Título: Atraso no cronograma de 12 usinas térmicas pode afetar oferta futura
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 09/03/2009, Brasil, p. A3

Caras e nocivas ao meio ambiente, as usinas térmicas tornaram-se recentemente, com a morosidade na construção de novas hidrelétricas, a aposta do governo para driblar os riscos de um déficit de energia nos próximos anos. A novidade é que, agora, são as próprias térmicas que vêm enfrentando problemas para cumprir o cronograma planejado pelo próprio governo e pelos investidores. Um levantamento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostra que térmicas com potência estimada em 2.308 megawatts (MW) enfrentam restrições para entrar em operação, como atraso no licenciamento ambiental, ações judiciais ou contrato de combustível sem definição. São investimentos que somam quase R$ 3,5 bilhões.

Nesses cálculos estão 12 termelétricas - oito são movidas a óleo combustível ou diesel, três a bagaço de cana, uma a carvão mineral e uma a resíduos sólidos avícolas. Todas elas negociaram sua geração de energia futura em leilões da Aneel e têm data certa para entrar em operação. Se houver atraso, precisarão comprar energia no mercado de curto prazo para entregar aos seus clientes. A lista também inclui a usina de Barcarena (PA), cuja conclusão é prevista para 2012, que a Vale construirá para consumo próprio - portanto, não foi negociada em leilão. Movida a carvão mineral (importado), a térmica deverá gerar 600 MW.

O Plano Decenal de Energia aponta a necessidade de expansão anual de 6 mil MW para atender a demanda até 2017. Apesar do cenário bastante tranquilo neste ano e nos próximos, "a situação do cronograma de obras do setor elétrico mostra que o país ainda não se livrou do fantasma de um novo apagão caso mantenha as taxas de crescimento econômico previstas pelo governo e desejadas pela sociedade", afirma Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), em boletim distribuído pela consultoria. Levando em consideração todas as fontes de geração, inclusive hidrelétricas, Pires lembra que 59% dos 31,4 mil MW de expansão da capacidade prevista entre 2009 e 2013 enfrenta algum tipo de restrição - o equivalente a mais de duas Itaipus. O curioso é que dificuldade alcançou as térmicas.

No caso de Barcarena, um investimento de US$ 800 milhões, o levantamento da Aneel explica que o atraso na obtenção das licenças ambientais está requerendo "ações gerenciais efetivas, por parte da Vale, no sentido de anular os impactos no prazo de implantação do projeto". Segundo a agência, o carregamento de 1.279 peças a serem usadas nas obras chegou ao porto de Vila do Conde (PA) em outubro de 2008, mas dois terços da carga estão pendentes de licença de importação do Departamento de Comércio Exterior (Decex). O restante, 1.200 toneladas de peças, aguardava em fevereiro análise de um perito da Receita Federal.

Com energia negociada no leilão A-3 de 2007 e previstas para entrar em funcionamento em janeiro de 2010, as usinas de Monte Pascoal e de Itapebi, ambas na Bahia, ainda não tiveram suas obras iniciadas. Cada um terá potência de 137,6 MW e está recebendo investimentos pouco acima de R$ 200 milhões. O contrato de fornecimento dos geradores foi fechado com a Caterpillar, mas continua o processo de negociação do financiamento com os bancos, segundo o informe da Aneel. Além disso, a agência avalia o pedido de reconfiguração técnica dos projetos e a mudança do local de conexão da geradora para o município de Sapeaçu.

A usina Palmeiras de Goiás, de 174 MW, já obteve autorização ambiental para iniciar as obras e precisa entregar energia a partir de janeiro de 2011. Mas entrou na lista amarela da Aneel porque não definiu até agora as condições de financiamento, a construtora responsável e nem a contratação de suprimento de óleo.

A proliferação de usinas térmicas que usam combustíveis fósseis tem sido alvo de críticas dos ambientalistas. O governo vem recorrendo às termelétricas para garantir o suprimento de energia, já que esbarrou em dificuldades para licenciar grandes hidrelétricas nos últimos anos, apesar dos leilões das usinas do Madeira. Até 2017, segundo o plano decenal, será necessário acrescentar 81 térmicas ao sistema interligado para suprir a demanda. Isso aumentará em 172% a emissão de gases do efeito estufa produzidos pelo setor elétrico.

No início do ano, a Aneel detectou irregularidades nos contratos de fornecimento de combustível da Petrobras com outras sete usinas térmicas a óleo, que estão entrando em operação entre janeiro e março. Após reuniões com a estatal e com o Ministério de Minas e Energia, a Aneel autorizou o funcionamento temporário - por seis meses - das três primeiras usinas. Os contratos precisarão ser ajustados até meados do ano. Caso contrário, poderão parar de funcionar.

Na lista de obras com restrições ainda há quatro usinas movidas a biomassa. Uma delas - Xanxerê (SC) - usará resíduos avícolas para produzir energia. O levantamento não inclui as térmicas movidas a combustíveis fósseis que participaram do último leilão de 2008, por não terem assinado contratos de outorga, nem as usinas de bagaço de cana contratadas como energia de reserva, também no ano passado.