Título: Aço chinês toma lugar do brasileiro na AL
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 17/04/2009, Brasil, p. A5

A China está deslocando o Brasil como fornecedor de aço para a América Latina. As exportações de produtos siderúrgicos chineses para os países da região, excluindo o Brasil, cresceram 90% nos últimos dois anos, enquanto as vendas brasileiras para os vizinhos caíram 38,5%.

Em 2008, as siderúrgicas chinesas venderam 1,9 milhão de toneladas de aço para os países latino-americanos, enquanto as brasileiras exportaram 2,6 milhões. Em 2006, a diferença era bem maior: a China vendia 1 milhão de toneladas na região, muito abaixo das 4,5 milhões de toneladas do Brasil.

Os dados são do Instituto Latino-Americano de Ferro e Aço (Ilafa) e do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS) . "É uma situação preocupante, porque a América Latina é um mercado natural para as siderúrgicas brasileiras", disse Marco Polo de Mello Lopes, vice-presidente executivo do IBS.

Com os mercados americano e europeu em crise, a América Latina se transformou em uma das poucas regiões em que a China incrementou as vendas de aço.

Entre 2006 e 2007, as exportações de produtos siderúrgicos chineses subiram 50,6% para o mundo e 20% para a América Latina (excluindo o Brasil). Entre 2007 e 2008, as vendas do país asiático avançaram apenas 9,2% para o mundo e expressivos 58% para os latino-americanos.

A China também elevou as vendas de aço para o Brasil. De apenas 100 toneladas em 2006, chegou a 700 toneladas no ano passado. O volume, no entanto, ainda é muito pequeno comparado com os 24 milhões de toneladas que o país consome.

Boa parte da perda de participação do aço brasileiro na América Latina pode ser atribuída ao redirecionamento feito pelas siderúrgicas para o mercado local, que estava bastante aquecido. As exportações totais de aço caíram 26%, de 12,5 milhões de toneladas em 2006 para 9,2 milhões em 2008.

No entanto, a queda nas vendas para a América Latina foi ainda mais expressiva por conta da concorrência da China. Resultado: a região segue como principal cliente do Brasil, mas perdeu espaço. Em 2008, os vizinhos absorveram 35,8% das exportações brasileiras de aço. Em 2008, esse percentual caiu para 30%.

O mercado de aço estava tão favorável que a disputa com os chineses não se refletiu na receita obtida pelas siderúrgicas brasileiras na América Latina. A contração no volume foi mais do que compensada pela alta de preços e as exportações de aço, em valores, para os países vizinhos cresceram 18%, saindo de US$ 2,5 bilhões em 2006 para quase US$ 3 bilhões no ano passado.

O problema só começou a aparecer depois que a crise global atingiu duramente o mercado brasileiro, derrubando o consumo pela metade em novembro e dezembro. As siderúrgicas locais tentaram jogar esse volume no mercado externo, mas não conseguiram. Seis dos 14 alto-fornos instalados no país estão parados e o setor opera com apenas 48,7% da capacidade instalada.

Incentivada pelo governo, que restabeleceu incentivos tributários para a exportação, a indústria de aço chinesa foi na contramão do mundo e não reduziu a produção. No primeiro bimestre de 2009, a produção de aço da China cresceu 2,4%, comparado com a queda de 23% na produção mundial. Se a produção chinesa for excluída, a baixa chega a 37%.

Nesse cenário, é grande a preocupação com a concorrência "predatória" dos chineses. Em conjunto com os demais países da América Latina, o Brasil se juntou a sete entidades do setor siderúrgico de diferentes países (EUA, UE, Canadá, México e outros) e enviou um ofício ao governo da China na terça-feira. "A indústria de aço chinesa deve ser regulada por princípios de mercado e não pela regulação do governo", diz o documento.

É pouco provável que esse tipo de movimentação provoque mudanças efetivas na China, mas a pressão política, que pode se refletir em sanções econômicas, está mais evidente. Na semana passada, a indústria de aço dos EUA protocolou um pedido de antidumping contra a China, cobrindo US$ 2,7 bilhões em importações - um dos maiores entre os dois países. No Brasil, a Usiminas também estuda abrir processo antidumping contra a China.