Título: BNDES vai avaliar situação da GM para decidir sobre financiamento
Autor: Durão , Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 02/06/2009, Empresas, p. B1
O BNDES vai analisar como fica a situação da subsidiária brasileira da General Motors, cuja matriz, desde ontem, é uma empresa concordatária, para definir sobre a concessão de empréstimos para seus projetos no país. Apesar de evitar comentar o assunto, pois está diante de uma questão nova, o Valor apurou que a área jurídica do banco está avaliando até que ponto a concordata nos EUA pode afetar a montadora no Brasil. Se concluir que a subsidiária pode ser contaminada, as cartas- consultas de pedidos de financiamento que encaminhou à instituição, em valor acima de R$ 700 milhões, poderão ser afetadas, já que o BNDES não financia empresas em recuperação judicial.
As linhas de crédito já aprovadas no banco para a GM Brasil não serão prejudicadas por decisões que venham a ser tomada pelo jurídico. São R$ 424 milhões e referem-se a dois empréstimos: um de R$ 230 milhões aprovado em 2006 e em fase final de amortização, para financiar o projeto de modernização do Vectra, e outro, de R$ 194 milhões, recém-aprovado e em fase de contratação para o desenvolvimento de um novo modelo de veículo de passeio. As consultas para novos empréstimos (que ainda não deram entrada no banco) objetivam recursos também para projetos de novos modelos, entre eles a substituição do Celta, fabricado na unidade de Gravataí (RS).
Os novos pedidos de recursos da GM no banco, como as novas consultas já encaminhadas, só terão "sinal verde" da instituição se a área jurídica entender que a GM Brasil é outra empresa, independente da matriz americana e que não seja impactada pela concordata. Caso contrário, não serão aceitos. Até agora, toda operação que o BNDES fez com a GM Brasil foi indireta, via agente financeiro. Ou seja, o risco é do agente, que recebe e repassa o dinheiro. No caso de empréstimo direto, a subsidiária dá como garantia fiança bancária.
O governo do Rio Grande do Sul e os trabalhadores unidade de Gravataí, na região metropolitana de Porto Alegre, mantêm a expectativa de que as operações e os planos de investimentos não sejam afetados pela concordata solicitada ontem nos EUA. Até agora, o clima é de otimismo cauteloso, à espera dos esclarecimentos prometidos pela companhia para hoje.
Essa fábrica opera desde 2000 e a GM planeja investir US$ 1 bilhão para elevar sua capacidade de 250 mil para 380 mil veículos por ano até 2012, quando deve ser lançado um novo modelo de carro além do Celta e do Prisma já são fabricados ali. Segundo o secretário do Desenvolvimento do Estado, Márcio Biolchi, o vice-presidente da empresa no país, José Carlos Pinheiro Neto, esteve no início de maio na sede do governo e só fez "manifestações de confiança" em relação ao projeto.
Do total do investimento, cerca de US$ 150 milhões serão financiados pelo Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul) e US$ 350 milhões pelo BNDES. A concordata nos EUA, afirmam pessoas ligadas ao governo, não deve impedir a liberação dos créditos porque a GM é uma empresa limitada aqui, onde seus ativos estão desimpedidos.
A própria fábrica de Gravataí será a garantia do empréstimo do Banrisul. Para o BNDES, a empresa poderia oferecer outros ativos, fiança bancária ou ainda o fluxo de recebíveis como garantias. "Entendemos que a operação brasileira, que é superavitária, é ainda mais importante nesse momento para a empresa porque gera resultados positivos", comentou Biolchi. Ele ressalvou, porém, que não tem nenhuma informação oficial mais recente da GM sobre o assunto.
Na semana passada, o diretor comercial da montadora na região Sul, Frederico Themoteo Jr, disse que o projeto de expansão não foi alterado em função das dificuldades da matriz americana e que não havia nenhum problema no trâmite dos contratos de financiamento com Banrisul e com BNDES.
O diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (Simgra), Edson Dornelles, disse que conversou há uma semana com a direção da fábrica e recebeu a informação de que os investimentos estavam mantidos. "Nossa expectativa é que isso se confirme", afirmou. Segundo ele, cerca de 5 mil pessoas trabalham no entorno da fábrica, sendo 2,8 mil da própria GM e o restante dos fornecedores "sistemistas". Com a ampliação, a previsão é de que mais 1 mil funcionários sejam contratados só pela GM.
A implantação da GM no Rio Grande do Sul contou com benefícios fiscais e financeiros do governo gaúcho, incluindo um empréstimo de R$ 253 milhões antes da inauguração da fábrica, redução de até 75% do ICMS durante 23 anos e autorização para venda ou uso dos créditos do imposto para pagamento de fornecedores. Em 2004 novos incentivos foram concedidos para uma expansão concluída em 2006, entre eles o diferimento de ICMS nas aquisições de matérias-primas, peças e gás natural dentro do Estado.
No início da noite o Palácio Piratini, sede do governo gaúcho, informou que em telefonema à governadora Yeda Crusius, ontem à tarde, o diretor de assuntos institucionais da montadora, Luiz Moan, "garantiu a manutenção da unidade de Gravataí depois da assinatura do processo de reestruturação financeira da empresa nos Estados Unidos". Conforme a nota, o executivo assegurou também a manutenção das "demais unidades da GM instaladas no Brasil".
A crise da indústria automobilística nos EUA levou o BNDES a pensar em medidas para "blindar" as subsidiárias brasileiras de montadoras americanas, pois aqui elas continuam saudáveis. Em recente entrevista, o presidente do banco, Luciano Coutinho, destacou que "o banco no momento está tentando blindar as empresas do setor automobilístico para não serem contaminadas pelas matrizes". Até agora, porém, não foi tomada nenhuma medida na prática e o assunto ainda não saiu do papel.
A iniciativa do banco tem como cenário o aquecimento do mercado interno de automóveis por conta da redução do IPI e do financiamento ao consumidor. Neste trimestre, todas as fabricantes voltaram a desengavetar projetos de investimento e retomaram o envio de consultas ao banco, que havia encolhido no início da crise, em setembro. No primeiro quadrimestre deste ano, as consultas que chegaram ao BNDES somaram R$ 3,4 bilhões, 106% acima dos R$ 1,6 bilhão no mesmo período de 2008.