Título: Onda de desemprego ameaça estabilidade de países, diz a OIT
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 29/05/2009, Internacional, p. A11

A perda de empregos se multiplica em ritmo forte e uma recessão social é iminente, com grandes riscos para a estabilidade política de países, alertou a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O número de desempregados em todo o mundo pode alcançar de 210 milhões a 239 milhões este ano, o que corresponde a taxas de 6,5% a 7,4% , bem acima das estimativas mais recentes, devido à deterioração das economias, segundo a entidade. Na América Latina, a taxa é ainda maior, entre 8,1% e 9,2%, ou respectivamente 22,6 milhões e 25,7 milhões de pessoas desempregadas em 2009.

Globalmente, entre 39 milhões e 59 milhões de pessoas podem ter perdido o emprego de 2007 até este ano, segundo três cenários diferentes da OIT. Outro relatório, das Nações Unidas, estima que a crise econômica pode fazer até 100 milhões de desempregados no fim do ano. Tudo dependerá da eficácia dos programas de estímulo fiscal adotados pelos governos e do funcionamento do setor financeiro.

"Estamos vendo uma alta sem precedente do desemprego e de pessoas caindo na pobreza este ano e devemos agir agora", disse o diretor-geral da OIT, Juan Somavia. A OIT nota que em crises passadas, mesmo após a retomada da expansão, o emprego só se recuperou de 4 a 5 anos mais tarde, em média.

Isso indica perspectiva mais dramática para 45 milhões de jovens que entram todo ano no mercado em busca do primeiro emprego. Ou seja, é preciso que sejam criados 300 milhões de empregos até 2015 para absorver a entrada de novos trabalhadores. "Tudo isso aponta para uma crise do emprego e da proteção social no mundo, que pode durar de 6 a 8 anos", disse Somavia. "As consequências serão incalculáveis para o bem-estar dos indivíduos, das famílias, da sociedade, para a estabilidade das nações e a credibilidade da governança nacional e multilateral."

A OIT vê "ritmo frenético" de demissões de milhões de pessoas e de falências de empresas, sobretudo pequenas e médias, e acha que essa situação pode deve continuar até 2011. Chega a 200 milhões o número de pessoas ameaçadas de cair na pobreza, vivendo com menos de US$ 2 por dia. O aumento da pobreza e do emprego informal anulam os recentes progressos alcançados, enquanto as classes médias "se enfraquecerão". Brasil, Chile e Costa Rica, que estavam em boa direção para cumprir os objetivos do milênio, de redução de pobreza até 2015, agora dificilmente alcançarão as metas previstas.

Para América Latina, Somavia sugere acordos entre governo, trabalhadores e empresários para superar a crise e atenuar demissões.

A crise deve ter um sério impacto negativo também sobre a produtividade média dos trabalhadores. Globalmente, a produção por empregado pode declinar entre 1,3% e 2,3% este ano, pelas projeções da OIT. No longo prazo, a produtividade do trabalho é um fator determinante para o padrão de vida, com maior produção por trabalhador podendo levar a maiores salários e menos horas trabalhadas. O cenário atual é de declínio na produtividade, alimentando "uma tremenda pressão para baixa dos salários e potencial para redução da qualidade do emprego".

Diante da velocidade e complexidade com que a crise se propaga, a OIT propõe que a Assembleia Internacional do Trabalho discuta, entre 3 e 19 de junho em Genebra, um pacto global do emprego. A ideia era fazer um encontro de presidentes. Até agora, porém, só foram confirmados os presidentes de Brasil, França, Argentina, Jamaica, Polônia, Bangladesh, Burkina Fasso, Moçambique, Benin e Togo.

Outro relatório da ONU estima que pelo menos 60 países em desenvolvimento (de 107 com dados disponíveis) devem ter queda na renda nacional. E só 7 poderão ter crescimento econômico mínimo para continuar reduzindo a pobreza. A ONU estima que o crescimento só será mesmo retomado entre 2011-2015, quando se poderia começar a compensar a destruição de emprego causada pela crise.

Uma recessão prolongada é possivel, se o círculo vicioso entre desestabilização financeira e retração da economia real não for contido pelas ações globais até agora adotadas. Entre setembro de 2008 e este mês de maio, o valor de mercado dos bancos nos EUA e na Europa declinou 60% - ou seja, perderam US$ 2 trilhões em valor.

A ONU alerta que, apesar da enorme depreciação de ativos e das operações de socorro dos governos, os problemas persistem. O aperto global de crédito continua sufocando a economia real. "Boa parte dos países em desenvolvimento enfrenta dificuldades para rolar a dívida externa, com cerca de US$ 3 trilhões vencendo este ano. "Em 2009, mais de 100 países não terão superávit para cobrir suas dívidas, e o fosso financeiro é estimado entre US$ 200 bilhões e US$ 700 bilhões. As reservas de mais de 30 países também já caíram abaixo do nível crítico para cobrir três meses de importações."