Título: Petrobras adota amplo plano de redução de custos
Autor: Santos , Chico
Fonte: Valor Econômico, 23/03/2009, Empresas, p. B7

A Petrobras decidiu usar toda sua artilharia para cortar em pelo menos 30% os custos dos produtos e serviços que lhe são fornecidos. Ela chamou fornecedores para renegociar os contratos mais recentes e cancelou licitações ainda em curso na expectativa de reduzir o custo final dos projetos. Poder de fogo para abalar o mercado não lhe falta. A estatal é responsável por grande parte das obras incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e seu programa de investimentos (US$ 174 bilhões até 2013) tornou-se um dos principais instrumentos do governo para evitar que o país caia em recessão. "A frase mais importante é que não vamos fazer os projetos a qualquer preço", disse ao Valor o diretor de Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa.

Ele disse que a empresa tem o aval do conselho de administração, ou seja, do governo, para sua decisão. Nela, de acordo com Costa, já está implícito que "vai ser necessário" atrasar alguns projetos importantes. A refinaria Abreu Lima, com obras já iniciadas em Pernambuco, tinha entrada em operação prevista para setembro de 2010, mês anterior à próxima eleição presidencial. Agora, já está definido que ela não dá partida antes do primeiro trimestre de 2011.

"É óbvio que não queremos atrasar nenhum projeto, mas não iremos fazer a qualquer custo para não atrasar", disse o diretor da Petrobras. No mercado, essa estratégia de renegociar cada contrato está sendo interpretada como uma espécie de "adiamento branco" de vários projetos, à espera de que as condições de demanda, de preços e de crédito voltem a ficar mais favoráveis a que eles sejam executados.

Na área comandada por Costa, que inclui o refino e comercialização de petróleo e derivados e a petroquímica, a Petrobras já cancelou duas grandes seções da refinaria Abreu Lima que estavam licitadas. Uma foi a das interligações e a outra, a do coqueamento retardado, além de vários pacotes de menor porte, todos por estarem com preços considerados inaceitáveis. Outros cinco pacotes, no valor de US$ 2,9 bilhões, foram contratados na semana passada. A refinaria, para processar 230 mil barris de óleo pesado por dia, estava inicialmente orçada em US$ 4,1 bilhões.

Esta semana, se não houver acordo nas negociações em andamento com os vencedores das concorrências (os nomes não foram divulgados), Costa promete cancelar também dois outros grandes pacotes, o da destilação (equipamento que transforma o petróleo em produtos) e o do hidrotratamento (HDT, que estabiliza os derivados e inibe as emissões tóxicas, entre outras coisas), já licitados.

Na área de exploração e produção, além dos já anunciados cancelamentos das licitações das plataformas P-61 e P-63, ambas destinadas ao campo de Cara-bobo (bacia de Campos, no Rio), a Petrobras está revendo outros processos de encomendas. No fim de janeiro foi adiada pela quinta vez consecutiva a definição de cinco pacotes envolvendo a compra de 306 árvores de natal molhadas (conjunto de válvulas postas remotamente nas bocas dos poços submarinos para controlar os fluxos de óleo e gás), equipamento que pode custar mais de US$ 3 milhões por unidade; e 12 manifolds (equipamento que centraliza a produção de vários poços submarinos).

Sem falar especificamente sobre outras áreas que não a sua, Costa disse que a Petrobras está pedindo redução de preços "de 30% para cima". A pressão da estatal é justificada pela queda abrupta do preço do petróleo de setembro do ano passado para cá, saindo da casa dos US$ 120 por barril para a dos US$ 50 por barril. As receitas das petrolíferas desabaram e vários projetos pelo mundo afora entraram em reavaliação, refletindo-se na demanda por equipamentos.

A Petrobras quer manter a sua demanda, mas adequando-a aos novos tempos de oferta mais abundante de produtos e serviços. Costa disse que já houve casos de sucesso concreto nas negociações. Os afretamentos (aluguéis) de novos navios, que estavam suspensos desde setembro, foram retomados este mês com a renovação de um navio tipo Aframax, cujo preço foi reduzido em exatos 30%.

Segundo Costa, só não estão sendo chamados para renegociar aqueles fornecedores ou prestadores de serviços cujos contratos já estão em fase madura, da metade para o fim.

A Sulzer do Brasil, por exemplo, fornecedora de bombas centrífugas cuja carteira de encomendas está 60% ocupada por contratos da Petrobras, com obras até 2010, informou que não tem nenhum contrato sendo renegociado. "Os nossos subfornecedores não estão sinalizando com redução de preços", disse por e-mail o diretor de vendas da empresa, Jonas Lessa.

No caso dos serviços, segundo ele, obedecendo a uma mecânica natural do funcionamento do setor, os preços caem e sobem mais lentamente, sempre respondendo a movimentos originários da área e produtos.

O executivo explicou que a estatal está tomando decisões internas que por si só já devem gerar quedas nos preços dos produtos comprados. É um esforço na área de padronização de equipamentos, com a adoção de normas de caráter mais universal na hora de especificar produtos. No jargão setorial, isso permite o uso pelos fornecedores de itens de prateleira na hora de fazer as obras e os equipamentos. "Levei para a reunião de diretoria na semana passada um trabalho mostrando um grau de simplificação muito grande", disse Costa.

Segundo ele, foram criados, junto com o Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), grupos específicos para trabalhar na simplificação de equipamentos como compressores, vasos de pressão, formas e outros. "Quanto menos incerteza a Petrobras colocar na licitação, mais preços coerentes teremos", justificou.

Mas a estatal exige a contrapartida desses esforços do lado das empresas. "Sem querer generalizar, se você olhar algumas empresas, mudou muito pouco a maneira de fazer construção e montagem de 15 a 20 anos para cá. Por uma série de circunstâncias: o mercado pouco aquecido, tecnologia defasada...", avaliou o executivo. O resultado, segundo Costa, é pouca produtividade e preços e prazos maiores.

"É necessário um esforço do lado de lá para que tenhamos um ganho geral", disse, em um discurso dirigido especialmente aos chamados epecistas (empresas de engenharia que gerenciam as obras). "Se a empresa tem mais e maiores equipamentos de movimentação de cargas, por exemplo, ela pode agilizar as montagens, reduzindo tempo e mão-de-obra."

As indústrias de equipamentos avaliam que os epecistas, que negociam um mix de produtos e serviços, têm mais margem para reduzir preços. Embora os pedidos da Petrobras sejam o principal item das carteiras de encomendas de muitas indústrias, elas estão preocupadas com as pressões da estatal sobre os preços e as entidades de classe já começam a se movimentar para fazer pressão sobre o governo.

Raul Sanson, presidente da PWR Mission, tradicional fornecedora de produtos como válvulas e bombas centrífugas, avalia que o mercado está sendo pressionado por empresas europeias que, com poucas encomendas, estão oferecendo descontos de até 30%, apoiadas por seus governos que oferecem créditos em troca de compras dos produtos de suas indústrias.

"Vários países estão praticando a proteção de setores estratégicos. Não temos que ter vergonha de fazer o mesmo", disse. Sanson ressalta que o governo já se movimentou para ajudar a indústria automobilística, reduzindo a incidência de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para carros novos.

"Se o governo reduz 10% no imposto, a redução (do preço do produto) é direta", disse. Segundo o empresário, nas condições atuais, "é muito difícil" chegar aos 30% pretendidos pela Petrobras. No caso da PWR, ele avalia que a possibilidade de redução de margem não passa de 2%.