Título: Governo planeja antecipar leilão de energia velha
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 03/06/2009, Brasil, p. A8

O governo planeja mudar a legislação do setor elétrico para antecipar os leilões da energia que ficará descontratada a partir do início de 2013. Estima-se em cerca de 9 mil megawatts (MW) - quase 50% mais do que toda a potência das hidrelétricas do rio Madeira - o montante de energia "velha" contratado em dezembro de 2004, por oito anos.

Chama-se de energia "velha" as usinas já construídas e amortizadas. Esses contratos foram firmados com as distribuidoras nos leilões voltados exclusivamente ao mercado regulado e têm vencimento em dezembro de 2012.

Dois problemas aparecem no horizonte. Um, já bastante conhecido, é o fim das concessões de usinas do sistema Eletrobrás, da Cemig e da Cesp em 2015. Há insegurança entre as geradoras sobre a possibilidade de firmar novos contratos de fornecimento de energia elétrica para além de 2015, uma vez que não se sabe se elas manterão as concessões.

Paralelamente a essa discussão, surgiu outro problema. Trata-se da constatação de que, mesmo havendo renovação das concessões, as geradoras vendam a energia descontratada diretamente para grandes consumidores no mercado livre (onde o cliente não precisa comprar da distribuidora de sua região).

Isso levaria a uma espécie de "desvio" da energia. Em vez de ela fornecer ao mercado regulado, que atende residências, pode migrar para a expansão da demanda de consumidores livres. Essa migração causaria um perigoso desequilíbrio entre oferta e demanda das distribuidoras. "Queremos garantir que a energia velha vá para a renovação dos contratos", afirmou ontem o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim. "O princípio do modelo é que toda a expansão do mercado livre ocorra por meio de usinas novas", frisou Tolmasquim.

O modelo citado pelo presidente da EPE foi implementado em 2004 pela ministra Dilma Rousseff, então na pasta de Minas e Energia, e deixou mais um ponto que precisará de correção: a renovação dos contratos que forem vencendo ocorreria em leilões com apenas um ano de antecedência - o que jargão do setor chama de leilões A-1. O risco implícito é que se houver um "buraco" na oferta de energia, segundo Tolmasquim, esse período é insuficiente para tomar qualquer medida emergencial, como construir usinas térmicas.

O Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) já havia apontado a gravidade do problema. "É uma verdadeira bomba-relógio e o tic-tac está aumentando a cada dia que passa", disse o coordenador do Gesel, Nivalde de Castro. O ponto positivo, segundo ele, é que "o problema tem solução fácil". Castro sugere que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) faça uma resolução prorrogando esses contratos até o fim das atuais concessões, em 2015. Isso traria segurança jurídica às empresas e daria tempo para o governo planejar melhor essa recontratação.

Tolmasquim indicou que a solução "muito provavelmente" será outra: antecipar os leilões de recontratação. Para ele, a energia deverá ser recontratada com "pelo menos" três anos de antecedência, mas o ideal é fazer isso "o quanto antes". Ou seja, em vez de fazer um leilão A-1, seria uma disputa do tipo A-3. Isso permitiria, ao governo, preparar-se para o caso de "buracos" no balanço entre oferta e demanda do mercado regulado.

A EPE acredita que será necessário mexer na legislação do setor e planeja fazer a mudança junto com o projeto de lei ou medida provisória que definirá a sucessão das concessões de usinas e distribuidoras, além de linhas de transmissão. Tolmasquim evitou dar pistas se o governo inclina-se por prorrogar as concessões ou relicitar os ativos. "Os relatórios expõem os prós e contras de cada opção."

A EPE informou ontem que o leilão de energia nova, que será realizado dia 27 de agosto, e que tem o objetivo de contratar energia para atender ao mercado consumidor a partir de 2012, obteve, ao final da fase preliminar de cadastramento de empreendimentos, um total de 119 usinas inscritas, segundo informação da EPE. . Os projetos somam potência instalada de 14.362 MW em sete diferentes tipos de fontes de geração.