Título: Medidas reduzem burocracia, mas mexem pouco na cotação do dólar
Autor: Sergio Lamucci e Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2005, Finanças, p. C2
As medidas de unificação dos mercados de câmbio e de aumento do prazo para venda de dólares por exportadores foram bem recebidas pela maior parte dos analistas. Operar com moeda estrangeira no Brasil vai ficar menos burocrático e mais fácil, o que significa que os custos deverão ser menores para empresas que mexem com câmbio no dia-a-dia. Especialistas afirmam ainda que as medidas têm uma importância mais estrutural do que conjuntural, apostando que o impacto sobre a taxa de câmbio no curto prazo não vai ser significativo. Com juros em níveis estratosféricos, continua interessante para o exportador antecipar a venda de dólares e aproveitar as taxas das aplicações brasileiras, ainda que tenha um prazo maior para vender os recursos, como afirma o ex-diretor do Banco Central Emilio Garofalo Filho. Garofalo gostou das medidas. Há muito tempo defensor da adequação das normas cambiais brasileiras à nova situação do país, ele considerou as regras como estruturalmente importantes. Ao tornar mais fáceis as entradas e saídas de recursos, as operações vão ficar menos burocráticas e, com isso, vão ter custo menor, afirma. Além disso, Garofalo avalia que a melhor maneira de trazer recursos para o Brasil é facilitar a sua saída, o que as medidas devem proporcionar. O ex-diretor do BC Daniel Gleizer, diretor-executivo do Unibanco, diz que as medidas são um passo adiante, pois menos burocracia e mais simplicidade devem reduzir custos para quem atua no câmbio a toda hora. Mas Gleizer diz que é importante analisar as novas regras com atenção, o que ainda não foi possível porque falta conhecer os detalhes da resolução do CMN. Para ele, é preciso ver se as medidas vão ser capazes de garantir um grau de flexibilidade adequado para quem atua no câmbio, e principalmente se vão dar mais confiabilidade do ponto de vista jurídico a empresas e pessoas físicas. Se isso não ocorrer, as normas podem não funcionar bem, diz ele. O ex-presidente do BC Gustavo Loyola, sócio da Tendências Consultoria Integrada, diz que a unificação dos mercados de câmbio é uma etapa natural do processo de aperfeiçoamento das normas cambiais, iniciado em 1988 com o câmbio turismo e que avança aos poucos. Os analista acreditam que as medidas cambiais não terão impacto sobre a cotação do dólar. Garofalo e Loyola afirmam que, com o atual nível de juros no país, os exportadores vão continuar a antecipar a venda de dólares, apesar de terem mais prazo para fazê-lo. O economista-chefe do Pátria Banco de Negócios, Luis Fernando Lopes, também avalia que o prazo maior concedido aos exportações não irá limitar a oferta de moeda. "O mercado saberá que, em algum momento, os dólares provenientes das vendas externas entrarão. E aos exportadores interessa hoje antecipar o ingresso para que obtenham reais depois direcionados ao ativos de renda fixa", diz Lopes. O professor Fernando Cardim de Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também não vê impacto da medida sobre o câmbio, devido ao diferencial de juros internos e externos. Ele avalia, aliás, que a decisão foi tomada com objetivo de curto prazo, o de levar a uma maior retenção da oferta de dólares pelos exportadores, criticando que se promova uma mudança institucional para tentar produzir um efeito imediato. Carvalho teme que, numa eventual crise em que haja fuga de capitais, a medida agrave também a oferta de recursos. Os exportadores podem adiar ao máximo a venda de dólares, aumentando a escassez de moeda estrangeira. Carvalho também viu com algumas reservas as outras mudanças definidas pelo CMN. Embora avalie que a unificação dos mercados de taxas livres e de taxas flutuantes seja normal e as mudanças em relação às CC5 sejam positivas, ele se diz preocupado com "a estratégia dentro da qual essas medidas se colocam". Segundo Carvalho, defensor do controle de capitais, o problema é que as medidas fazem parte de um objetivo explícito de continuar avançando na liberalização do câmbio, o que ele considera um erro. Para o especialista em câmbio da Banif Primus, Rodrigo Trotta, as medidas acalmam o mercado. "Não há como interpretar as decisões de um ponto de vista negativo." Segundo ele, a unificação dos registros burocráticos entre os câmbios comercial e flutuante consolida a regra operacional já baixada na gestão anterior do BC. Até a âncora cambial, os câmbios eram separados para inibir evasão de divisas. A porta do flutuante era deixada aberta para a saída dos dólares, a preços mais elevados, enquanto o BC controlava a saída pelo comercial. Mas desde a gestão de Armínio Fraga, esse tipo de controle informal de capitais deixou de existir. Para Lopes, o governo indicou claramente que não tem intenção de desestimular a entrada de capitais estrangeiros. Na semana passada, rumores de que o BC usaria o IOF para taxar o ingresso de capitais especulativos provocaram alta de cotações. "As decisões foram em sentido contrário." Por fim, os analistas apontam que ainda falta bastante a avançar no sentido de liberalizar mais o câmbio no Brasil. Loyola lembra que os exportadores continuam com um prazo máximo para a venda de dólares. Além disso, a legislação não permite a compensação cambial, pela qual uma empresa possa pagar importações com recursos das exportações sem antes internar os dólares no Brasil.