Título: Ritmo de pedidos de crédito ao BNDES recua desde setembro
Autor: Durão , Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 27/04/2009, Brasil, p. A3
As consultas realizadas ao BNDES para pedidos de crédito para novos projetos de investimento entraram em rota de queda no período pós-crise - outubro de 2008 a fevereiro de 2009. Segundo cálculos de Luiz Dias Bahia, técnico de pesquisa e planejamento do Ipea, o recuo das consultas de outubro de 2008 a fevereiro de 2009 ante outubro de 2007 e fevereiro de 2008 foi de 22%, percentual que aumentou para 40% na comparação entre os primeiros bimestres de 2009 e 2008. Os números deflacionados e ajustados sazonalmente sinalizam, na avaliação do economista, que a redução do investimento tende a se aprofundar.
Fernando Puga, chefe do Departamento de Pesquisa Econômica do BNDES, retruca que a trajetória cadente das consultas não pode ainda ser tomada como tendência para o ano. "É preciso esperar pelo menos até junho para se chegar a qualquer conclusão. Também tem que ser levado em conta que a base de comparação de 2008 é muito forte, pois foi um ano de atividade atípica". Mas ele reconhece que está havendo uma retração no investimento, como mostram os dados do IBGE. "Não sou eu que vou negar uma expansão menor do investimento este ano. O banco está revendo suas projeções, pois o cenário de investimento crescendo mais de 10% mudou", avalia.
Bahia, do Ipea, concorda com este raciocínio e acha mesmo muito cedo para se afirmar que está em marcha uma mudança mais prolongada do patamar de investimentos. "O certo é que o investimento, entendido como formação bruta de capital fixo (FBCF) de 2009 será menor que a de 2008". Para ele, a incerteza econômica das empresas parece ser a principal causa do cancelamento e/ou adiamento de projetos de investimento. Outros fatores também afetam o comportamento da formação bruta de capital fixo, como a queda do grau de utilização de capacidade, a queda das exportações, a menor lucratividade, o aumento do preço de importação de máquinas por conta da desvalorização cambial, e o encarecimento e racionamento das linhas de crédito internas e externas. Já a redução da Selic e a manutenção do nível de consumo interno influenciam positivamente o investimento.
O economista do BNDES concorda que todos estes fatores desencadeados com a crise vão afetar principalmente a indústria, mas a maioria dos projetos de infraestrutura deverão se manter firmes, pois grande parte deles se apoiam em contratos com o governo, como as usinas do Rio Madeira. Este ano, o banco prevê que os investimentos da terceira onda, ou seja, na área de insumos básicos não vão acontecer. Mas, até agora, não há na instituição de fomento pedidos de cancelamento de projetos. "O que estamos vendo são os investidores adiando projetos. A Usiminas, por exemplo, adiou projeto de uma nova usina em Santana do Paraíso. Mas não há cancelamentos. O risco disto acontecer é muito pequeno", afirmou Puga.
Os dados abertos das consultas do BNDES no primeiro bimestre confirmam que a área de insumos básicos é a que vai sofrer mais com a crise econômica. A aversão ao risco por parte das empresas devido ao ambiente de incerteza atingiu fortemente os setores de papel e celulose, produtos siderúrgicos, minério e metais e produtos petroquímicos. Todos eles investiram pesadamente em expansão da produção e novas plantas nos últimos três anos.
Na soma das consultas remetidas ao banco no primeiro bimestre do ano, que somaram R$ 17,5 bilhões ante R$ 27,7 bilhões no mesmo período de 2008, o valor dos pedidos de financiamento enviados pela indústria caiu 32,6%, baixando de R$ 10,4 bilhões em janeiro-fevereiro de 2008 para R$ 7 bilhões em 2009. A maior queda, de 69,4%, aconteceu na demanda por crédito do setor de química e petroquímica, seguido pela redução de 30,6% de papel e celulose e de menos 20,9%, na decisão de investir da metalurgia.
As consultas para projetos na infraestrutura cresceram em janeiro-fevereiro de 2009 cerca de 14,2% ante o mesmo período de 2008. O setor de energia elétrica foi o maior demandante de novos financiamentos. Sua solicitação para financiamentos de projetos cresceu 195,56%. Puga lembrou que este setor continua aquecido. "Só os investimentos do rio Madeira vão ajudar puxar a taxa de investimento este ano, pois são projetos ligados a contratos com o governo com orçamentos de quatro a cinco anos", destacou Puga. A exceção na área de infraestrutura foi o setor de telecomunicações, onde as consultas recuaram 98% nos primeiros dois meses do ano.
O economista do Ipea concorda com a avaliação do BNDES de que o que está mais forte para ocorrer em termos de investimento é a área de infraestrutura. "Insumos básicos foi a área mais afetada. A siderurgia, por exemplo, recebeu uma pancada em termos de preço. Isto indica redução de lucro unitário. Ou seja, a tonelada de aço ficou mais barata e verificamos que a tonelada de celulose também". Segundo Bahia, o empresário avalia o retorno de um projeto de investimento em cima do comportamento do lucro corrente. Quando ocorre a redução do lucro unitário, ela abala as avaliações de retorno dos projetos em carteira. Esta redução da taxa de lucro está ocorrendo de maneira geral nas empresas, alerta o economista.
Outros setores da industria brasileira estão também reduzindo seus ganhos por não repassarem a alta dos insumos importados para os preços internos, por temor de perder mercado para a concorrência chinesa. "Por isso não está havendo inflação", constata Bahia. Ele acredita que no cenário atual, as empresas, acostumadas a colocar pelo menos 50% do seu lucro em investimentos, vão reter o lucro e buscar retorno mais seguro em aplicações conservadoras como títulos do Tesouro. "O quadro não está bem definido e a tendência é segurar investimento", conclui.