Título: Lula eleva tom do discurso
Autor: Foreque, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 13/02/2010, Cidades, p. 33

Presidente revela que ficou chocado com os vídeos em que o governador afastado aparece recebendo dinheiro e diz esperar que a prisão sirva de exemplo para o restante do país

Goiânia (GO) ¿ O presidente Luiz Inácio Lula da Silva endureceu o discurso ao comentar, em entrevista a duas rádios de Goiás, ontem, a prisão preventiva do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda. O presidente afirmou ter ficado ¿chocado¿ com o vídeo em que o político aparece recebendo maços de dinheiro do ex-secretário de Relações Institucionais do GDF, Durval Barbosa. ¿Eu espero que o que aconteceu com o Arruda sirva de exemplo para que não possa mais se repetir em lugar nenhum¿, afirmou o presidente.

Lula defendeu, mais uma vez, projeto de lei de autoria do Executivo que torna hediondo o crime de corrupção. Ao agravar a punição para a prática de corrupção ativa e passiva, peculato e concussão, o crime torna-se inafiançável. O projeto foi enviado no fim do ano passado ao Congresso Nacional, mas propostas semelhantes já tramitam no Legislativo.

¿Nós precisamos ser mais duros com a corrupção, com o corrupto e com o corruptor¿, disse o presidente. Lula concedeu a entrevista pela manhã, antes da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello de manter o governador afastado na prisão.

O presidente preferiu não adiantar sua posição caso o STF aceite o pedido de intervenção federal feito pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. A solicitação ainda precisa ser apreciada pela Corte suprema. Lula se limitou a dizer que, ¿se não houver nenhuma acusação contra o vice-governador do Estado, é de direito que ele possa assumir o governo¿. A administração da capital federal está sob a direção do vice Paulo Octavio desde ontem, após o governador José Roberto Arruda entregar uma carta em que comunicou seu afastamento do cargo. ¿Agora, isso está na mão da justiça. O presidente da República apenas espera que haja a decisão¿, afirmou Lula.

Pirotecnia Em entrevista a rádios goianas, o presidente afirmou ainda que a Polícia Federal não fez ¿pirotecnia¿ com a prisão do governador do Distrito Federal. Ontem, logo que tomou conhecimento da decisão do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Fernando Gonçalves, o presidente agiu para evitar qualquer tumulto. Lula ligou para o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, e para o diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, recomendando que não houvesse espetáculo na ação. ¿O que a Polícia Federal fez foi aceitar um pedido do próprio Arruda, para se entregar na Polícia Federal, sem precisar sair de casa algemado¿, afirmou ontem o presidente. Lula, que ainda teria recomentado para que não tripudiassem o ¿escândalo alheio¿.

Logo depois de a Polícia Federal deflagrar a operação Caixa de Pandora, em novembro passado, Lula preferiu não comentar o episódio. ¿A imagem não fala por si. O que fala por si é todo o processo de apuração. É todo o processo de investigação. Quando tiver toda a apuração e a investigação terminadas, a Polícia Federal vai ter que apresentar o resultado final do processo. Aí você pode fazer juízo de valor, e mesmo assim quem vai fazer é a Justiça¿, afirmou o presidente na ocasião.

Eu espero que o que aconteceu com o Arruda sirva de exemplo para que não possa mais se repetir em lugar nenhum¿

Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República

Manifestantes festejam com champanhe

Mariana Branco Juliana Boechat Iano Andrade/CB/D.A Press Cerca de 30 pessoas ainda estavam no mezanino do STF na manhã de ontem. Eles fizeram vigília durante a noite de quinta para sexta-feira

Iano Andrade/CB/D.A Press Quando souberam que o Supremo negaria o habeas corpus a Arruda, os participantes do protesto abriram garrafas de espumante e comemoraram

Edílson Rodrigues/CB/D.A Press Enquanto isso, na PF, no Setor Policial Sul, manifestantes pró-governador levaram faixas de apoio à permanência de Arruda no cargo

Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press Protesto bem-humorado no início da manhã no Complexo da PF: um homem entregou aos seguranças um panetone que deveria ser servido no café da manhã de Arruda

Manifestantes acampados no mezanino do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF) desde o fim da tarde de quinta-feira, dia em que foi decretada a prisão do governador afastado do Distrito Federal José Roberto Arruda, comemoraram com gritos e aos pulos a notícia de que o ministro Marco Aurélio Mello havia o negado pedido de habeas corpus, impetrado pela defesa no próprio dia da prisão.

O grupo de cerca de 30 pessoas, composto em sua maioria por estudantes e representantes de entidades sindicais, ficou sabendo da informação às 12h. Fontes próximas ao ministro revelaram à imprensa o teor da decisão antes do anúncio oficial pelo STF, que só ocorreu por volta das 16h. Os manifestantes que tinham acesso à internet no local espalharam a notícia entre os demais.

¿Vamos brincar o carnaval com muito mais alegria. A gente não imaginava que teria notícias tão boas¿, afirmou o estudante de Letras da Universidade de Brasília Diogo Ramalho, 26 anos, um dos coordenadores do Movimento Fora Arruda, o mesmo que promoveu a ocupação da Câmara Legislativa do DF e vários outros protestos. De acordo com ele, no entanto, as ações pedindo a punição dos envolvidos em denúncias de corrupção devem continuar. ¿Nossa reivindicação sempre foi pela saída do (governador em exercício) Paulo Octávio e dos 10 deputados citados (na Operação Caixa de Pandora). Vamos até o fim¿, declarou.

Além de palmas, saltos e abraços, a comemoração pela manutenção da prisão no STF incluiu a abertura de duas garrafas de champanhe pelos manifestantes. No momento em que eles brindavam, carros que desciam a Esplanada dos Ministérios saudaram o grupo buzinando.

Terminadas as celebrações, os manifestantes se reuniram em assembleia para decidir se deixariam ou não o mezanino do prédio do Supremo. O temor dos estudantes era de que a decisão de Marco Aurélio Mello de negar o habeas corpus a Arruda pudesse ser revertida durante o feriado de carnaval, com a defesa do governador afastado recorrendo ao colegiado do STF. Entretanto, quando os participantes do protesto se asseguraram ¿ mais uma vez com o auxílio do acesso à internet e com telefonemas a amigos e conhecidos ¿ de que o Pleno não poderia se reunir no feriado, eles decidiram se desmobilizar. Colchonetes, barracas, faixas, sacos de pão, garrafas de refrigerante, tudo foi recolhido do chão do mezanino e, antes de irem, os estudantes limparam com rodo e vassouras o champanhe derramado.

Às 15h, alguns integrantes do Movimento Fora Arruda se reuniram em frente à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no início da L2 Sul, que havia anunciado que expediria um pedido de impeachment contra o governador em exercício Paulo Octávio. A intenção era apoiar a iniciativa da entidade. Para hoje, dia do aniversário do vice-governador que tomou a frente do Executivo local, está programada uma manifestação diante do edifício do Brasília Shopping, um dos empreendimentos da construtora Paulo Octávio. Nos próximos quatro dias, o grupo promete ainda marcar presença nos blocos tradicionais de rua do carnaval do DF, como Mamãe Taguá, Pacotão e Galinho de Brasília.

Segurança Os integrantes da segurança do prédio do Supremo Tribunal Federal observaram a distância, sem intervir, a manifestação dos integrantes do Movimento Fora Arruda. Às 9h, todo o edifício foi circundado por grades de metal. De acordo com a assessoria do STF, no entanto, a colocação e a retirada diária das cercas são procedimentos de rotina e não tiveram relação com a presença dos estudantes.

Três carros da Polícia Militar ficaram parados durante toda a manhã na área imediatamente frontal ao prédio, mas os policiais também não interferiram no protesto. À tarde, a PM havia recebido ordem para desocupar o mezanino da Suprema Corte, mas os militares não precisaram agir porque os manifestantes já se preparavam para sair do local.

Polícia Federal Manifestantes pró-Arruda passaram o dia todo diante do Complexo da Polícia Federal, no Setor Policial Sul. As primeiras pessoas chegaram por volta das 7h30. Eles colocaram faixas com frases de apoio ao governador na frente das com os dizeres contra a permanência de Arruda no GDF. Com megafones, gritaram palavras de ordem por mais de uma hora. ¿Arruda, vai dar tudo certo¿, repetia uma das participantes do ato.

Apenas uma pessoa esteve na PF para se manifestar contra o governador afastado, mas tudo com muito humor. Às 8h, um homem que se identificou como Eduardo Xavier tentou entrar no complexo policial com um carro escuro. Quando foi abordado pelo segurança, disse que precisava entregar o café da manhã de Arruda: um panetone e uma garrafa de espumante. Mesmo barrado, Eduardo não se irritou. Soltou fogos de artifício e gritou trechos da música Que País é Esse?, da Legião Urbana.

Deu no... The New Work Times

O maior e mais importante jornal dos Estados Unidos publicou apenas em sua edição online a notícia da prisão do governador. ¿Arruda está em cela especial por possuir diploma de curso superior¿, destacou. A reportagem informa ainda que o escândalo de corrupção no DF forçou Arruda a desistir da reeleição e afetou seriamente o DEM, partido de oposição a Lula.

BBC

A emissora pública britânica afirmou que José Roberto Arruda se entregou à polícia após ter a prisão preventiva decretada. ¿Ele é acusado de receber suborno de construtoras e de tentar subornar uma testemunha no inquérito de corrupção. Sua justificativa para o vídeo em que aparece recebendo dinheiro ¿ que seria para comprar panetones ¿ foi ridicularizada em todo o país.¿

The Washington Post

O principal jornal da capital dos Estados Unidos destacou em sua edição online, ainda na quinta-feira, a prisão de Arruda por tentativa de obstrução do trabalho da Justiça. ¿O governador já atravessava uma turbulência após ser flagrado em vídeos secretos recebendo pacotes de dinheiro. As imagens foram para a internet e causaram grande estardalhaço.¿

English

O site de Pequim publicou a notícia da prisão de Arruda com arquivos de áudio.

A notícia dá conta que o governador teria tentado subornar o jornalista Edson Shadow (Sombra), uma testemunha-chave no processo da Operação Caixa de Pandora. ¿Antes de se entregar à polícia, Arruda disse que jamais renunciaria ao cargo.¿

Herald Tribune

Em texto no qual são citados Durval Barbosa, Antônio Bento da Silva, Edson Sombra e a influência política de Arruda sobre a Câmara Legislativa, a versão para a América Latina do jornal faz extenso relato do caso. ¿O governador se recusava a aparecer em público e teimosamente se negava a pedir para sair do cargo.¿

Clarín.com

Com trechos degravados de vídeos, que desencadearam a crise no governo do DF, reportagem publicada no principal jornal argentino dá os valores da tentativa de suborno a Sombra. O texto também faz um panorama sobre a Operação Caixa de Pandora. ¿As imagens mostram Arruda literalmente com a mão na massa¿, ironizou a correspondente Eleonora Gosman.

El Pais

O correspondente do jornal espanhol no Brasil, Juan Arias, assina a reportagem publicada na edição online, na qual apresenta a análise de cientistas políticos da PUC-RJ e da UFRJ sobre a detenção de Arruda. ¿O presidente Lula, com quem Arruda mantinha relação amistosa, se mostrou abatido e comentou que a prisão não favorece à consciência política do país¿, escreveu Arias.