Título: Vitória de Serra em São Paulo muda humor do PSDB em relação a 2006
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2005, Política, p. A6

Dois anos de governo Lula mudaram o humor do PSDB em relação à sucessão presidencial de 2006. Antes conformados a fazer figuração e assentar as bases de uma candidatura viável para 2010, os tucanos agora vislumbram uma chance real de retomar o Palácio do Planalto em outubro do próximo ano. Contrariando o figurino de quem está sempre em cima do muro, têm até um "candidato natural", Geraldo Alckmin - e um slogan: "Lula cá", cunhado por Arnaldo Madeira, o chefe da Casa Civil do governador de São Paulo. Trata-se, é evidente, de um contraponto ao "Lula lá" que embalou as quatro campanhas do presidente e levou o ex-metalúrgico de São Paulo para Brasília. "Vamos trazer Lula de volta a São Bernardo", traduz o autor do slogan. Madeira assegura que sempre teve "claro" ser possível "apear o PT do poder em 2006". O fato é que só após a vitória de José Serra para a Prefeitura de São Paulo o PSDB sentiu-se animado a configurar uma estratégia para tomada do palácio de Lula. "Houve uma mudança interna de clima", diz o governador de Minas Gerais, Aécio Neves. "O governo é ineficiente e só bons resultados na economia podem não ser suficiente para levar Lula a um segundo mandato". O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), faz eco: "Nós fomos para o segundo turno em nossa pior hora, a eleição de 2002". "Agora recuperamos a feição urbana, a ineficiência do governo é um fato e as melhores projeções de Lula nas pesquisas são de 52%", raciocina. Sem o estresse verificado nos dois últimos anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, o que atualmente divide os tucanos é a oportunidade da data para o lançamento do candidato. Um debate cujo pano de fundo é revelador: embora praticamente todos digam que Alckmin é, no momento, o "candidato natural", há tucano emplumado querendo ganhar tempo para avaliar as próprias possibilidades. Dificilmente o PSDB solta os rojões do Ano Novo sem pelo menos sinalizar o nome que encabeçará a chapa tucana em 2006. Se dependesse só do ex-governador de Mato Grosso Dante de Oliveira o nome de Alckmin começaria a ser trabalhado já. O mais provável é que essa decisão saia entre setembro e outubro, época da preferência, por exemplo, de Fernando Henrique. Uma questão de oportunidade. Outubro e novembro são as datas reservadas pela Justiça Eleitoral para a veiculação das inserções diárias e do programa partidário tucano. As experiências de Fernando Collor e da senadora Roseana Sarney (PFL-MA) já demonstraram o poder de fogo dos programas partidários para a exposição de um candidato. Em novembro, o PSDB também realiza sua convenção nacional. "Não precisamos nos afobar", diz Arnaldo Madeira, peça-chave de uma candidatura que Geraldo Alckmin já nem procura disfarçar. Recentemente, o governador paulista esteve em um comício no interior do Rio Grande do Sul; nos próximos dias estará nos Estados Unidos, onde tem encontro previsto com figurões de sobrenome Bush e fará uma visita a um templo da imprensa, o jornal "New York Times". Prevista para o Carnaval passado, o rali de Alckmin ficou no quilômetro zero, mas não foi cancelado. Aguarda apenas melhor oportunidade. O problema de Alckmin é se tornar conhecido nacionalmente. Nas montanhas de Minas, Aécio Neves guardava-se para 2010. Depois da eleição municipal do ano passado, farejou que a data pode ter sido antecipada em quatro anos. "Não vamos entrar para fazer figuração, existe uma chance real", diz. O governador, no entanto, recomenda a velha prudência mineira: outubro e novembro seria o momento de "afunilar" a discussão interna no PSDB, mas a escolha do candidato ficaria para o primeiro semestre de 2006. Muito embora fale a linguagem comum do PSDB - Alckmin é o "candidato natural" -, Aécio avalia que todos os potenciais candidatos tucanos continuam no páreo: o governador paulista, o senador Tasso Jereissati (CE) e até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que jura não ser candidato a nada em 2006. Calculadamente, foi Fernando Henrique quem desencadeou a discussão sucessória. No final de novembro, quando discursou no Instituto Sérgio Motta: "Nós ficamos com medo de um tigre de papel. Não podemos continuar com esse medo. É preciso dizer claramente que o rei está nu". A rodada deste semestre de inserções e do programa partidário do PSDB será entre maio e junho. Seguirá a trilha aberta por FHC: tentar mostrar a "ineficiência" do governo Lula em contraposição às gestões nos oito Estados que os tucanos governam. Mas, sobretudo, tentar transmitir a idéia de que o governo e Lula são uma coisa só. Ou seja, desconstruir a percepção detectada nas pesquisas de que o governo pode ser ruim, mas Lula é muito melhor.