Título: Políticas de desenvolvimento municipal Maskio e Alexandre Lucas Pires
Autor: Renato , Sandro
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2009, Opinião, p. A14

A queda da atividade econômica nacional, em torno de 3,6% no último trimestre de 2008, teve reflexo direto na atividade econômica dos estados e municípios, com a eliminação de 756.694 postos de trabalho, entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009. No mesmo período, o Estado de São Paulo registrou uma perda de 324.208 postos.

A arrecadação de ICMS caiu 10,32% no Brasil e 12,07% em São Paulo, na comparação entre janeiro de 2009 e de 2008. Enquanto tributo de maior eficiência arrecadatória no país, a variação da arrecadação do ICMS nos permite visualizar os reflexos da crise sobre a atividade econômica no Estado de São Paulo. Tais informações também nos permitem inferir sobre a arrecadação municipal, que também vem sofrendo reflexos negativos.

Neste cenário, agregam-se às discussões sobre as políticas federais adotadas para amenizar os efeitos da crise na economia brasileira o debate sobre as medidas que podem ser adotadas pelos municípios, com o intuito de estimular a atividade econômica.

Os municípios constituem o nível de governo mais próximo do cidadão, logo, estão mais expostos às suas carências e reivindicações, embora detenham menor porte para intervenção. Tais características trazem, de um lado, a vantagem de um olhar mais detalhado sobre os problemas que afligem a comunidade local; e, do outro, a limitação que prioriza as políticas específicas e direcionadas, mas não menos importantes.

Não raro, alguns gestores públicos locais adotam políticas com a pretensão de alterar algumas condicionantes do ambiente macroeconômico.

Diante da atual crise de crédito não originada no Brasil, mas cujos efeitos se propagaram através dos mecanismos monetários e financeiros internacionalizados, os municípios não dispõem de instrumentos para promoção da liquidez.

Outras medidas anticíclicas, como incentivos ao comércio exterior, podem apresentar impacto limitado, já que grandes variáveis, como taxa de câmbio, impostos alfandegários e barreiras internacionais, não dependem de ações locais.

A celebração de acordos de cooperação internacional pode ser uma medida profícua, caso envolva os atores locais capazes de competir internacionalmente e fomentar a produção local, ainda que dependa das condições macro da economia global.

Dada a inviabilidade de atuação dos municípios nos pontos citados acima, os gestores locais são tentados a utilizar incentivos fiscais para estimular a economia. Dada a atual estrutura do sistema tributário nacional, a influência que os municípios podem exercer sobre o custo tributário dos produtores é limitada. Um dos principais tributos sob sua jurisdição é o ISS, mas cuja representação é pequena e limitada às atividades de serviços.

Em uma recessão, com queda da atividade econômica e de arrecadação tributária, os orçamentos municipais apresentam pouco (ou nenhum) espaço para abrir mão de receita, pois seus tributos respondem apenas por cerca de 5% da capacidade de tributar do sistema nacional.

Ainda neste aspecto é importante avaliar se um eventual estímulo tributário será revertido em maiores aplicações na atividade econômica, dado que no ambiente atual o comportamento dos produtores é de prevenção, frente às incertezas de médio e longo prazo.

Mesmo as políticas setoriais locais, como as políticas industrial, de comércio, entre outras, dependem de ações direcionadas, especialmente associadas a mecanismos de financiamento, de desoneração tributária, de proteção contra concorrência desleal, de câmbio, entre outros. Embora a interlocução do governo local com tais setores da atividade econômica seja importante, os fatores que dinamizam as políticas setoriais estão fortemente amarrados aos mecanismos macro.

Os municípios têm mais eficácia para fomentar os pequenos empreendimentos, detentores de grande capacidade de geração de emprego, que também necessitam de um ambiente macro atrativo, e são carentes de um contato mais próximo com o poder público local, independentemente do setor econômico.

O estímulo à atividade dos pequenos empreendedores, que invariavelmente está atrelada ao ritmo dos grandes produtores da economia, depende de ações locais específicas, tais como ações de profissionalização, organização de arranjos produtivos, divulgação dos produtos locais fora do mercado cativo, e estabelecimento de um canal de relacionamento dos empreendedores com o governo local, entre outras ações. A criação de um "funding" regional também seria fundamental para o financiamento e a projeção de tais atividades. Os municípios brasileiros, com raras exceções, não têm apresentado condições orçamentárias para organizar este mecanismo financeiro, muito embora haja algumas iniciativas interessantes, como o caso do Banco do Povo Paulista.

O maior espaço no qual as políticas municipais podem atuar estão nas políticas territoriais e populacionais. Neste escopo, é fundamental ordenar o uso do território de forma a incentivar os ganhos de escala que podem ser obtidos com a organização econômica do espaço urbano, fixando zonas industriais, tecnológicas, comerciais, que sejam equipadas com infraestrutura adequada para o desenvolvimento produtivo. Nesse sentido, o município busca implementar um marco regulatório do esforço econômico que ocorre em seus domínios, especialmente ao evitar a descaracterização de áreas urbanas estratégicas para sua economia.

Além desse empenho em manter o território atrativo à alocação de capital, o município deve equipar-se com as ferramentas necessárias voltadas à qualificação ocupacional de sua população, tendo o objetivo de fornecer trabalhadores para indústrias, comércios e serviços locais,

É fundamental que os municípios adotem uma postura empreendedora, no sentido de extrapolarem suas políticas de estímulos produtivos e de regulações. Mudar atitudes e firmar associações com os agentes portadores de disposição e condição de viabilizar o fluxo produtivo podem ser um veio a ser explorado nesses tempos bicudos.

Sandro Renato Maskio é economista pela USCS, mestre em economia pela PUC-SP, professor de economia da UMESP e da USCS.

Alexandre Lucas Pires é administrador pela UEL, mestre em sociologia pela Unicamp e doutorando em sociologia pela USP.