Título: No Mercosul, ninguém cresce como o Uruguai
Autor: Rocha , Janes
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2009, Internacional, p. A15

Os investimentos estrangeiros amorteceram os efeitos da crise mundial e sustentaram o crescimento econômico do Uruguai. Em 2008, só o fato de a indústria de papel e celulose finlandesa Botnia ligar suas máquinas fez o índice de atividade da indústria de papel e celulose do menor país do Mercosul crescer 20% no segundo trimestre de 2008, elevando o Produto Interno Bruto (PIB) do país a um recorde de 13,1% no período. Foi também no ano passado que a Chery, a primeira indústria chinesa de veículos a se instalar no Mercosul, iniciou sua produção. O impulso da Botnia compensou largamente a desaceleração do último trimestre quando o PIB cresceu apenas 7,5%. No cômputo anual, o Uruguai cresceu 8,9%, o seu maior índice desde a crise que atingiu o país em 2002.

"Há um efeito inercial do ano de 2008 que foi muito bom", diz o economista Marcel Vaillant, do Departamento de Economia da Universidade do Uruguai. Outra boa ajuda vem do Brasil que está comprando mais do vizinho. Segundo a agência Uruguay XXI, estatal de promoção de investimentos e exportações, as vendas para o Brasil aumentaram 22% nos últimos 12 meses terminados em março.

"A boa notícia", diz Marcel Vaillant, é que "mesmo com a crise internacional, o Uruguai não interrompeu sua capacidade para atrair novos investimentos". Só no mês de março foram anunciados US$ 400 milhões em novos projetos nos setores agroindustrial, madeireiro e construção civil.

A Secretaria da Presidência da República informou à imprensa local que tem recebido, semanalmente, cerca de 15 solicitações de empresas que querem instalar-se no país. Entre os projetos em análise, um deles é de uma multinacional que quer extrair ferro na região central e outro foi apresentado pela empresa Royal Caribbean, para construção de um porto de cruzeiros, dois edifícios de 24 andares, um centro comercial e um hotel cinco estrelas na capital Montevidéu.

Além disso, há investimentos importantes nas áreas automobilísticas, serviços (financeiros e "call center") e softwares. Além da montadora de veículos Chery, a coreana Kia está levando para o Uruguai a produção da caminhonete Bongo, conforme noticiou o Valor em 25 de março. Incentivos fiscais, estabilidade política e jurídica e mão de obra qualificada e barata estão entre os motivos que têm atraído investidores para o país.

Em uma crise internacional como a atual, a dependência das commodities agrícolas como fonte de renda mostra que tem suas vantagens, analisa Roberto Bennett, gerente da Uruguay XXI. "Ninguém parou de comer", diz Bennett, lembrando que os preços do trigo subiram 3,8% no primeiro trimestre deste ano e os da carne, principal produto de exportação do Uruguai, aumentaram 32%. Apesar da forte queda do mercado americano, o país tem mantido suas vendas para a Europa e Ásia e está prestes a conquistar um novo mercado, a Coreia do Sul, que é um dos países que melhor pagam pela carne. No total, o volume de exportações foi US$ 7 bilhões, dos quais US$ 5 bilhões em bens e US$ 2 bilhões em serviços. Dos US$ 5 bilhões em bens, os principais itens são carnes (21,6%), cereais (trigo, soja, cevada e arroz, 11,1%), lácteos (7,5%), madeiras e suas manufaturas (celulose, móveis, 7,1%), sementes e oleaginosas (girassol, soja em grãos, 6,2%), plásticos e suas manufaturas (3,7%).

A grande aposta do Uruguai para o comércio exterior é a indústria madeireira, afirma Bennett. As projeções do governo apontam para que, nos próximos dez anos, a madeira e suas manufaturas vão passar ao segundo posto na pauta de exportações depois da carne. As papeleiras Ence, da Espanha, e Portocel, de Portugal já começaram a construção de suas instalações no país. O impacto destes projetos no futuro da economia uruguaia pode ser medido pela papeleira finlandesa. O investimento da multinacional Oy Metsä-Botnia, de US$ 1,2 bilhão, corresponde a cerca de 5% do valor do PIB do país. Suas exportações de papel e madeira representam cinco pontos percentuais da participação de 7,1% do item madeira e suas manufaturas nas exportações totais.

Mas, como o Uruguai "não está em outro planeta", como diz Vaillant, os efeitos da crise já repercutem em desaceleração do nível de atividade. Segundo o economista da Universidade do Uruguai, a projeção de crescimento prevista no Orçamento do Estado para 2009 é de 2%. Vaillant prefere não arriscar projeções porque para ele o país depende muito do que vai acontecer com Brasil e Argentina.

No comércio exterior, Roberto Bennett, da agência Uruguay XXI, afirma que "se conseguirmos manter as exportações de 2008 estaremos contentes". Mas Bennett reconhece que será difícil atingir este volume já que, se por um lado a carne subiu de preço, por outro os demais produtos da pauta uruguaia caíram fortemente no mercado mundial como madeira, lácteos, couros, lãs e plásticos. Para o executivo, é mais provável que o país repita o desempenho de 2007, quando vendeu US$ 4,7 bilhões em bens, considerando sua diversidade de mercados (exportam a 80 países) e os novos possíveis compradores. Entre janeiro e março, as exportações uruguaias caíram 14,2% comparado ao mesmo período de 2008.