Título: Se a oposição levar, impede volta de Lula, diz Dulci
Autor: Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 24/03/2009, Política, p. A8

"Se o neoliberalismo voltar vai ser um retrocesso enorme. Fora isso, eles vão salgar a terra e inviabilizar o retorno de Lula em 2014". O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Luiz Dulci, parecia à vontade diante de 300 petistas reunidos em um luxuoso hotel Spa em Osasco, região metropolitana de São Paulo. Feita assim, publicamente, por um integrante do primeiro escalão do governo, a declaração surpreende. No fim da palestra, é Dulci quem parece surpreendido com a presença de jornalistas. "É minha opinião pessoal. Declarei e não vou negar. Mas não esquece que tem um contexto. Estou num seminário petista."

Durante o encontro, promovido pelo deputado federal João Paulo (PT-SP) na noite de sexta-feira, Dulci foi apresentado pelo mestre de cerimônias como o "braço direito e esquerdo" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pretexto do seminário era fazer o planejamento estratégico do mandato do deputado. Mas a lista de convidados, que ia de Dulci ao presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, levou o debate ao impacto da crise econômica sobre as eleições de 2010.

Na palestra, Dulci revelou seu temor sobre o que chama de "ideias econômicas semelhantes" da ministra Dilma Rousseff e dos governadores tucanos José Serra e Aécio Neves. "Não é verdade, companheiro, quando Aécio diz que não é anti-Lula, mas sim pós-Lula. Não é verdade! Não se pode agir como se nunca tivesse governado", disse, referindo-se ao governo de Fernando Henrique Cardoso. "Vamos ter que fazer essa disputa".

O ministro "braço direito e esquerdo do presidente Lula" declarou a seus companheiros petistas o receio de que o eleitor "faça um pacto interno com ele mesmo" para votar em um candidato que prometa "deixar tudo como está", ainda que seja de um outro partido que não o PT. "Precisamos ampliar o repertório de informações. O povo continua apoiando o governo, mas fica perplexo com a crise. Vota em Lula por reflexo", disse, fazendo em seguida a ressalva de que a maioria da população quer a continuidade do atual projeto político.

Para combater a estratégia dos adversários de "confundir os projetos, de não diferenciar as propostas", o ministro defendeu, como preparação para a disputa eleitoral de 2010, "um discurso mais ousado". "Precisamos traduzir as diferenças dos projetos, em cinco ou seis motes. Aécio diz que vai fazer tudo o que Lula faz mais o choque de gestão. Não é assim que funciona. É outra visão de vida, de que a saúde, a educação não podem ser submetidas à lógica mercantil."

Mesmo que os outros candidatos queiram manter o governo como está, argumentou Dulci, não conseguiriam, porque eles "foram eleitos por outras forças políticas". " A base social é outra. A visão social é outra", explicou. "Eles não defenderão de cara limpa o neoliberalismo. Mas não deram aumento ao salário mínimo e não darão de novo". Para o ministro, o PT tem de fazer disputa ideológica e melhorar o discurso. "Não vai dar só para tomar medidas e achar que elas vão falar por si", comentou.

Ao lado de Dulci estava o presidente do BNDES. Luciano Coutinho foi anunciado como o "homem que comanda um banco duas vezes e meia o Banco Mundial" e que "tem ajudado muito o governo a enfrentar a crise". Em suas primeiras palavras, Coutinho disse que estava lá não como presidente do BNDES, mas como "professor Coutinho" e falou sobre os reflexos da crise no país.

A crise econômica internacional, explicou o "professor Coutinho", é de grande profundidade e vai durar muito tempo, " de três a cinco anos", de acordo com as "previsões mais otimistas". Para uma plateia cheia de sindicalistas, representantes de movimentos sociais e dirigentes petistas, muitos deles críticos à política econômica do governo, ele elogiou a "política de austeridade fiscal" e explicou que justamente o "excesso de conservadorismo na política monetária" transformou-se em uma "janela de oportunidades", sem que fosse contestado na rodada de perguntas.

O Brasil tem trunfos para enfrentar a crise, afirmou, como os investimentos em infraestrutura -em especial os previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), muitos deles financiados pelo BNDES -, a "melhor eficiência na gestão do Estado" e a melhoria na distribuição de renda, com a dinamização do mercado interno. " Vamos ter um ano difícil, com crescimento mais baixo, mas as condições são incomparavelmente melhores do que em qualquer economia". E concluiu: "Não é possível mais içar a vela e esperar que o vento nos ajude. Vamos ter que remar e suar."