Título: Tribunal refuta dispensa de licitação extensiva à Eletrobrás
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 21/05/2009, Política, p. A6
Preocupados com os efeitos da Medida Provisória 450, que foi aprovada em caráter final na semana passada, técnicos e ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) querem barrar a liberdade dada pela nova legislação à Eletrobrás e suas subsidiárias para contratar obras e comprar equipamentos sem a necessidade de licitação. O presidente da estatal, José Antônio Muniz Lopes, já foi avisado extraoficialmente de que seus planos de usar essa autonomia para transformar a Eletrobrás em sócia majoritária de novas usinas hidrelétricas e linhas de transmissão vão enfrentar forte oposição do TCU.
A estatal vê a Lei de Licitações (8.666/93) como um obstáculo à agilidade em suas compras e diz que isso torna proibitiva a participação em consórcios, como majoritária, com a iniciativa privada. Uma emenda introduzida na MP 450, que buscava aumentar as garantias para financiamentos de obras no setor elétrico, dispensou a Eletrobrás de cumprir com os rituais da 8.666.
Atualmente, apenas a Petrobras é dispensada de licitações, embora o artigo 173 da Constituição tenha determinado a elaboração de uma lei para definir o estatuto jurídico de empresas públicas e sociedades de economia. Essa lei deveria, entre outras coisas, dispor sobre os procedimentos de contratação de obras e serviços, mas nunca foi levada adiante. Em 1998, logo após a entrada em vigor da Lei do Petróleo, um decreto presidencial isentou a Petrobras de licitações. O argumento era de que, com a abertura do mercado de petróleo e gás, a estatal precisava de mais agilidade em seus processos. "Mais de dez anos depois, não se criou esse estatuto e nem a Petrobras deixou, na prática, de ser monopolista", diz o ministro José Jorge.
O tribunal de contas, em voto do ministro Ubiratan Aguiar - e depois confirmado em 2004 pelo plenário -, considerou o decreto inconstitucional e vem apontando irregularidades, em seus relatórios e análises, nas compras feitas pela Petrobras. A estatal, desde então, vale-se de liminares concedidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para evitar que a posição contrária do TCU paralise suas contratações sem licitação pública. As ações ainda não foram julgadas em seu mérito.
"Vamos voltar ao Supremo e pedir o julgamento definitivo dessas ações", afirmou José Jorge, que tomou posse em fevereiro como ministro. O assunto voltou ao plenário do TCU, em sessão fechada, com a aprovação da MP 450 e a extensão da liberdade para a Eletrobrás. "A meta prática absolutamente não é prejudicar uma ou outra estatal, mas forçar o poder público a acelerar a tramitação de um estatuto, previsto pela Constituição, para as empresas públicas e as sociedades de economia mista", completou.
Um assessor graduado do tribunal disse que as equipes técnicas do TCU ficarão no encalço da Eletrobrás pelas mesmas razões aplicadas à Petrobras. José Jorge considerou "preocupante" a liberdade dada pela MP 450. "Ela amplia uma exceção muito importante. Se ontem valia para a Petrobras e hoje passa a valer para a Eletrobrás, quem garante que amanhã não dispensarão de licitação os Correios ou a Infraero?", concluiu o ministro, temendo uma perda do controle feito pelo tribunal nas estatais.
O Valor apurou que o próprio presidente da Eletrobrás tomou a iniciativa de buscar apoio do TCU para a dispensa de licitações, mas não teve êxito. A questão chegou a ser debatida, nos últimos dias, pelos ministros e a avaliação de inconstitucionalidade da medida prevaleceu.
A emenda que beneficiou a Eletrobrás foi incluída na MP 450 ainda quando ela tramitava na Câmara, sob relatoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ele é padrinho político de indicações à cúpula de Furnas, uma das principais subsidiárias da Eletrobrás. A empresa, por exemplo, é a maior acionista individual do consórcio responsável pela construção da usina hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira, em Rondônia. Tem 49% do capital acionário. O controle da sociedade de propósito específico é privado, mas os 51% de ações são divididos entre vários acionistas.