Título: Valorização do real não é boa, diz presidente do BNDES
Autor: Leo, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 14/05/2009, Brasil, p. A3
Sergio Leo, de Brasília
A valorização do real em relação ao dólar "não é boa" se representar uma tendência de longo prazo, e o governo não pode "cruzar os braços", comentou o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, ontem durante depoimento à Câmara dos Deputados, sobre a crise econômica mundial. Coutinho comentou que grande parte da desvalorização do dólar se deve a um movimento mundial de valorização em relação à moeda americana, e que não é possível eliminar totalmente esses efeitos sobre a economia brasileira. Após a palestra, disse ser cedo, ainda, para dizer que há uma tendência de valorização sustentável do real.
"Não podemos imaginar que iremos contrabalançar completamente os efeitos globais, mas não podemos cruzar os braços e deixar a apreciação (do real) correr solta", comentou Coutinho, respondendo a uma pergunta do deputado Antonio Palocci (PT-SP), que pediu comentários sobre a queda nas cotações do dólar. Palocci argumentou que, no mesmo período em que o real valorizou-se 15% em relação ao dólar, o dólar canadense valorizou-se 17% e o won coreano, 22%. Coutinho concordou com a tese de que a situação da economia americana tem levado a uma deterioração na cotação do dólar em relação a outras moedas.
Coutinho comentou que a manutenção de saldos positivos nas contas do Brasil com o exterior e o acúmulo de reservas internacionais foram essenciais para evitar que a crise internacional tivesse forte impacto sobre o Brasil. "O Banco Central foi sábio; sem o que fizemos o Brasil não teria passado no teste de estresse". À saída, Coutinho comentou que é papel dos bancos centrais esterilizar a entrada excessiva de recursos externos, mas que o BC brasileiro tem realizado uma "política competente". Os movimentos nos mercados internacionais para ele, parecem configurar "uma minibolha nos mercados de capitais, nas bolsas de valores, que talvez seja passageira."
Ao falar aos deputados, Coutinho, otimista, garantiu que o Brasil crescerá mais que a média mundial nos próximos anos, e que os investimentos em infraestrutura não serão afetados pela crise internacional. Quatro fatores, segundo o presidente do BNDES, sustentam o otimismo: a existência de investimentos represados de alto retorno e baixo investimento para atender à demanda que se mantém no país; o programa de investimentos da Petrobras, a resistência do mercado interno, beneficiado pelos recentes aumentos no salário mínimo e no piso previdenciário; e as cadeias produtivas ligadas ao agronegócio, com boas perspectivas neste ano.
Esses fatores permitirão em 2010 a retomada de "um processo virtuoso de crescimento com investimento em ascensão", previu Coutinho. Ele sustenta que a demanda latente no país sustentará os investimentos em telecomunicações, previstos em R$ 77,8 bilhões nos próximos quatro anos, e em energia elétrica (R$ 141 milhões). "Os investimentos em infraestrutura serão o grande esteio do crescimento brasileiro", insistiu, relatando ter recebido, nas últimas semanas, representantes gestores de fundos de investimento responsáveis por carteiras de investimentos equivalentes a US$ 1,6 bilhão.
"Não há dúvida que a decisão de investir no Brasil já foi tomada", disse, também atendendo ao apelo de Palocci para que comentasse se os empresários estrangeiros não perceberam o potencial de recuperação do Brasil antes dos empresários nacionais. "A economia tem condições de se descolar da economia global nos próximos anos."
Os investimentos previstos em infraestrutura, pelo BNDES, somam R$ 319 bilhões no período 2009 a 2012. No caso dos investimentos industriais, os investimentos em petróleo e gás significarão mais da metade (R$ 270 bilhões) do total de R$ 450 bilhões previstos na indústria entre 2009 a 2012. No caso dos investimentos em energia, o BNDES computa as usinas do rio Madeira, mas não incluiu na previsão investimentos importantes, como a usina de Belo Monte e e outras, explicou.
Para Coutinho, o gráfico de recuperação da economia brasileira deverá mostrar um "v", com uma queda rápida e pronunciada seguida por uma recuperação também forte em curto espaço d e tempo. "Talvez a recuperação não seja tão pujante, mas será firme, como vem sendo evidenciado por vários tipos de indicadores", afirmou.
Coutinho ouviu críticas pela demora na liberação de recursos prometidos para os setores afetados pela crise e argumentou que há uma demora natural pelos cuidados do banco com a qualidade da carteira de empréstimos.