Título: Apesar da crise, governo mantém as metas da política industrial
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2009, Brasil, p. A2

Apesar da crise econômica internacional, o governo decidiu que será possível manter as metas da política industrial lançada em maio do ano passado, como o aumento do investimento na produção industrial e o crescimento da participação brasileira no comércio global, garante o presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Reginaldo Arcuri. Ele informa que começou, neste ano, a funcionar o modelo previsto na chamada Política de Desenvolvimento da produção (PDP), de coordenação entre ministérios e agências governamentais para subordinar as medidas de apoio à indústria aos planos de longo prazo discutidos com o setor privado.

"Já está vigorando tudo que foi lançado como medida da PDP, de caráter regulatório, como as decisões que dependiam de projeto legislativo", informa Arcuri. "Implementamos item por item, e algumas coisas a mais", acrescenta. Ele admite que algumas das medidas tardaram até 90 dias para entrar em vigor, mas argumenta que o principal avanço da nova política foi o modelo de decisão, ancorado na coordenação dos órgãos do governo. Em consequência, por exemplo, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) hoje participa do processo decisório de projetos do BNDES, e vice-versa, o que fez com que o banco assumisse, no fim do ano passado, parte das subvenções ao programa de investimentos e pesquisas do Ministério da Saúde que não cabiam no orçamento da Finep.

A crise mundial, paradoxalmente, facilitará o cumprimento de pelo menos uma das metas, a que previa conquistar, para o Brasil, pelo menos 1,25% do comércio mundial, até 2010. Segundo levantamento da Organização Mundial do Comércio (OMC), o país, devido à retração da atividade comercial em todo o mundo, já ocupava 1,2% em 2008. Mesmo com a queda prevista, de 20%, nas exportações brasileiras, o desempenho pior das outras nações vai fazer com que o Brasil ganhe importância relativa no comércio global.

Outra meta importante para a política de desenvolvimento, porém, enfrenta maior dificuldade: o aumento dos investimentos produtivos. A PDP previa alta significativa nos investimentos para o aumento da capacidade de produção no país, que deveriam chegar a 21% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010. Até o terceiro trimestre de 2008, o indicador desses investimentos, a Formação Bruta de Capital Fixo, ficou em 20,4% do PIB, o que antecipava o cumprimento da meta.

A crise , contudo, provocou uma queda de quase 10% no último trimestre do ano, em comparação com o trimestre anterior, mas ainda assim houve crescimento de mais de 16% no indicador em 2008. Os técnicos ainda acreditam que será possível chegar à meta fixada pela política industrial, diz o diretor da Área de Planejamento do BNDES, João Carlos Ferraz, um dos responsáveis pela elaboração da PDP.

Ferraz lembra que, em janeiro, a crise foi discutida pelos comitês-executivos de acompanhamento da PDP, formados por técnicos do governo encarregados de acompanhar a execução das medidas e as demandas e queixas dos empresários. Esses comitês levaram a Brasília a avaliação dos empresários sobre as dificuldades criadas pela crise, e essa avaliação orientou a lista de medidas em exame pelo Ministério da Fazenda em questões tributárias, e levou à expansão, no BNDES, de linhas de financiamento, e ainda ao que Ferraz chama de "apoio técnico" à indústria em ações conjuntas com a ABDI e a Apex.

Entre as medidas da lista elaborada em janeiro e já postas em prática estão a linha de incentivo ao investimento, o aumento da cobertura do financiamento a máquinas e equipamentos (Finame) e a gradual ampliação do uso do cartão BNDES, pelo qual é simplificado o financiamento do banco às aquisições feitas pelas empresas em fornecedores pré-cadastrados. "Ainda estão em exame temas distintos na agenda tributária, como os tempos de pagamento, compensação de créditos, e em assistencia técnica", comenta Ferraz.

"A PDP não foi montada nem vai servir para atacar questões pontuais", comenta Arcuri. "Manter o rumo é essencial para uma política desse tipo não deixar que se criem situações paradoxais entre as situações de emergência e o que fazemos a longo prazo", argumenta.

O sistema montado pela nova política industrial prevê responsáveis, na burocracia, para acompanhar os programas, a maior parte deles "medidas de apoio técnico" , como projetos dedicados a pequenas e médias empresas, que receberão, por exemplo, ajuda do Sebrae para constituição de Sociedades de Garantia de Crédito, destinadas a facilitar o acesso dessas empresas a empréstimos.

São mais de 80 as medidas regulatórias da PDP lançadas no ano passado e já em vigor; algumas criticadas pela demora em sua aplicação, como foi o caso do drawback verde e amarelo, que reduz tributação na compra de insumos nacionais destinados a mercadorias de exportação. Posto em ação só em outubro, o programa chegou no momento em que as empresas já sofriam retração de encomendas devido à crise mundial.

Arcuri argumenta que as medidas ajudam a minimizar os efeitos da crise, ao melhorar a competitividade das empresas. "Não existe símbolo melhor de fortalecimento da PDP num momento de crise que o reforço de US$ 100 bilhões anunciado para o BNDES", afirma João Ferraz. "Permite ao banco um grau de liberdade para estruturar programas e avisar aos clientes", argumenta.

Antes preocupados com a demora na regulamentação das medidas, os empresários agora elogiam as decisões da PDP, mas reivindicam que o governo tenha agilidade para resolver as novas demandas que vêm surgindo, segundo comenta o diretor-executivo da Confederação Nacional da Indústria, José Augusto Fernandes. "Na crise, mais que preocupados com os novos investimentos, os empresários estão lutando para sobreviver", endossa o diretor de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Federação das Indústrias de São Paulo, Roberto Giannetti. "Nesse cenário, políticas industriais tem menos importância", acredita ele.