Título: Contagem regressiva
Autor: Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 08/03/2005, EU &, p. D1

O setor de previdência se prepara para conhecer em detalhes como a nova tributação decrescente irá incidir sobre os planos. Na semana passada, o diretor da Superintendência de Seguros Privados (Susep) João Marcelo Máximo dos Santos disse que a instrução - preparada em parceria com a Receita e com a Secretaria de Previdência Complementar (SPC) - recebia os últimos ajustes e que a divulgação seria feita em "questão de dias". Desde janeiro e até julho, os investidores podem escolher entre o regime atual, de tributação progressiva, de acordo com o tabela do IR, e o regressivo, com alíquotas que podem chegar a 10% para aplicações com mais de dez anos. Mas a falta de detalhes sobre as novas regras não beneficia o setor. Segundo o site Fortuna, nos dois primeiros meses de 2005, os fundos de previdência captaram R$ 681 milhões - uma queda de 60% ante R$ 1,765 bilhão captados em igual período do ano passado. Mesmo na comparação com 2003, quando a entrada de recursos no período foi menor, de R$ 841 milhões, há uma queda de 20% neste ano. O levantamento indica ainda que, em 2004, para cada R$ 100 em contribuições feitas a Planos Geradores de Benefícios Livres (PGBLs), R$ 48 foram usados para o pagamento de resgates solicitados por participantes, sobrando R$ 52. Em 2003, a proporção era mais favorável aos planos. Naquele ano, de cada R$ 100 depositados em PGBLs, R$ 38 foram para honrar os pedidos de saques e R$ 62 iam para as reservas desses fundos. Para o sócio do Fortuna, Marcelo D'Agosto, a tributação regressiva pode ter sido desenhada também como uma forma de diminuir os crescentes resgates. O problema, diz ele, é que a nova regra pode tanto induzir o investidor que já tem um plano a ficar mais tempo, quanto levá-lo a não investir. A principal dúvida é como vai ser contado o chamado "prazo de acumulação", que vai definir a alíquota. As expectativas do setor são de que o regulador defina esse prazo como a combinação entre tempo de permanência no plano; a forma e o prazo dos aportes; e a forma e o prazo do recebimento do benefício. Para Fábio Junqueira, do escritório Martinelli e Advogados, o ideal seria que o tempo no plano de regime antigo fosse contado na nova opção. "Mas dificilmente a Receita deverá abrir mão disso." Segundo Junqueira, é possível que a Receita considere no prazo para as alíquotas menores não só o tempo de contribuição, como também o período de recebimento do benefício. Isso para que o participante possa contar com alíquotas menores sobre os recursos que ainda estejam no fundo e não tenham completado o prazo, mesmo após ele ter se aposentado. Mas não são só as medidas que estão por vir que preocupam os especialistas e inibem as aplicações. Aumenta a preocupação com os investidores que já optaram pela tributação regressiva, antes mesmo do detalhamento das regras. Especialistas querem que esses aplicadores possam rever suas decisões até julho, caso se sintam insatisfeitos com o texto final que será divulgado pelos reguladores. O problema é que a Instrução Normativa 497 da Receita - que saiu após a Lei 11.053, que trata da nova tributação regressiva - estabelece que a escolha pelo novo sistema pode ser feita até 1º de julho, mas que, uma vez realizada, não pode ser mudada. A advogada especialista em previdência e também professora da Fundação Getulio Vargas Ana Carolina Souza Lacerda prevê problemas jurídicos caso a possibilidade de retratação não seja considerada pelo regulador. "As pessoas poderão ir à Justiça contra a entidade de previdência", diz. Segundo a advogada, a Receita Federal deveria rever a questão, em nome da segurança do próprio sistema. Outro ponto que prejudica a captação dos fundos de previdência é a nova cobrança entre os planos de tributação antiga de IR de 15% na fonte sobre todos os resgates parciais de PGBLs, VGBLs e Fapis, a título de antecipação de imposto. Muitos aproveitavam o fato de o pagamento do imposto ficar a cargo do investidor e "esqueciam" de fazer o recolhimento. A partir deste ano, isso não é mais possível. Além disso, há quem entenda que essa cobrança na fonte só poderia começar a ser feita em julho para o investidor que ainda não fez a opção definitiva. Advogados defendem que valeria a regra anterior. Segundo os especialistas, outras questões levantadas pela Instrução 497 também esperam por esclarecimentos. Como por exemplo, o fato de as migrações feitas entre planos de tipo Vida Gerador de Benefício (VGBL) não estarem isentas de CPMF e IR, como aquelas feitas entre os PGBLs e entre os Fundos de Aposentadoria Programada Individual (Fapis).