Título: Falta de crédito no Brasil ajuda a valorizar açúcar
Autor: Blas , Javier
Fonte: Valor Econômico, 20/05/2009, Agronegócios, p. B11

O movimento de alta nos preços do açúcar foi amplificado pela queda das vendas de contratos para entrega futura no Brasil, maior exportador mundial, onde alguns produtores viram suas linhas de crédito ser bastante restringidas, segundo operadores e executivos.

O preço do açúcar na bolsa de Nova York subiu na semana passada para o maior patamar em três anos, impulsionado pelos problemas na colheita indiana, maior consumidor mundial do produto.

Operadores dizem que, em circunstâncias normais, os contratos futuros das empresas brasileiras - que servem como proteção contra oscilações de preço - deveriam ter contido a alta desencadeada pelas compras especulativas e pesadas importações indianas. Essas operações de hedge, porém, foram escassas, já que muitos produtores brasileiros estavam sem linhas de crédito para financiar margens.

Os participantes dos mercados futuros precisam fazer um depósito inicial, a margem, em cada negociação. Além disso, se o mercado mover-se em direção contrária a sua posição, recebem uma chamada de margem, um pedido para depósito de mais garantias.

"Em relação aos níveis históricos, estamos vendo uma restrição maciça no lado da venda no mercado de açúcar", afirmou Toby Cohen, da negociante londrina de açúcar Czarnikow, cuja visão é amplamente compartilhada entre outros participantes do mercado. "Quando as usinas precisam de todo o capital disponível para manter as operações em funcionamento, o hedge torna-se um luxo".

Operadores do setor, porém, ressaltaram que o problema não é generalizado. Enquanto as produtoras e negociantes brasileiras de menor escala enfrentam dificuldade, grandes empresas, como a Cosan, operam quase normalmente.

Manoel Fernando Garcia, da S/A Fluxo, uma das maiores comerciantes de açúcar no país, afirmou que as linhas de crédito usadas para financiar contratos futuros foram reduzidas drasticamente em comparação ao nível dos últimos dois anos. "Não saberia dizer se é 60% ou 80% [menor], mas é consideravelmente mais do que 50%", disse ao "Financial Times".

Garcia observou que os produtores brasileiros de açúcar estavam extremamente ansiosos em tentar aproveitar os altos preços atuais para fazer operações de proteção na forma de contratos para entrega em outubro de 2009 e março de 2010, mas sua capacidade para fazê-lo é extremamente limitada.

"Para fixar os preços nos contratos com entrega em outubro, eu teria de ter linhas de crédito para cobrir as chamadas de margem, enquanto os preços continuam subindo", afirmou. "Mas os bancos estão sendo extremamente cautelosos e simplesmente não temos as linhas", acrescentou Garcia.

A indústria açucareira brasileira, que requer uso intensivo de capital, alavancou sua expansão com base no endividamento barato do passado e vem sofrendo sob o peso da atual letargia do crédito. Também teve de enfrentar um cenário de baixos preços durante a maior parte de 2007 e o início de 2008. Cinco empresas, com produção em torno a 1 milhão de toneladas, o que representa 4% das exportações do país, entraram em processo de recuperação judicial, o equivalente do pedido de proteção contra credores do Capítulo 11 da lei de falências dos EUA.

Jonathan Kingsman, da consultoria Kingsman, com sede em Lausanne, na Suíça, afirmou que o crédito tanto para financiar o comércio como a expansão das empresas da área não está mais tão disponível quanto estava no início da década, período marcado pelo grande crescimento das produtoras.

Apesar dos problemas, o Brasil encaminha-se a exibir uma produção recorde de 36,4 milhões a 37,9 milhões de toneladas nesta temporada, segundo estimativas oficiais. Na safra passada, a produção foi de 31,6 milhões de toneladas.