Título: Kirchner decide evitar negociações comerciais antes de visita ao Brasil
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Fonte: Valor Econômico, 17/03/2009, Brasil, p. A2

Após obter garantia do governo brasileiro de que apoiará a restrição "voluntária" de exportações de alguns setores industriais para a Argentina, a presidente Cristina Kirchner tomou providências para evitar que os contenciosos comerciais entre os dois países atrapalhem a visita ao Brasil, no fim da semana. Foi excluída da agenda dos próximos dias qualquer reunião entre empresários e governos dos dois países destinada a negociar as limitações de comércio entre os maiores sócios do Mercosul.

O governo Kirchner tem a preocupação de evitar más notícias durante a visita, como seria um eventual impasse na negociação de restrições de exportação entre empresários argentinos e brasileiros. Os argentinos querem impor limites às vendas, no mercado local, de mercadorias brasileiras de setores como calçados, têxtil, linha branca, papel, motocicletas, tratores, máquinas agrícolas e produtos de alumínio. O setor privado brasileiro pediu ao governo que incluísse restrições às vendas de farinha de trigo, leite, vinhos e aerossóis argentinos ao Brasil.

Estava marcada reunião para iniciar discussões entre os empresários, sob coordenação dos governos, na quinta-feira. Foi cancelada, a pedido do governo argentino, que adiou o encontro para dia 24. Também por decisão dos argentinos, foi excluída da visita que Cristina Kirchner fará à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) a realização, proposta pelos empresários paulistas, de reuniões "setoriais" entre executivos, destinadas a discutir os problemas localizados de comércio entre os dois países e formular uma estratégia comum para as negociações internacionais de liberalização comercial, a começar pela Organização Mundial de Comércio (OMC).

Os argentinos quiseram manter apenas a visita da presidente, um seminário de caráter acadêmico e rodas de negócio - reuniões de promoção comercial entre empresas argentinas em busca de mercados e eventuais compradores brasileiros. Nada que possa prejudicar o êxito da visita, argumentam os assessores da presidente. Enquanto isso, a Argentina segue com barreiras não-tarifárias, administrando a entrada de importações no país por meio de licenças não-automáticas, emitidas pelos métodos tradicionais, de formulários em papel. A primeira reunião para definir uma espécie de cota para produtos brasileiros deve se realizar em Brasília, na próxima semana.

"Temos de organizar essas reuniões. Acho possível fazer já na próxima semana, até para atender à preocupação dos empresários brasileiros", disse ao Valor o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, ao confirmar o adiamento dos encontros de empresários.

Ele informou que o ministério realiza estudos para dimensionar o mercado argentino para os produtos sujeitos às limitações de importação, verificar a participação dos exportadores brasileiros e de outros países, e medir a capacidade da indústria local para atender a demanda. "Para ser bem conduzida, uma reunião dessas precisa de mais dados do que dispomos hoje", comentou. Ramalho argumenta que ambos os países têm interesse em chegar a um acordo, que reduza os efeitos da crise, em um "ano atípico". Em 2009, as exportações e importações entre os dois sócios caíram mais de 40%, depois de um ano em que o comércio bilateral chegou a um recorde de mais US$ 30 bilhões.