Título: Três Poderes lançam pacto para reformar Judiciário
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 14/04/2009, Política, p. A9

Os presidentes da República, Luiz Inácio Lula da Silva; do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes; da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP); e do Senado, José Sarney (PMDB-AP), lançaram ontem o 2º Pacto Republicano.

As medidas foram enviadas ontem ao Congresso sob a forma de projetos de lei e proposta de emenda constitucional com o apoio dos chefes dos três Poderes. Essa foi a segunda vez que os chefes dos Poderes se reuniram para enviar um pacote de medidas de reforma da Justiça para o Congresso. A primeira foi em 2004, quando o então presidente do STF, Nelson Jobim, articulou a aprovação da reforma do Judiciário com Lula e o Congresso.

A criação de uma Câmara de Conciliação na Procuradoria da Fazenda é a medida que mais afetará as empresas, mas o pacto prevê uma série de medidas para desafogar a Justiça do excesso de processos, garantir os direitos de pessoas investigadas pela Polícia Federal e evitar o abuso de autoridades. Há também medidas fiscais que atingem diretamente o cotidiano das empresas que respondem a processos contra a Receita Federal, como a nova forma de execução fiscal e a possibilidade de negociar os débitos diretamente com a Fazenda.

Hoje, essa negociação é impossível. A Fazenda é obrigada por lei a recorrer até a última instância para fazer as empresas pagarem pela totalidade de seus débitos. O governo avaliou que essa situação prejudica a arrecadação, pois as dívidas se alongam por décadas na Justiça e sequer são pagas nos casos em que as empresas são desconstituídas ou vão à falência.

A solução seria a criação de uma câmara composta por procuradores da Fazenda. Essa câmara deverá funcionar como uma espécie de "Refis permanente" - uma referência ao Programa de Recuperação Fiscal que permite às empresas parcelarem suas dívidas. A diferença é que não haverá prazo para adesão. Basta que as empresas obtenham a autorização para iniciar a negociação. No caso de dívidas acima de R$ 10 milhões, a autorização deve ser dada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Já as dívidas entre R$ 1 milhão e R$ 10 milhões só poderão ser negociadas com a autorização do procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams. Caberá aos procuradores regionais da Fazenda a autorização às negociações para débitos inferiores a R$ 1 milhão. As dívidas serão negociadas de acordo com três critérios: juros de mora, multas e outros encargos de sucumbência. Dessa forma, a Fazenda poderá reduzir os juros, por exemplo, para obter o pagamento da dívida de uma empresa.

A criação da câmara deverá reverter a ideia de que o governo não pode negociar com seus devedores. "Existe uma cultura de que o setor público não pode negociar", afirmou Pedro Abramovay, secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. "Permitir isso agora vai tornar o processo mais eficiente, o governo vai receber mais dos devedores e o Judiciário ficará com menos processos", completou.

Já a nova execução fiscal deverá tirar 3 milhões de processos do Judiciário. Hoje, o governo só pode cobrar as dívidas na Justiça. Pelo projeto, a Fazenda vai identificar previamente os bens dos devedores. As fases da penhora, da constrição preparatória de bens e da notificação do contribuinte vão ocorrer antes de qualquer ação na Justiça. Com isso, será mais fácil executar a empresa depois e obter o que é devido.

O secretário da reforma do Judiciário, Rogério Favreto, explicou que uma empresa em processo de insolvência poderá utilizar a câmara para voltar a atuar. Segundo ele, os governos estaduais também poderão aplicar os critérios gerais da câmara para negociar com seus devedores, mas terão de aprovar leis próprias para tributos estaduais.

Agora, coube a Gilmar Mendes pedir ao Palácio do Planalto e ao Congresso o apoio a medidas de contenção a supostos abusos cometidos em investigações da PF, como a exposição de presos algemados e o excesso de interceptações telefônicas. Ele vem pedindo por um novo "pacto republicano", desde julho de 2008, quando, após a deflagração da Operação Satiagraha, que levou à prisão temporária do banqueiro Daniel Dantas, e a divulgação da existência de escutas clandestinas no STF. Com o 1º Pacto, foram enviados 39 projetos de lei ao Congresso e aprovados 20. Ontem, no segundo pacto, o governo enviou mais cinco projetos para votação.

"Fizemos esse pacto e não houve resistência do Judiciário nem do Executivo", afirmou Lula. "Agora que lançamos o segundo pacto, vamos chegar à conclusão que teremos de fazer o terceiro, porque muitas coisas ainda precisam ser aperfeiçoadas", completou o presidente.

Mendes disse que deve haver "perfeita sintonia" na execução dos projetos do novo pacto e pediu uma atuação "criteriosa e participativa" do Legislativo para a aprovação das medidas. "Só um Congresso permanentemente aberto, ativo e altivo pode garantir o Estado Democrático de Direito", defendeu o ministro.