Título: Crise retira bancos dos EUA da liderança
Autor: Larsen , Peter Thal
Fonte: Valor Econômico, 06/04/2009, Finanças, p. C8
A pior crise financeira desde a Segunda Guerra Mundial não se limitou a obrigar governos em todo o mundo ocidental a intervir e socorrer instituições gigantes. Em meio à turbulência, houve também um deslocamento tectônico no centro de gravidade do setor bancário. Há uma década, a lista das maiores instituições financeiras do mundo era dominada pelos bancos dos Estados Unidos e do Reino Unido. Hoje, apenas quatro dos 20 primeiros possuem sedes nos EUA, que ainda são a maior economia do mundo. O HSBC, no fundo um banco de mercados emergentes, é o único representante do Reino Unido.
Depois de registrar perdas de mais de US$ 1 trilhão em instrumentos de dívida complexos e de captar centenas de bilhões de dólares em capital novo, muitos bancos testemunharam o encolhimento do seu valor de mercado a uma fração do seu nível no pico da expansão.
Olhando 10 anos para trás, o setor bancário no começo de 1999 ainda sacudia a poeira dos escombros do outono anterior, quando a crise econômica asiática e o quase colapso do Long-Term Capital Management deixou alguns bancos dos EUA amargando enormes perdas. Apesar de poucos terem reconhecido à época, o setor estava no limiar de uma arrancada de oito anos no crescimento econômico, que acabaria levando o mundo à beira do colapso.
O mais impressionante são os bancos arruinados. O Citigroup, que dominou o panorama pela maior parte da década, agora padece no fundo da lista e, na verdade, está sob controle do governo. O Lloyds TSB agora é pequeno demais para se candidatar, depois do seu imprudente resgate do HBOS.
Enquanto isso, novos nomes chegaram como se houvessem surgido do nada. Isso é um reflexo parcial do deslocamento do poder econômico: os três grandes bancos chineses dominam as classificações depois de terem ingressado no mercado acionário em 2006 e 2007. Os bancos brasileiros e australianos também cresceram em importância. Mas a composição mutante também oferece evidências de quão bem os distintos países administraram os seus sistemas financeiros. O Canadá, por exemplo, foi elogiado por sua atitude avessa a riscos em relação à regulação. Há uma década, nenhum banco canadense integrava a lista. Agora, há 5 entre os primeiros 50.
Apesar disso, uma comparação dos dois instantâneos mascara a destruição de valor ocorrida desde o começo da crise: mesmo os vencedores relativos não se saíram bem: o valor de mercado do HSBC chegou ao auge, indo a US$ 234 bilhões, em outubro de 2007. Hoje ele vale apenas um terço daquela quantia. O valor dos três maiores bancos da China se reduziu à metade ao longo do mesmo período.
Será que a experiência da década passada oferece algum indicador para bancos que esperam prosperar até 2019? Diante disso, há poucas lições estratégias a serem aprendidas. Uma década de consolidação voraz transformou o JPMorgan Chase no maior banco fora da China.
O Royal Bank of Scotland, que também foi agressivamente comprador, porém, é controlado pelo governo britânico e atualmente é avaliado em cifra substancialmente inferior às 20 bilhões de libras esterlinas (US$ 29 bilhões) em capital novo que o Estado injetou no banco no último trimestre do ano passado.
Quando a crise afrouxar e a confiança retornar, as avaliações deverão se recuperar. A regulamentação, porém, será mais vigorosa e os governos estarão mais dispostos a reprimir sinais de excesso.
Os bancos também poderão ser obrigados a ficar menores e mais nacionais. Os contribuintes, que receberam uma demonstração de que são os garantidores de última instância do sistema financeiro, deverão ser menos tolerantes com os gigantes globais, cujos colapsos poderão esgotar os recursos fiscais dos seus países natais. Enquanto a crise atual não se dissipar da memória, o sistema bancário não estará pronto para outra expansão.
Em 1999, o Citigroup era o colosso recém-formado. Concebido por Sandy Weil como um supermercado financeiro completo, ele prenunciou um mundo dominado por algumas poucas instituições de grande porte.
Mas o colapso do Citi foi excessivo. À medida que prejuízos catastróficos demandavam múltiplos socorros, no mês passado as suas ações caíram brevemente para abaixo de US$ 1.
A classificação atual está dominada pelos três maiores bancos chineses: Industrial and Commercial Bank of China, China Construction Bank e Bank of China. Suas ações, lançadas no mercado acionário em 2006 e 2007, aguentaram melhor do que as de muitos rivais ocidentais, apesar de exercerem pouca influência além dos seus mercados internos. A desaceleração da economia chinesa lhes oferecerá seu primeiro grande teste como empresas públicas de capital aberto.
Não muito tempo atrás, o Bank of America desafiava o Citi pela posse da sua coroa. Mas o orgulho de Charlotte, na Carolina do Sul, se esvaiu na esteira de aquisições infelizes, especialmente sua absorção do Merrill Lynch em setembro. No início, aquele acordo aparentou ser um golpe de mestre para Ken Lewis, o executivo-chefe do BofA. Mas o cambaleante balanço patrimonial do Merrill forçou o banco a requerer socorro do governo.
O Lloyds do Reino Unido é outro caso de negócio equivocado. Quarto maior banco do mundo em 1999, sua classificação tombou durante a expansão econômica à medida que sua abordagem prudente ante o risco produzia crescimento inexpressivo. O Lloyds deveria se beneficiar com a crise, mas uma fusão apressada com o rival HBOS o deixou em posse de ativos tóxicos, obrigando-o a recorrer a controle governamental.
Há dez anos, o JPMorgan corria o risco de resvalar para fora do topo da tabela. Duas fusões, porém, com o Chase Manhattan em 2000 e com o Banc One em 2004, criaram um banco que atravessou a tormenta melhor do que a maioria. Sob a liderança de Jamie Dimon, o banco socorreu o Bear Stearns em Wall Street e o Washington Mutual, uma instituição de crédito habitacional.
O Banco Santander da Espanha é outro predador bem-sucedido. Sob Emílio Botín, seu incansável presidente de conselho de administração, as aquisições o levaram para a América Latina, os EUA e, na esteira da tomada do controle do Abbey National em 2004, ao Reino Unido. Um enfoque no varejo bancário significa que o banco sofreu menos do que a maioria.
O Goldman Sachs continua a desafiar todas as probabilidades. Muitos executivos de bancos duvidam que o Goldman consiga se manter sozinho por muito mais tempo. Por outro lado, isso é o que eles estão dizendo há 10 anos. (Tradução de Robert BanvolgyiI)