Título: Reunião com argentinos tem pouca chance de acordo
Autor: Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 04/06/2009, Brasil, p. A2

É grande a chance de frustração das indústrias brasileiras de calçados com a reunião de hoje e amanhã, em Buenos Aires, para tentar levantar as restrições impostas às exportações para a Argentina. A expectativa das empresas é que o encontro dos representantes de dez setores e dos governos dos dois países junto com a comissão de monitoramento do comércio bilateral leve a um acordo para normalizar os embarques no segundo semestre, mas o secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento (MDIC), Ivan Ramalho, acredita que ainda serão necessárias "uma ou duas reuniões" para se chegar a um entendimento.

Ramalho disse que vai pedir ao secretário de Indústria e Comércio do Ministério da Produção da Argentina, Fernando Fraguío, que "seja dada maior urgência" na liberação das licenças não automáticas para a importação dos calçados brasileiros. De acordo com ele, o governo brasileiro está "otimista" em relação ao caso e não pensa em retaliações nesse momento. "Mas se não houver entendimento teremos que reavaliar", comentou.

No Brasil a liberação das licenças de importação é eletrônica e leva dez dias, no máximo, afirmou Ramalho. Na Argentina o processo é "documental", conforme o secretário-executivo do MDIC, e leva até 150 dias enquanto o período aceito pela Organização Mundial do Comércio (OMC) é de 60 dias, disse o diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein. Segundo ele, as indústrias estão com 3,4 milhões de pares à espera da licença para exportação, o equivalente a 18% dos 18,5 milhões de pares embarcados para o país vizinho em 2008.

"Estamos no limite e o governo precisa ser mais incisivo", afirmou Klein. No início de maio, também em Buenos Aires, os empresários da Argentina propuseram a redução de 20% nas exportações do Brasil em relação a 2008. Os brasileiros concordaram com um corte de 10%, desde que os argentinos lhe assegurassem uma participação mínima de 75% sobre as importações locais como havia sido negociado ainda no governo do ex-presidente Nestor Kirchner, disse o diretor da Abicalçados. "Não pode haver um desvio de comércio em favor da China", disse o executivo.

No primeiro quadrimestre os embarques do setor para a Argentina caíram 45,3% sobre igual período do ano passado, para 1,8 milhão de pares, e a fatia dos brasileiros sobre as importações argentinas recuou de 60% no acumulado de 2008 para 43%. Ao mesmo tempo, os calçados chineses subiram para 54%, ante 38% no ano passado, explicou Klein. Em valores, as exportações do Brasil para os argentinos caíram 37,8% sobre o período de janeiro a abril de 2008, para US$ 32 milhões.

"A falta de posicionamento do governo brasileiro representa o caos para nós", afirmou a diretora de exportação da Piccadilly, Michelini Grings Twigger. A Argentina é a maior cliente externa da empresa, com participação de 30% das exportações em 2008, quando os embarques totais chegaram a 2,5 milhões de pares. "Em 2009 não sei se conseguiremos chegar à metade (do que foi vendido para os argentinos) no ano passado", disse. "Esperamos que na reunião desta semana saia uma posição segura para o segundo semestre, mas a passividade do governo pode acabar resultando na exportação de empregos", afirmou.