Título: Homens mais cuidadosos
Autor: Sakkis, Ariadne
Fonte: Correio Braziliense, 13/03/2010, Cidades, p. 39

Alerta

Estudo feito pela Universidade de Brasília mostra que apenas 30% das alunas usaram o preservativo em todas as relações sexuais nos últimos seis meses. Esse índice entre os universitários é bem maior: ficou em 43,9%

Um estudo desenvolvido pelo Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB) e o Programa Brasil Afroatitude, do Ministério da Saúde revela que os homens universitários têm se protegido mais na hora do sexo do que as mulheres. A pesquisa intitulada Diferenças de gêneros na percepção de risco e nas práticas preventivas em relação às DST/Aids entre universitários constatou que 43,9% dos homens usaram o preservativo em todas as relações sexuais nos últimos seis meses contra apenas 30,2% das mulheres.

O resultado, que serve de alerta, é fruto das respostas de 266 mulheres e 237 homens, com média de idade de 21 anos, sobre temas referentes à sexualidade, relacionamento afetivo-sexual, frequência de uso da camisinha e percepção de risco de exposição ao HIV. Dos 503 entrevistados, 75,4% são sexualmente ativos. Entre eles, 22% das mulheres não utilizaram nenhum preservativo nos últimos seis meses, quase o dobro dos indicativos masculinos, que ficaram em 12%. ¿A pesquisa vai ao encontro de outros estudos, que mostram que o homem ainda é o encarregado pelo preservativo¿, aponta a coordenadora do trabalho, a psicóloga Eliane Seidl. Segundo ela, muitos tabus envolvendo a camisinha e a mulher ainda não caíram. ¿Muitas jovens não se sentem à vontade em sugerir o uso do preservativo ao parceiro. As mulheres têm de ser mais empoderadas e falar mais sobre o sexo seguro¿ avalia.

A aluna de pedagogia da UnB Amanda Cadete, 17 anos, partilha da opinião. ¿Dentro de casa, se fala muito mais de sexo com os filhos do que com as filhas. Na escola, a aula de educação sexual mostra só a camisinha masculina.¿ A caloura acredita, no entanto, que a importância da proteção já é bastante consolidada. ¿É muito falado, divulgado na mídia. Informação é o que não falta¿, ressalta. O aluno de matemática Rodolpho Salomão, 18 anos, também acha que falar de sexo é mais comum na órbita masculina, mas isso não é motivo para que as mulheres não exijam o sexo seguro.¿Tem que usar (preservativo) 100% das vezes. Você está arriscando a sua vida se não usá-la¿, destaca.

Relacionamento estável O baixo índice de proteção entre as mulheres pode encontrar justificativas no fato de 63,5% delas estarem em um relacionamento estável. ¿A camisinha tende a ser deixada de lado quando há um envolvimento afetivo estável¿, explica a professora Seidl. Isso ocorre mesmo que 41% dos rapazes e 26% das mulheres estejam cientes do risco de infecção ao qual se expõem. O pós-graduando em geologia Leandro Arrais, 27 anos, é um bom exemplo. No passado, ele teve relações sexuais sem preservativos e descobriu, após um tempo, que a mulher com quem saía tinha papilomavirus humano (HPV), associado ao câncer no pênis e responsável por quase todos os casos de tumores de colo de útero. ¿Fiquei desesperado, fiz vários exames. Tive sorte porque não deu nada¿, conta.

Leandro aprendeu a lição: ¿Depois disso, já recusei sexo porque na hora não tinha nenhuma camisinha¿. O geólogo namora há sete anos e reconhece que, em um relacionamento, a preocupação se volta ao controle de natalidade. A responsabilidade, então, recai sobre a mulher, pressionada a usar o anticoncepcional. ¿Muita gente chega a encarar como ofensa se a parceira pede para usar camisinha. Pode ficar aquele clima de desconfiança¿, analisa. ¿A ideia das campanhas de promoção da saúde sexual é mudar as crenças desfavoráveis ao preservativo. A camisinha tem que ser vista como um cuidado a si e ao outro e não aliada à transgressão¿, acredita Eliane Seidl.

A pesquisa constatou que os universitários dispõem de bons níveis de informação sobre as DSTs, o que, segundo a pesquisadora, é incoerente com o comportamento preventivo insatisfatório. ¿É como o tabagismo. O fumante sabe de todos os males do cigarro, mas não abandona o vício. A diferença é que, com o sexo, as decisões precisam ser mútuas e afetam os dois.¿ Apesar dos resultados, Eliane Seidl relembra que os jovens são os principais usuários de preservativos do Brasil.

Para ajudar na prevenção A UnB dispõe de um Polo de Prevenção de DST/Aids que distribui preservativos masculinos e femininos gratuitamente, além de fornecer cartilhas com informações sobre prevenção e transmissão de doenças sexuais. O objetivo é suprir a comunidade acadêmica e também atender à população. De acordo com o coordenador do polo e professor de serviço social, Mário Ângelo Silva, o local é mais procurado pelos homens. ¿Os servidores da UnB, em especial aqueles que têm situação socioeconômica mais baixa¿, explica. Por mês, o polo entrega cerca de 3 mil preservativos, uma média de 10 unidades para cada interessado. Em 2009, foram distribuídas 30 mil camisinhas masculinas e 6 mil femininas.

A pesquisa do Instituto de Psicologia mostra que 34,5% das mulheres que entram na UnB nunca tiveram relação sexual o que, segundo Mário Ângelo, é fator relevante para a procura menor por preservativos por parte das mulheres. ¿Além do tabu da virgindade, algumas mulheres se constrangem em mostrar que são sexualmente ativas, por isso temos a preocupação de promover a camisinha para as mulheres, incentivar a autonomia do gênero¿, afirma Mário Ângelo.

Além de sexo seguro, o polo também dá orientações sobre os malefícios do uso de drogas e de bebida alcoólica, fatores que aumentam o comportamento sexual de risco. ¿As pessoas entram cada vez mais jovens na universidade e se iludem com o mundo adulto. Isso leva a um comportamento de excessos e muitos perigos¿, alerta o professor. O polo funciona no Instituto Central de Ciências (ICC) Sul. (AS)