Título: Morales assume o segundo mandato
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 23/01/2010, Mundo, p. 27

Com respaldo de líderes regionais, indígena é empossado com a meta de firmar o socialismo

Com o braço esquerdo estendido para o alto e a mão direita sobre o coração, o presidente Evo Morales fez ontem seu juramento como presidente da Bolívia para os próximos cincos anos. A cerimônia, realizada na Assembleia Legislativa Plurinacional, em La Paz, contou com a presença dos presidentes do Chile, Equador, Paraguai e Venezuela e dos vice-presidentes da Colômbia e de Cuba. Uma autoridade polêmica foi recebida com honras militares: o chefe máximo da autoproclamada República Árabe Saaraui Democrática (RASD)(1), Mohamed Abdelaziz. ¿Para mim é uma honra estar aqui para compartilhar com o povo da Bolívia e seu presidente com motivo de seu segundo mandato e queremos compartilhar neste momento festivo com o povo boliviano¿, destacou a autoridade saaraui, que pretende estabelecer relações com a Bolívia.

A cerimônia serviu para que alguns governos mandassem um recado para Morales. O representante do presidente peruano, Alan García, e ex-chefe do gabinete de ministros, Yehude Simón Munaro, destacou que o Peru quer melhorar as relações com a Bolívia. ¿Nossos povos têm que fazer coisas e estou certo de que nenhum presidente seguirá a linha do conflito; temos que nos unir e andar lado a lado¿, disse o peruano.

A subsecretária de Assuntos Globais do Departamento de Estado de EUA, a boliviana María Otero, pediu que o governo de Morales trabalhe pela recuperação do desastre no Haiti e deixe de lado as observações que dizem respeito aos EUA. ¿É importante que, neste momento, em lugar de pensar o que faz um país lá ou que faz outra nação, vejamos que todos os países e os EUA, com os recursos que têm, estejam colaborando juntos, estejam respondendo o povo haitiano¿, afirmou. Na quarta-feira, Morales anunciou que pediria à Organização das Nações Unidas (ONU) uma reunião de emergência para ¿repudiar e rejeitar a ocupação militar dos EUA¿ no país caribenho.

Já os governos da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba) enviaram mensagens de apoio ao governante boliviano. O presidente venezuelano, Hugo Chávez, considerou a vitória de Morales ¿um exemplo de que os povos da América Latina despertaram da longa noite neoliberal¿. Por sua vez, o equatoriano Rafael Correa declarou que a reeleição de Morales ¿é uma vitória de todos¿ e advertiu que ¿as tentativas separatistas e desestabilizadoras contra os governos progressistas e revolucionários da América Latina não têm futuro¿.

Expectativa brasileira

Para representar o Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou o assessor especial para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, que deve se reunir com funcionários de Morales e analisar temas bilaterais. Ontem, o jornal boliviano La Prensa publicou uma entrevista exclusiva com Lula, na qual o presidente destacou suas expectativas em relação ao novo governo de Morales. ¿O gás seguramente continuará com um papel central na agenda bilateral, contribuindo para que o Brasil continue como o principal sócio comercial da Bolívia. Temos o desafio, por outro lado, de avançar no tema da planta de liquefação, de modo que se concretize a antiga aspiração boliviana de agregar valor localmente a sua riqueza gasífera e, por fim, gerar renda e desenvolvimento tecnológico para as próximas gerações¿, disse Lula.

O líder brasileiro alegou que pretende avançar com os projetos gás-químicos em Tarija e Puerto Suárez e instalar uma fábrica de fertilizantes em Puerto Suárez. Lula também reiterou o interesse do Brasil na exploração do lítio, no Salar de Uyuni, e na construção da conexão interoceânica que ligará os oceano Pacífico e Atlântico. Com 64% de apoio popular e maioria no Legislativo, Morales assume com a proposta de promover um Estado socialista e tentar obter o controle regional dos departamentos. Os bolivianos voltam às urnas em 4 de abril para escolher nove governadores, 234 deputados estaduais, 327 prefeitos e 1.700 conselheiros municipais.

1 - Luta de três décadas A luta pela independência do Saara Ocidental, uma ex-colônia espanhola anexada em 1975 por soldados marroquinos, já dura 34 anos. O Marrocos não aceita que parte do Saara Ocidental ¿ que abriga as maiores reservas de fosfato do mundo ¿ deseje a independência. Em 1975, os independentistas da Frente Polisário, apoiados pela Argélia, autoproclamaram a República Árabe Saaraui Democrática (RASD), reconhecida por cerca de 70 países e cujo governo está estabelecido nos campos de refugiados de Tindouf, no sudoeste da Argélia. Por outro lado, o Marrocos adia, desde 1992, o referendo que permitiria que os saaráuis escolhessem se querem um país independente ou que o território faça parte do Marrocos. O caso é analisado por uma comissão da ONU.