Título: Venezuela já gastou US$ 7,4 bi com a estatização de empresas
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 19/05/2009, Rittner, Daniel, p. A10

O governo da Venezuela já gastou US$ 7,4 bilhões com estatizações e desapropriações de empresas instaladas no país, nacionais ou estrangeiras, numa prova de que o projeto de instaurar o "socialismo do século XXI" não sai caro apenas para a imagem do presidente Hugo Chávez.

Pelo menos 12 companhias estrangeiras já foram estatizadas desde 2006. E não há nenhuma indicação de que o cerco às multinacionais vá acabar: está previsto para esta sexta-feira o anúncio de um acordo com o grupo espanhol Santander para a aquisição do Banco de Venezuela, o mais antigo do país, que hoje detém 11% da carteira de crédito e do total de depósitos. A nacionalização do banco, conforme afirmou o próprio Chávez em cadeia de rádio e televisão, deve ser concretizada ainda nesta semana.

O levantamento, realizado pelo Centro de Investigações Econômicas (Cieca), indica que o maior gasto até hoje foi com a compra de 28% das ações da operadora de telefonia Cantv, pertencentes à americana Verizon, e outras intervenções necessárias para assumir o controle societário da companhia. Isso custou US$ 2,2 bilhões aos cofres públicos. A Movilnet, marca de telefonia móvel da Cantv, tem 43% do mercado. Em 2008, a empresa instalou 1,3 milhão de linhas fixas residenciais, segundo informação de sua página na internet.

De acordo com Franklin Rojas Penso, diretor do Cieca, o governo tem usado títulos da dívida para indenizar empresários venezuelanos que tiveram propriedades desapropriadas. No caso de empresas estrangeiras, a preferência de Chávez tem sido pagar em dinheiro, para evitar um conflito ainda maior. Para ele, "não há nenhum sinal de que [o Banco da Venezuela] será a última estatização" e a queda do petróleo não freou o ímpeto do presidente na tomada de empresas.

Chávez ainda não desembolsou um centavo sequer para indenizar multinacionais como a Cargill, as cimenteiras mexicana Cemex e colombiana Andino, e a fabricante de embalagens irlandesa Smurfit Kappa, cujas plantações de eucalipto foram desapropriadas em março. Rojas estima que, se o governo pagar todas as indenizações devidamente, incluindo a empresários nacionais, poderá gastar até US$ 15 bilhões.

Nos cálculos do Cieca entram não só as desapropriações, mas investimentos do Estado nas chamadas "empresas socialistas". Chávez criou estatais para produzir válvulas e papel higiênico. O governo tomou 452 fazendas que se dedicam à produção agropecuária, mandou ocupar uma processadora de sardinhas e assumiu o comando da Aeropostal, companhia aérea mais tradicional do país e hoje reduzida a poucos voos. Chegou a desapropriar até um centro genético especializado na procriação de búfalos.

A última investida contra o setor privado ocorreu há duas semanas e envolveu a indústria petrolífera. A estatal PDVSA, responsável por mais de 90% das exportações venezuelanas, entrou numa espiral de inadimplência devido à queda dos preços do petróleo e acumulava dívidas estimadas em US$ 12 bilhões com seus fornecedores. Sem dinheiro para acertar as contas, Chávez ordenou a tomada das empresas.

Das multinacionais que tiveram intervenção, o governo pagou as americanas AES, para retomar o controle da Electricidad de Caracas, e CMS Energy, para assumir a Seneca, distribuidora de energia na Ilha Margarita. Também indenizou a siderúrgica argentina Sidor-Techint e as cimenteiras Lafarge (francesa) e Holcim (suíça), além de empresas britânicas de agronegócio.

Agora, com a nacionalização do Banco de Venezuela, Chávez busca ter um canal direto de repasse dos recursos federais para seus programas sociais, as "missões" bolivarianas. Hoje, todo o repasse é feito por meio de bancos privados. Antes da ofensiva do governo, o Santander havia recebido sondagens para vender a tradicional instituição financeira venezuelana ao Banco Occidental de Descuentos. Se fosse concretizado, o negócio criaria o maior banco do país. A partir de 2008, Chávez passou a buscar um "acordo" com o Santander. Na semana passada, Emílio Botín, presidente do grupo espanhol, disse esperar que as negociações terminem "satisfatoriamente".