna da SPC, que lhe dará melhores condições de fiscalização. A secretaria está sendo transformada numa autarquia. Com a criação da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), sucessora da SPC, a equipe de fiscalização direta passará de 23 para 92 auditores. Outro fator que permite dar maior liberdade aos fundos para investir é o aprimoramento da fiscalização indireta, com a modernização dos sistemas e a recepção de informações on-line, das câmaras de ativos, como Cetip e a BM&F, sobre a posição de investimentos dos fundos.