Título: Supremo decide que produtores de arroz terão de deixar reserva indígena
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2009, Brasil, p. A2

Ruy Baron/Valor Ministro Carlos Ayres Britto: não há mais clima para conflitos na região

O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, ontem, o julgamento sobre a reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, e, com isso, os produtores de arroz da região deverão deixar as terras dos índios. O ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação movida pelos senadores de Roraima Augusto Botelho (PT) e Mozarildo Cavalcanti (PTB) contra o decreto que demarcou as terras, vai definir a forma de retirada dos arrozeiros com o ministro da Justiça, Tarso Genro.

Britto acredita que não há mais clima para conflitos na região, pois todos os problemas envolvendo as terras da reserva estão sendo solucionados pela Justiça. "Se o tribunal definiu, está definido", disse o ministro do Supremo. Segundo ele, os arrozeiros que pleiteiam indenizações por benfeitorias feitas nas terras poderão ingressar com ações na Justiça Comum. "Quem plantou foi por sua conta e risco", completou Britto.

Por dez votos a um, o tribunal aprovou a demarcação contínua das terras, mas definiu 19 condições para tanto. O STF considerou que a região onde se localizada a reserva pertence à União Federal, mas o seu usufruto é dos índios. Assim, o governo federal poderá entrar na área da reserva se concluir que há a necessidade de utilizar o potencial energético dos rios, ou para fazer a pesquisa e a lavra das riquezas minerais. Em ambos os casos, é necessária a autorização do Congresso Nacional. O Exército também poderá entrar na reserva, independentemente de consulta às comunidades indígenas e à Funai.

O STF vetou a cobrança de qualquer pedágio para o trânsito na região, bem como a atividade de garimpagem pelos índios. Os ministros ressaltaram que o veto à cobrança de tarifas incide sobre a utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público.

O julgamento sobre a reserva Raposa Serra do Sol começou em agosto do ano passado, com o voto de Britto a favor da demarcação contínua. Em dezembro, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito apresentou uma lista de condições para a implementação da reserva e seu voto foi seguido por Britto e por outros seis ministros, totalizando uma maioria parcial de 8 votos entre 11. Na quarta-feira, o ministro Marco Aurélio Mello votou pela anulação da demarcação, por considerar que houve irregularidades na confecção dos laudos que definiram as terras aos índios. Ontem, o ministro Gilmar Mendes, presidente do STF proferiu o voto final na questão, definindo o placar final em dez votos a um.

Mendes alertou para a necessidade de todos os envolvidos se manifestarem nos processos de demarcação. Ele reiterou que essa decisão servirá de parâmetro para as outras discussões envolvendo terras indígenas e, nesses processos, é necessário garantir a ampla defesa a todos os afetados. O ministro classificou como falso o debate a respeito da demarcação contínua ou "em ilhas". "O debate quanto a se o texto constitucional decidiu pelo modelo de área contínua parece uma colocação inexata", afirmou. Se o debate fosse esse, seria preciso, segundo ele, unir todas as áreas indígenas de Roraima, que juntas tomam mais de 47% do Estado.

Após o julgamento, o presidente do STF disse que os pedidos de indenização dos arrozeiros serão discutidos na Justiça Comum e que o importante, para ele, é que a decisão fixou parâmetros para todos os envolvidos. "Estabelecemos limites para todos os lados em conflito."