Título: Retomada já começou, mas exige atenção
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Fonte: Valor Econômico, 19/05/2009, Especial, p. A14

navegar com menos turbulência nos primeiros meses de 2009. Quanto mais ligada à demanda doméstica, menos a empresa sentiu a crise, segundo relato de empresários que ontem receberam o prêmio Executivo de Valor 2009, em solenidade no bufê Rosa Rosarum. O amargo final de 2008, informam estes executivos, ficou para trás, mas o momento ainda exige controle de custos, monitoramento de oportunidades, reavaliação de investimentos, e percepção da real demanda do consumidor. E por enquanto, reforçam, só a China ajuda as exportações.

A Positivo Informática, maior fabricante nacional de computadores, é um exemplo da recuperação dos setores ligados ao consumo. A empresa vai retomar hoje o terceiro turno em sua fábrica de Curitiba, interrompido desde o agravamento da crise econômica, que derrubou as vendas de PCs. Para o presidente da empresa, Hélio Rotenberg, já existem alguns sinais de recuperação na demanda por computadores. "Estamos mais otimistas que no fim de 2008", disse ele. Segundo Rotenberg, licitações do governo ajudaram a compensar a queda nas vendas de PCs para pessoas físicas.

Outras empresas que creditam os bons resultados ao mercado interno e às políticas públicas são WEG, Fiat e Gafisa. Na área de motores para uso doméstico da WEG, a produção está acima do volume do ano passado por conta da redução de Imposto sobre Produtos Importados (IPI), conta Harry Schmelzer Junior, presidente da empresa, que separa os desempenhos neste ano pelos setores em que atua. Na área de equipamentos industriais, o volume de produção, tanto no Brasil quanto no exterior, teve uma queda importante em relação ao ano passado. Em energia, a empresa tem uma boa carteira, mas o ritmo dos novos pedidos está menor que o de 2008.

Os pontos de venda do Magazine Luiza também responderam bem à diminuição, na linha branca, do IPI. As vendas aumentaram cerca de 25% depois da medida do governo, conta a presidente da empresa, Luiza Helena Trajano

A WEG, diz Schmelzer Junior, sempre investiu muito em capacidade fabril e com muita velocidade para sustentar seu crescimento acelerado. Agora, com a retração da economia mundial, a companhia pode "tirar o pé do acelerador e reduzir a velocidade de implantação das novas fábricas". Na Índia e no México os projetos foram retardados em alguns meses.

Cledorvino Belini, da Fiat, informa que a empresa está hoje "próxima do patamar médio de produção do ano passado" - média de 2.900 veículos/dia, hoje. "Felizmente, a recuperação do mercado interno tem mantido bons índices de ocupação da indústria, embora insuficiente para compensar a queda dos volumes de produção para as exportações", acrescenta.

Na Alpargatas , o crescimento do primeiro trimestre foi de 5% sobre igual período de 2008, conta o presidente Márcio Utsch. "A empresa está crescendo, o elástico esticou", diz. E os investimentos não pararam. "Mas, prevendo a crise, no final do ano passado, fizemos uma readequação da estratégia. Decidimos focar o direcionamento dos recursos em redução de custos, tecnologia e internacionalização da empresa", resume Utsch.

A crise também não impedirá que a Gafisa cresça em 2009. Segundo cálculos da empresa, as vendas consolidadas devem ficar entre R$ 2,7 bilhões e R$ 3,2 bilhões este ano, contra R$ 2,6 bilhões em 2008. No primeiro trimestre do ano as vendas cresceram 11% - foram R$ 558 milhões, 46% no segmento de baixa renda, muito acima do peso de 10% alcançado nos três primeiros meses de 2008. "Se não tivéssemos diversificado nossa atuação, teríamos queda neste primeiro trimestre", diz Wilson Amaral, presidente da Gafisa.

A Mapfre, companhia de seguros, é outra companhia que está operando em um patamar melhor do que o do final do ano passado. "Estamos crescendo mais do que o mercado, inclusive conquistando market-share. Nosso faturamento cresceu 22,6% nos primeiros quatro meses do ano em relação ao ano passado e 4,2% em relação ao fim do ano passado", conta o presidente da empresa, Antonio Carlos dos Santos. Por conta dos bons resultados, os investimento foram mantidos, porém com uma política de controle a curto prazo para liberação de verbas bimestrais.

O presidente da Cargill, Marcelo Martins, diz que os negócios em 2009, "seguem bem" quando comparados a 2008, mas admite que suas diversas linhas de produtos são afetadas de forma distinta pelo cenário econômico. Na Natura, diz Alessadro Carlucci, não ocorreu nenhuma queda de vendas neste início de ano. Para o presidente da Nestlé no Brasil, Ivan Zurita, o mercado está mais "sincerizado". O neologismo indica, na visão do executivo, um mercado "muito mais real, mais pé no chão", e pronto para identificar o real potencial de crescimento em cada setor.

Mesmo indiretamente, as medidas de redução de IPI ajudaram o setor de aço, diz Benjamin Steinbruch, da CSN. Com a crise mundial, muitos projetos foram suspensos e a produção cortada. Agora, ele prevê que as vendas da CSN cresçam 50% de abril a junho sobre o primeiro trimestre. As medidas de desoneração tiveram efeito em setores, como o automotivo e a habitação. "Tivemos um baque forte no fim do ano e no primeiro trimestre, mas agora vemos pequenas melhoras mês a mês". Mas o setor segue fraco, diz ele.

A principal resposta da rede de hotéis quatro estrelas Blue Tree para a crise será dada no final de junho: a inauguração do primeiro hotel da bandeira Spotlight, que marca a entrada da rede no segmento econômico. Serão cinco unidades em 18 meses, um total de R$ 120 milhões de investimento. "Estamos testemunhando a velha e conhecida frase "a crise também é oportunidade"", diz Chieko Aoki, presidente do conselho de administração da rede Blue Tree Hotels, dona de 23 unidades no Brasil, duas na Argentina e duas no Chile.

O setor de saúde ainda não foi fortemente afetado pela crise, segundo Mauro Figueiredo, presidente do grupo Fleury. Segundo ele, porém, caso a crise se prolongue, será difícil não sentir impactos. O grupo adequou seu planejamento orçamentário para um ambiente de menor crescimento. Em 2008, o faturamento do Fleury cresceu 21,5%. "Estamos atentos aos movimentos de mercado para eventuais ajustes, sejam esses para retomada do crescimento, sejam para eventual retração", diz.

A crise afetou o consumo de energia das indústrias e consequentemente as vendas da Eletropaulo no primeiro trimestre deste ano, que ficaram estáveis em relação ao ano passado. A redução de 13,5% do consumo industrial foi compensada pelo crescimento dos segmentos residencial (2,4%) e comercial (4,2%). "É um reflexo da crise. Para o ano, porém, temos a expectativa de crescimento de consumo total entre 1,7% e 2,0%", diz o presidente do grupo AES Brasil, Britaldo Soares. Com essa previsão, o grupo manteve o plano de investir 15% mais do que em 2008.

Bernardo Hees, diretor-presidente da ALL, conta que, no primeiro trimestre, o volume movimentado subiu mais de 10% no Brasil . "Pretendemos crescer de 10 a 12% em volume no Brasil e estamos contratando 300 colaboradores, entre maquinistas, operadores e técnicos", informou.

A Votorantim Celulose e Papel (VCP), segundo seu diretor-presidente, José Luciano Penido, vendeu um volume recorde de celulose no primeiro trimestre. Foram 349 mil toneladas - 14% acima do primeiro trimestre de 2008 e 17% acima do último trimestre do ano passado. Parte deste incremento decorreu do início de operação do projeto Horizonte, em Três Lagoas (MS), no fim de março, cujo investimento foi mantido.

De acordo com Bernardo Gradin, da Braskem, as condições já estão melhores do que estavam no início do ano. "Em março atingimos plena carga", disse. Segundo ele, a empresa se mantém competitiva na exportação e ainda aproveita o bom momento dos setores dependentes do varejo, como embalagens, higiene e alimentos.

A demanda, aos poucos, começa a se normalizar, mas ainda será de forma bem devagar até o fim do ano", avalia o presidente da Vale, Roger Agnelli. No primeiro trimestre, a queda de produção da empresa foi de 37%. "Mas enquanto a Europa está a 10 graus negativos, a China está com temperatura elevada, na casa de 40 graus positivos", afirmou. Sobre os investimentos, Agnelli disse que está revendo o valor, de US$ 14 bilhões em setembro, para menos de US$ 10 bilhões por conta da desvalorização real e também por conta de possível não liberação das licenças ambientais em alguns projetos no Brasil.

A diversidade de setores atendidos pela Totvs ajudou a companhia, que desenvolve softwares de gestão, a driblar a crise econômica. "Como temos clientes em vários setores, conseguimos mirar esforços em segmentos diferentes. A crise não atinge todos ao mesmo tempo", disse o presidente da companhia, Laércio Consentino.