Título: Greve em defesa de salários
Autor: Calcagno, Luiz
Fonte: Correio Braziliense, 10/03/2010, Cidades, p. 34

Professores da Universidade de Brasília decidemcruzar os braços para evitar corte de 26,05% nos rendimentos pelogoverno federal

Após o primeiro dia de aula na Universidade deBrasília (UnB), a Associação dos Docentes da instituição (ADUnB)decidiu entrar em greve(1) ontem. A iniciativa foitomada em assembleia, que reuniu 164 professores, dos quais 157 votarama favor da greve, seis contra e um se absteve. A paralisação é parapreservar a Unidade de Referência de Preços (URP), alíquota de 26,05%,criada em 1989 para correção salarial de professores e funcionáriostécnicos, que representa uma gratificação, cujo valor varia de R$ 300 aR$ 2,5 mil.

O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) sugeriualterações na URP, o que implica redução salarial de até 26,05% nafolha de pagamento das duas categorias. A proposta do ministério atendeorientação do ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União(TCU). De acordo com o ministro, a URP não pode ser incorporada aosalário dos professores e servidores, pois tem natureza de antecipaçãosalarial, sendo devida somente até a reposição das perdas havidas noano anterior (1988).

O voto de Nardes ressalvou que a suspensão do pagamento da URPsomente poderá ocorrer após o julgamento do mérito do mandado desegurança coletivo, em que a ministra do Supremo Tribunal Federal(STF), Cármen Lúcia, decidiu pela manutenção do benefício. A ADUnBpretende pressionar o Ministério do Planejamento para que cumpra adecisão do Supremo. O Sindicato dos Servidores Técnicos da UnB(Sintpub) também realizou assembleia, mas adiou a decisão de entrar emgreve para a próxima terça-feira.

O presidente da ADUnB, Flávio Botelho, explicou que os valores sãoganhos judiciais que o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministériodo Planejamento pretendem eliminar. Segundo ele, desde agosto do anopassado vários professores e técnicos não recebem a URP regularmente. Ainconstância no pagamento deixa os funcionários sem saber quanto irãoreceber no mês seguinte. O TCU chegou a impugnar aposentados do ganho,mas perdeu a ação na Justiça. Depois, tentou retirar a URP de quementrou na UnB após 2006. O TCU quer limitar o ganho de alguma forma,afirmou Botelho.

O coordenador-geral do Sintpub, Cosmo Baldino, explica que aalíquota incide de forma diferente na folha de pagamento dosfuncionários. Quem é mais antigo ganha mais, e sofre um impacto maior.Quem entrou agora sofre um impacto menor. Porém mais de 25% de descontona folha é pesado de qualquer forma, queixou-se. Para ele, oMinistério do Planejamento não tem autonomia para alterar ou retirar ovalor. Eles entram com uma tese de ilegalidade, mas a URP é legal,garantiu.

egurança O professor do curso de engenharia Euler Garcia, 32 anos, aindaavalia se a greve foi a melhor saída. Segundo ele, a paralisação sóserá eficiente se o Câmpus Darcy Ribeiro, na L2 Norte, aderir. Elelembra que, em novembro de 2009, professores e funcionários entraram emgreve para garantir o recebimento da alíquota, que o TCU tentavasuspender por medida cautelar, mas o movimento não teve efeito. Poroutro lado, como você vai se sentir sem saber se, no próximo mês, irádeixar de receber um quarto do salário, que usa para viver?,questionou.

O técnico do Departamento de Ciências da Informação e Documentação,Higor Francis da Silva, 29 anos, que entrou na UnB em novembro último,também alega não saber quanto vai receber. Ele conta que, de lá paracá, teve meses em que recebeu a URP e meses em que não. Entrei parareceber um salário, e vou receber outro. Fica difícil até de comprovara renda, reclamou.

O estudante de engenharia Luís Barros não vê a greve com bonsolhos, mas ainda assim acredita que se trata de um mal necessário.Ninguém quer greve, mas querem cortar o salário dos professores. Agreve é uma forma de conseguir algo melhor, argumentou.

De acordo com a assessoria de imprensa da UnB, o reitor JoséGeraldo de Sousa Júnior, até o fechamento desta edição, não haviarecebido um comunicado oficial da direção do movimento. A administraçãoda universidade entende que a greve foi deflagrada contra a redução desalário, e que a ameaça vem de um ofício do Ministério do Planejamento,que mandou proceder uma série de cortes. O reitor enviou, na últimasegunda-feira, um ofício para o ministro Paulo Bernardo em que alertaque a postura do ministério causa instabilidade na universidade e pedepara que não seja implantada qualquer medida antes de uma decisão doSTF.

1 - Luta em 2009 Em agosto do ano passado, o Tribunal de Contas da União (TCU)determinou em caráter cautelar que a UnB não pagasse mais o acréscimosalarial a servidores que entraram na instituição depois de 2006. Emnovembro, professores e funcionários entraram de greve. A paralisaçãodurou até dezembro.

O TCU chegou a impugnar aposentados do ganho, mas perdeu a ação na Justiça

Flávio Botelho, presidente da ADUnB