Título: Bancos dos EUA reduzem crédito apesar da ajuda
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 20/04/2009, Finanças, p. C8
A concessão de crédito dos maiores bancos dos Estados Unidos caiu mais do que se imaginava anteriormente, apesar dos esforços do governo de injetar bilhões no setor financeiro.
Segundo uma análise de dados do Departamento do Tesouro feita pelo Wall Street Journal, os bancos que mais receberam dinheiro público fizeram ou refinanciaram 23% menos novos empréstimos em fevereiro, o último mês para o qual há dados disponíveis, do que em outubro, quando o Tesouro lançou seu programa de socorro ao setor financeiro, o Tarp. O valor total de novos empréstimos declinou em três dos quatro meses em que o governo registrou os dados. Dos 19 maiores beneficiários do Tarp com dados comparáveis, 16 concederam menos empréstimos em fevereiro do que na época em que receberam as injeções de dinheiro do governo.
A análise do WSJ pinta um cenário mais sombrio do ambiente de crédito do que os balanços mensais divulgados pelo governo e é um lembrete da severidade da contração de crédito que estrangulou a economia americana e levou à crise mundial. Um motivo para a disparidade é o fato de que o Tesouro calcula seus dados de uma maneira que, dizem alguns especialistas, subestima o declínio no crédito.
O governo do presidente Barack Obama está tentando conter uma revolta política em torno do socorro ao setor bancário. A inquietação dos políticos com a percepção de que os bancos não estão emprestando, bem como seus gastos em bônus e mordomias, provocou ceticismo quanto à capacidade do governo de revitalizar o sistema bancário. Qualquer evidência de que os bancos estão emprestando menos pode reforçar as críticas ao programa e pressionar por novos planos concebidos pelo Tesouro para descongelar os mercados de crédito e ajudar os balanços dos bancos.
Num discurso em Trinidad e Tobago ontem, o presidente Barack Obama disse que irá exigir "responsabilidade" dos bancos dos EUA que receberem ajuda do governo e que não colocará o dinheiro dos contribuintes num "buraco negro".
Num comunicado à imprensa quarta-feira no qual divulga os números de fevereiro, o Tesouro - que é o ministério da fazenda americano - propagandeou "os níveis relativamente constantes do crédito em geral". Sem as injeções de capital, a concessão de crédito teria tido uma queda bem mais acentuada, dizia o comunidado. "Dentro deste ambiente desafiador, a pesquisa de fevereiro mostra que os bancos concederam um volume total apenas ligeiramente menor de crédito em fevereiro do que em janeiro." O Tesouro analisou a variação porcentual mensal na quantidade de novos empréstimos em cada um dos 21 bancos que mais receberam recursos públicos. Calculou então a variação mediana na atividade de empréstimo dos 21 bancos. (A mediana é o número que fica exatamente no meio de uma série de números.) Por essa medida, informou o Tesouro, o crédito caiu 2,2% em fevereiro em comparação com o mês anterior.
Usando os mesmos dados brutos, a análise do WSJ se concentrou na quantidade total de novos empréstimos dos 21 bancos, uma medida mais abrangente. Em fevereiro, esse total caiu 4,7% ante janeiro, mais que o dobro da estimativa do governo com base na mediana. O Tesouro não divulgou sua própria medida do declínio em relação a outubro. Um porta-voz do Tesouro informou que "nenhum parâmetro pode capturar precisamente a atividade de crédito em todo o país. É por isso que fornecemos todo o conjunto de dados". Ele disse que "os níveis de declínio do crédito refletem obviamente as atuais condições econômicas. Mas o Tesouro acredita firmemente que os níveis de crédito seriam muito mais baixos" sem as injeções de dinheiro público.
O nível de concessão de crédito é um importante fator para determinar com que rapidez a economia vai se recuperar. É também um fator importante para o governo decidir se permite que bancos individuais devolvam o dinheiro público. Se o Tesouro acreditar que isso diminuirá a capacidade da economia de oferecer crédito, o departamento pode adotar uma política linha-dura com os que querem devolver o dinheiro.
Os bancos defendem suas decisões de crédito, afirmando que estão ansiosos por fazer novos empréstimos, refinanciar os existentes e modificar os que estão em risco de inadimplência. O que complica os esforços deles, dizem executivos do setor, é um declínio na demanda entre empresas e pessoas físicas.
Os dados indicam que os empréstimos à pessoa física, especialmente os refinanciamentos de hipotecas, correspondem a uma porção cada vez maior do crédito bancário. Em fevereiro, quase metade do crédito dos 21 bancos foi para pessoas físicas, ante cerca de 25% em outubro. Excluindo os refinanciamentos de hipotecas, o crédito ao consumidor caiu cerca de um terço desde outubro. O empréstimo comercial, a empresas, caiu cerca de 40% entre outubro e fevereiro, indicam os dados.
Um fator que pode ter reduzido a captação de empréstimos comerciais no início deste ano é o descongelamento parcial dos mercados de títulos de dívida empresariais, no qual grandes empresas podem captar recursos com papéis como debêntures, em vez de tomar emprestado de bancos. Cerca de US$ 70 bilhões de títulos de empresas foram emitidos em fevereiro, ante US$ 21,4 bilhões em outubro, de acordo com a Thomson Reuters.
O balanço mensal do Tesouro do crédito nos 21 bancos que mais receberam do Tarp é a única fonte padronizada de dados sobre concessão de empréstimos. É parte de um esforço mais amplo do governo de ser mais transparente a respeito da miríade de programas de socorro.
De acordo com a análise dos dados do Tesouro feita pelo WSJ, 19 instituições financeiras fizeram ou refinanciaram um total de US$ 226,3 bilhões em empréstimos em outubro. Em fevereiro o valor caiu para US$ 174,2 bilhões.
Para chegar a esse número, o WSJ fez vários ajustes nos dados do Tesouro. Excluiu a American Express Co., que recebeu recursos do Tarp depois que o período analisado já tinha começado. Também excluiu o Wells Fargo & Co., que adquiriu o Wachovia Corp. no fim de 2008 e não informa quanto de seu volume de crédito de 2009 decorre daquela compra. American Express e Wells Fargo foram ambos incluídos na medida separada do WSJ de variações no crédito entre janeiro e fevereiro.
Algumas das mudanças no volume de empréstimos podem refletir fatores sazonais. Em fevereiro, os empréstimos feitos tendo a casa como garantia tiveram maior volume porque as pessoas tendem a tomar mais empréstimos para remodelar as casas quando o clima está para esquentar, como é o caso agora no Hemisfério Norte. O número de créditos estudantis caiu, o que é típico em fevereiro nos EUA.