Título: Royalties redistribuídos
Autor: Abreu, Diego; Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 11/03/2010, Política, p. 6

Emenda aprovada na Câmara faz minguar recursos daexploração de petróleo para estados produtores, mas governo espera queregra não passe no Senado

Especial para o Correio

O estado do Rio de Janeiro e seus municípios foramos grandes prejudicados com a aprovação, ontem, na Câmara dosDeputados, da nova divisão dos royalties do petróleo, mesmo fora dacamada do pré-sal. Durante todo o dia, líderes dos partidos estiveramreunidos para traçar uma saída consensual para o sistema de partilhados recursos. Em cima da mesa, a proposta do governo era manter asfatias atuais, que beneficiam os municípios e os estados produtores Rio, São Paulo e Espírito Santo. Mas, por 369 votos a favor e 72contra, foi aprovada a emenda dos deputados Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) eHumberto Souto (PPS-MG) que determina a divisão igualitária dodinheiro.

A emenda determina que sejam resguardados 40% dos royalties para aUnião, e que os 60% restantes sejam distribuídos entre estados emunicípios, usando os critérios do Fundo de Participação dos Estados(FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Durante a guerra travada na sessão de ontem, o plenário aindaaprovou um recurso contra a decisão do presidente da Casa, Michel Temer(PMDB-SP), de não admitir a emenda dos colegas última manobra da basealiada. Agora, os prejudicados apostam em uma decisão do SupremoTribunal Federal (STF) para manterem no Orçamento os atuais recursosprovenientes do petróleo, estimados em R$ 8,1 bilhões anuais para essesestados e seus municípios. Com a nova regra, a projeção é que o Rioperderá cerca de R$ 7,2 bilhões.

Derrota

Antevendo a derrota na Câmara, deputados da bancada fluminensetentaram negociar uma contraproposta à emenda Ibsen-Souto. A ideia eraencontrar um meio termo que alterasse a divisão atual dos royalties,mas não causasse tanto impacto nas finanças dos estados produtores. Osistema atual é injusto porque não beneficia a todos. Se a própriaConstituição não distingue os entes federativos, por que uma lei ofaria?, questiona Ibsen Pinheiro.

O governo federal, que insistiu na manutenção das regras atuaispara a partilha dos recursos, também saiu derrotado da votação. Osestados e municípios produtores merecem ser compensados pelos danosambientais provocados pela exploração. A emenda aprovada comete umainjustiça, reclama o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP). OPalácio do Planalto tentará reverter o resultado no Senado, mas nãodescarta um possível veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva àemenda.

Inconformados com a perda de recursos, o governador do Rio deJaneiro, Sérgio Cabral (PMDB), deputados e prefeitos de cidadesfluminenses foram ao Supremo pedir agilidade no julgamento de ummandado de segurança que questiona a divisão proposta pela emendaIbsen-Souto. Mas a ação, protocolada pelo deputado federal GeraldoPudim (PR-RJ), ainda não tem data para ser apreciada. As lideranças doRio reclamam que a emenda é inconstitucional por alterar uma norma quejá é de direito dos municípios produtores.

Nem Salvador Dalí conseguiria fazer algo tão surrealista como essaemenda, que é de uma grande leviandade constitucional. É preciso terprincípio de solidariedade federativa e bom senso, ironizou Cabral. Opagamento de dívidas do Rio com a União, que atualmente são descontadasdos royalties, ficarão comprometidas com a divisão proposta pela emendaIbsen-Souto, completa Cabral.

Destino

Prefeita de Campos dos Goytacazes (RJ), a ex-governadora RosinhaGarotinho garantiu que o município quebrará caso perca os recursos dosroyalties. O Rio de Janeiro vai estar fadado a virar uma serra pelada.O presidente Lula nos confidenciou que vai vetar (a emenda) caso oCongresso retire os royalties atuais, diz Rosinha.

Para o líder do PSDB na Câmara, deputado João Almeida (BA), há umexagero na gritaria promovida pelo governador e pelos prefeitos do Riode Janeiro. O estado não quebrará. A divisão aprovada pode não ser amais justa, mas é o que foi possível, pela pressa do próprio Palácio doPlanalto em aprovar o marco regulatório do pré-sal antes das eleições,aponta Almeida.

Mesmo que um futuro veto do governo federal à emenda Ibsen-Soutoseja derrubado pela Câmara, o destino mais provável da partilha dosroyalties deve ter como endereço o STF. Desde 1946 o sistema previa apartilha que beneficia os estados e municípios produtores. O conflito étão grande que só deve ser definido pelo Judiciário, independentementedo que Câmara, Senado e governo federal decidam, aposta o deputadoFlávio Dino (PCdoB-MA).

MAIORIA DAS PECS, SÓ DEPOIS DA SEMANA SANTA Líderes partidários e o presidente da Câmara dos Deputados,Michel Temer, definiram ontem que só daqui a 20 dias, ou seja, depoisda semana santa, poderão ser retomadas as votações de algumas propostasde emenda à Constituição (PECs). Serão três semanas de recesso devotação de PECs, disse o líder do PSDB na Câmara, deputado JoãoAlmeida (BA), após participar da reunião. O governo, entretanto,gostaria de postergar as votações até as eleições de outubro. Entre asPECs que aguardam votação na Casa estão a que torna obrigatória alicença-maternidade de seis meses, a que reduz a jornada de trabalhopara 40 horas semanais e a que efetiva nos cargos os titulares decartórios. Segundo o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP),existem 62 PECs prontas para votação.

Sem pedracantada

As discussões acirradas pelo novo modelo departilha dos royalties do petróleo esfriaram a votação da Lei nº2254/07, que legaliza os bingos em todo o país. A matéria, que contacom forte lobby no Congresso Nacional, estava na pauta de votações, masacabou postergada, provavelmente para hoje. O adiamento havia sidoproposto na terça-feira pelo PSDB e pelo DEM. No entanto, a pressãoexercida pelos outros partidos forçou a colocação da matéria na pauta.O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), jogou para os líderes aresponsabilidade pela apreciação da proposta. Protelei a questão atéquando pude, mas é um projeto e irá a plenário, onde será decidida aquestão.

Os deputados se dividem entre a criação de empregos estimada em250 mil postos e os riscos de que a liberação dos bingos favoreça ocrime organizado. Prevê-se que o mercado em torno do jogo movimentariaquase R$ 27 bilhões anuais, caso os estabelecimentos voltem afuncionar. Mesmo com as regras mais rígidas de fiscalização previstaspelo projeto, há o receio de que o controle não seja eficiente. Ocusto de informatizar essa fiscalização é muito grande. A ReceitaFederal não terá condições de fazer o controle de todas as casas,reclama o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP).

Em ano eleitoral, a desconfiança é de que a legalização dos bingosabasteça a campanha de partidos e de parlamentares simpatizantes doprojeto. A questão dos bingos é o chantilly eleitoral. Não é maisimportante do que os temas tratados aqui nos últimos dias e que aindaestão emperrados, ironiza o líder do DEM na Câmara, Paulo Bornhausen(SC). Pelo projeto, a receita arrecadada pelos bingos seria fatiadaentre os donos dos casas (21,72%), prêmios para os jogadores (53,84%) etributos e impostos (24,44%). Do valor que entraria nos cofres dogoverno federal, cerca de 17% seriam destinados, obrigatoriamente, àsaúde, ao esporte e à cultura. (II)