Título: Chávez entra na campanha eleitoral da Argentina
Autor: Rocha , Janes
Fonte: Valor Econômico, 25/05/2009, Internacional, p. A9

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, balançou a campanha eleitoral na Argentina ao anunciar, sexta-feira, a nacionalização de mais três empresas do grupo Techint: a Tubos e Aços da Venezuela (Tavsa); Materiais Siderúrgicos (Matesi) e o Complexo Siderúrgico Guayana (Comsigua). O Techint, controlado pelo empresário Paolo Rocca, é o maior grupo empresarial da Argentina e já tinha sido desapropriado em 2008 pelo governo venezuelano em sua principal operação, a siderúrgica Sidor.

A notícia surpreendeu. Apenas uma semana atrás, Hugo Chavez havia passado por Buenos Aires em visita oficial que incluiu um fim de semana na residência da presidente Cristina Kirchner e de seu marido, o ex-presidente Nestor Kirchner, em El Calafate, no extremo Sul do país. Embora tenha declarado "yes" (assim mesmo, em inglês), quando questionado pelos jornalistas se seguiria com sua política de nacionalização de empresas, em nenhum momento Chávez disse que as próximas seriam as do empresário argentino.

A União Industrial Argentina (UIA) divulgou nota de repúdio à medida do governo venezuelano e pediu a interferência da presidente Cristina. "É difícil compreender como um governo de um país que manifesta publicamente o caráter estratégico de sua vinculação com a Argentina e busca estreitar os laços produtivos entre ambas as nações, promovendo os investimentos e o intercâmbio comercial, leva adiante ações que claramente põem em risco as atividades de uma empresa argentina", afirma a nota da UIA distribuída à imprensa na sexta à noite.

Outras entidades repetiram o gesto com comunicados públicos: a Associação Empresária Argentina (AEA), a Associação de Bancos Privados (Adeba) e Estrangeiros (ABA), as Câmaras de Exportadores (Cera) e de Comércio (CAC) e a Bolsa de Valores de Buenos Aires.

O grupo Techint não fez declarações oficiais, mas o diretor de Relações Institucionais, Luis Betnaza, disse ao jornal "La Nación" que estava surpreso e que pretendia pedir "ao governo que intervenha para garantir os direitos das empresas argentinas, contemplados no tratado de proteção recíproca de investimentos". Pela desapropriação da Sidor no ano passado, o Techint estava recebendo uma indenização de US$ 1,97 bilhão em parcelas, que só começou a ser paga mês passado, depois de muita negociação porque, a princípio, Chávez ameaçava não pagar nada.

A pouco mais de um mês das eleições legislativas argentinas para renovação de parte da Câmara, do Senado e das assembleias provinciais, os opositores se afinaram com os empresários no repúdio à nova estatização na Venezuela. "É o aprofundamento da política de confisco", afirmou Elisa Carrió, da esquerdista Coalizão Cívica, repetindo as críticas do governador da capital, Maurício Macri, do direitista PRO. O líder da União Cívica Radical (UCR), Gerardo Morales, disse que duvidava que o casal Kirchner não soubesse das intenções de Chávez depois de terem passado o fim de semana com ele em El Calafate. Até o líder da Central Geral dos Trabalhadores (CGT), Hugo Moyano, principal aliado do governo, disse que era contra a estatização de empresas como princípio.

Entre o empresariado, há um temor de que os Kirchner se espelhem em Chávez para ampliar as estatizações e nacionalizações. De 2003 até agora foram estatizados na Argentina o sistema privado de fundos de pensão (AFJP), um estaleiro, a empresa de água e esgoto, os Correios, a Aerolíneas Argentinas e a fábrica de aviões Área Material Córdoba.

Para amenizar o "fator Chávez" sobre a apertada margem com que o governo está liderando as intenções de voto, o ministro do Interior, Florencio Randazzo, negou que houvesse intenção de estatizar empresas e que a posição do governo sobre o assunto é de defesa dos interesses dos empresários argentinos, porém respeitando as decisões soberanas da Venezuela.