Título: Adesão à renegociação chega a 76%
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 04/03/2005, Finanças, p. C10

A Argentina anunciou ontem ter conseguido uma adesão de 76,07% à proposta de reestruturação de sua dívida com os credores privados. De acordo com os dados preliminares divulgados pelo presidente Néstor Kirchner e pelo ministro da Economia, Roberto Lavagna, a troca dos bônus significará uma redução da dívida privada, segundo seu valor presente, de US$ 102,5 bilhões para US$ 35 bilhões. Os dados definitivos serão divulgados no próximo dia 18, mas Kirchner e Lavagna disseram que a taxa já aferida é suficiente para encerrar o default declarado em dezembro de 2001. Segundo Lavagna, com a troca a relação entre o total da dívida e o PIB cai de 113% em dezembro de 2001 para 72%. A operação também resultou na diminuição dos débitos denominados em moeda estrangeira. Lavagna disse que em 2001 a proporção dos títulos em pesos sobre o total da dívida era de 3%, e que agora essa cifra chega a 37%. Nenhum dos dois funcionários falou sobre o que ocorrerá com os credores que decidiram ficar de fora da operação, e espera-se que o FMI pressione o governo para que reabra a oferta. Lavagna deve iniciar no domingo os contatos em Washington para retomar o diálogo com o FMI, suspenso desde o anúncio da reestruturação. Acredita-se que o percentual de adesão à reestruturação conseguido tenha sido suficiente para ganhar o aval da instituição multilateral. Celebrando o resultado, Kirchner disse que a reestruturação mostra que é possível adotar "soluções argentinas para os problemas argentinos" e fez um discurso com tom político forte, criticando, em alguns casos nominalmente, aos que prognosticaram o fracasso da operação. "É fácil refugiar-se a crítica, adular o fracasso e falar mal do governo. A aposta ao fracasso de quem governa é uma aposta ao fracasso de todos", disse. Para os credores que aderiram à operação ele disse terem "se associado ao crescimento argentino" e afirmou que o país adotará uma estratégia de reduzir o endividamento externo, sem recorrer aos mercados de capitais internacionais. Falando a uma platéia que incluiu todo o seu gabinete, governadores, prefeitos, parlamentares, empresários e sindicalistas, Kirchner também disse que o caso argentino deve servir como exemplo para reestruturações futuras. Lavagna afirmou que credores com uma menor quantidade de bônus ou que compraram os papéis por seus valores originais devem ter um tratamento preferencial em relação aos grandes investidores e àqueles que adquirem os títulos com fim especulativo. O ministro disse que outra das lições que devem ser aprendidas com o caso argentino é que só com crescimento econômico um país é capaz de gerar os recursos para honrar seus compromissos. "A concepção de que só se eu consigo crescer posso pagar havia sido substituída pela crença de que um programa econômico é viável se tem financiamento", afirmou, referindo-se à época em que seu país emitiu dívida e recebeu pacotes de ajuda financeira que retardaram o colapso da conversibilidade. A modificação dessa visão, segundo ele, "talvez seja o maior aporte argentino ao desenvolvimento dos mercados financeiros internacionais".