Título: Agente da Abin diz que Satiagraha foi ordenada por Lula
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/03/2009, Política, p. A9

Em depoimento sigiloso à CPI das Escutas Clandestinas da Câmara, o agente Lúcio Fábio Godoy de Sá disse aos deputados que foi informado pelo delegado Protógenes Queiroz de que teria partido de Lula a orientação para a realização da Satiagraha. O presidente estaria preocupado, segundo o agente, com investigações em torno do seu filho Fábio Luiz da Silva, conhecido como Lulinha.

O depoimento de Godoy faz ganhar força a versão de que Protógenes teria investigado ilegalmente autoridades dos três Poderes, como revelado pela revista "Veja". Além de Lulinha, a PF teria investigado os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil) e Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos), o ex-ministro José Dirceu, o governador José Serra (São Paulo) e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.

A CPI quer esclarecer a denúncia com Protógenes, que presta depoimento à comissão na quarta-feira, dia 1º de abril. "O Protógenes vai ter que dizer se foi ele que disse isso sobre o presidente Lula. Por que essa operação da Polícia Federal teve esse tamanho?", questionou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR).

Os deputados também querem saber detalhes do segundo suposto sistema de armazenamento e análise de áudios em posse da PF, além do guardião. No depoimento sigiloso prestado à comissão, Araújo disse que realizou transcrições de áudios no outro sistema, mas disse não ter conhecimento do seu nome nem das funções que poderia executar.

Agentes da Abin que prestaram depoimentos sigilosos à CPI confirmaram que a Polícia Federal possui um segundo sistema de armazenamento e análise de interceptações telefônicas, além do chamado "guardião".

O sistema guardião permite à PF analisar o conteúdo dos grampos realizados durante as investigações policiais. Os grampos são executados pelas operadoras telefônicas, mas analisados pelos policiais federais em meio às operações.

O presidente da CPI, deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), disse que os depoimentos dos agentes mostraram que a Operação Satiagraha não seguiu os "ditames normais" previstos pela PF. "A CPI vem demonstrando uma série de atos praticados que estão em desacordo com as normas e a legislação. Não temos o objetivo de condenar quem quer que seja, estamos apontando fatos doa a quem doer", afirmou.

Em outro depoimento, o agente da Abin Márcio Seltz reiterou que entregou a Paulo Lacerda, ex-diretor-geral da agência, os áudios de parte das interceptações telefônicas realizadas durante a Operação Satiagraha, da Polícia Federal.

Seltz disse acreditar, porém, que Lacerda pode não ter percebido que tinha os áudios em suas mãos, uma vez que eles foram encaminhados dentro de um pen drive (dispositivo de armazenamento de dados) que também reunia o relatório elaborado pelo agente sobre a Satiagraha - documento solicitado pelo ex-diretor.

"Partindo do pressuposto que o dr. Lacerda está falando a verdade quando diz que não recebeu [os áudios] e também do pressuposto que eu estou falando que encaminhei os áudios para ele, a única possibilidade é que ele tenha visto a pasta do Word [com o relatório] e não tenha visto a pasta ao lado de áudios. Não sei se foi isso que ocorreu. Mas eu colocaria isso como uma possibilidade", afirmou.

No primeiro depoimento à CPI prestado no ano passado, Seltz revelou que havia entregado os áudios a Lacerda - que negou a informação. A revelação do agente se transformou em uma das principais contradições identificadas pela CPI no depoimento prestado por Lacerda à comissão.

Seltz disse que as gravações continham, em sua maioria, conversas entre jornalistas e investigados pela Satiagraha - como o megainvestidor Naji Nahas e o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity. A pedido da CPI, Seltz revelou nomes de alguns jornalistas flagrados pelos grampos, mas disse acreditar que os investigados eram os verdadeiros grampeados pela PF.

"Os diálogos não tinham nada de comprometedor. Às vezes eram diálogos em que os jornalistas apenas pediam para falar com as pessoas. Eu acredito, e tenho convicção, de que quem estava interceptado eram os investigados", afirmou Seltz.