Título: SDE apura cartel na área de fertilizantes
Autor: Zanatta , Mauro
Fonte: Valor Econômico, 24/04/2009, Empresas, p. B9

A Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça decidiu abrir um processo administrativo para investigar uma suposta formação de cartel na produção de matérias-primas para produtos intermediários e fertilizantes básicos no país. O pedido formal foi apresentado há exatamente um ano pela Comissão de Agricultura e Pecuária da Câmara dos Deputados.

A SDE recomendou a abertura da investigação com base em estudos realizados por especialistas dos ministérios da Agricultura, da Fazenda e de Minas e Energia, além da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA). Em sua recomendação, a SDE afirma que "é possível constatar que tanto o mercado de fertilizantes finais como os sub-mercados que o compõem são altamente concentrados no Brasil".

Mas ressalva que 65% dos fertilizantes consumidos no país são importados - o percentual ficou próximo de 70% em 2008. Os especialistas da SDE afirmam que as "preocupações de ordem concorrencial" são "válidas e passíveis" de enquadramento nas investigações de formação de um suposto cartel no segmento.

As empresas Bunge Brasil, Mosaic Fertilizantes e Yara Brasil Fertilizantes serão notificadas, via correspondência, até a próxima semana, informou ontem a SDE. Depois disso, terão até 30 dias para apresentar sua defesa. O Departamento de Proteção e Defesa Econômica do Ministério da Justiça começará, então, a colher provas e recolher a documentação necessária para dar consistência ao processo. Em seguida, o resultado da investigação será submetido ao julgamento dos membros do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Entre as bases para o pedido de abertura de investigação, está um relatório da Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda apontando que cinco grupos dominaram as vendas de fertilizantes no Brasil em 2008 - Bunge (32,44%), Yara/Trevo (13,18%), Mosaic/Cargill (11,5%), Fertipa (8,18%) e Heringer (7,19%).

A Seae aponta, ainda, a existência de um "controle acionário cruzado" em razão de aquisições realizadas nos últimos anos. Além disso, há uma "grande integração vertical" no setor porque as empresas produtoras de fertilizantes são também produtoras de commodities agrícolas. "É o caso do grupo Bunge e da Cargill, que participam do mercado de sementes e de commodities agrícolas", diz o relatório. O índice de concentração das quatro principais empresas do setor chegam a 82,38%, segundo dados compilados pelos técnicos do Ministério da Agricultura, Ali Saab Ricardo de Almeida Paula.

Procuradas, Bunge, Mosaic e Yara afirmaram, por meio de suas assessorias, que não se manifestariam sobre o caso antes de receberem a notificação da SDE. Mas o Valor apurou que as defesas que serão apresentadas manterão uma linha já bastante conhecida, uma vez que a ameaça de abertura de investigação já é antiga.

Em primeiro lugar, as empresas insistirão que os preços dos produtos vendidos seguem as oscilações do mercado internacional, uma vez que é grande a dependência brasileira das importações. Além disso, apresentarão estudos que mostram a atuação de diversas empresas menores, algumas regionais, nas vendas de produtos finais, e que demonstram que a concentração na exploração e produção de matérias-primas é global e necessário. Todos esses estudos já foram apresentados aos ministérios envolvidos no caso.

"Os custos para a exploração de uma mina de fosfato, por exemplo, superam US$ 1 bilhão. Apenas para apurar a viabilidade de uma jazida, cada furo custa R$ 1 milhão", afirma um especialista. Para outra fonte, a abertura da investigação atende à pressão específica do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e será facilmente contornada pelas companhias do ramo. Stephanes entrou em rota de colisão com as empresas de fertilizantes no fim de 2007, por causa da disparada dos preços do insumo no país.