Título: OMC autoriza Equador a limitar suas importações
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Fonte: Valor Econômico, 05/06/2009, Internacional, p. A11

O Equador tornou-se o primeiro país na atual crise global a receber autorização da Organização Mundial do Comércio (OMC) para impor restrições a importações, por causa da deterioração de sua balança de pagamentos.

A entidade deu sinal verde para barreiras que cobrem 8,7% das linhas tarifárias, afetando um volume de comércio equivalente a 23% do total das importações de 2008. O Equador deverá substituir até setembro a maioria das cotas (limites quantitativos a importação) por tarifas mais altas, que será aplicadas conforme o preço do produto. As restrições poderão ser mantidas até 22 de janeiro de 2010.

O governo equatoriano avisou que, pela lógica, os principais parceiros serão os maiores afetados, incluindo o Brasil. A posição brasileira é de ajudar o vizinho, mas avisou que vai tentar evitar que o fluxo de suas exportações caia.

Também a Ucrânia aguarda o sinal verde da OMC para as limitações que já vem impondo às importações, o que evitaria que o país fosse contestado diante dos juízes pelos parceiros comerciais.

O diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, vem manifestando o temor de uma alta do protecionismo e alertou que "o mundo não viu ainda os problemas sociais e políticos ligados à crise".

As regras da OMC permitem aos países-membros aplicar restrições a importação por razões de balança de pagamentos. Mas a autorização só é concedida após demoradas consultas com outros paises-membros e com a participação do Fundo Monetário Internacional (FMI), e deve ser submetido um calendário para retirada as medidas.

A ultima vez que um pais recorreu ao mecanismo foi há dez anos, com a Nigéria. Antes, a Índia e mesmo o Brasil, na época do antigo Gatt, substituído pela OMC, obtiveram sinal verde.

O Equador alegou que as restrições comerciais visam reduzir a saída de dólares, que estaria causando problemas de liquidez e ameaçando a estabilidade do sistema financeiro do pais.

O Comitê de Balança de Pagamentos da OMC reconheceu que as contas do país se deterioraram nos últimos meses, devido à queda da demanda global, que houve deterioração dos termos de comércio, sobretudo com a queda no preço do petróleo, além de valorização do dólar americano e baixa na remessa de divisas de equatorianos que vivem no exterior.

Além disso, a forte alta de despesas combinado com queda na receita e o calote de parte da dívida externa, decretado em dezembro pelo governo de Rafael Correa, ampliaram os problemas do país.

Vários parceiros reclamaram que o problema do Equador é sobretudo a dolarização de sua economia. Ao adotar o dólar em 2000 o país deixou de ter política monetária independente e não pode usar a taxa de câmbio para administrar a balança de pagamentos.

Enquanto outros desvalorizam a moeda, o Equador acompanha as turbulências do dólar americano.

Indagado por delegações sobre a natureza de uma crise de balanco de pagamentos numa economia dolarizada, o representante do FMI respondeu que esse tipo de crise reduz a liquidez doméstica e enfraquece a confiança na economia, podendo levar a recessão. E notou que não há vínculo determinando um nível adequado de reservas numa economia dolarizada.

O representante do FMI alertou que as restrições às importações certamente não ajudarão a resolver os problemas fiscais do Equador e aconselhou o pais a cortar despesas. Vários países também se mostraram convencidos de que barrar o comércio não resolve as dificuldades, até porque já houve melhora no preço do petróleo, principal produto exportado pelo país. Mas admitiram que o Equador tem poucos instrumentos para enfrentar a crise financeira global.

A delegação equatoriana não informou quais os produtos vem sofrendo restrições. Mas o ministro equatoriano da Indústria, Xavier Abad, disse à imprensa local que a elevação de tarifas já adotada está de fato baixando os volumes importados. Os países da Comunidade Andina (Peru, Bolívia e Colômbia) reclamaram que suas vendas estão sendo afetadas e querem compensações.

A questão que persiste na cena comercial é até que ponto limitar importações ajuda na crise atual. Basta ver o exemplo da Ucrânia, que desde que restringiu suas importações viu os preços dos produtos agrícolas subirem em seu mercado. Os ucranianos dizem que querem o sinal verde agora basicamente para restringir importações de automóveis e refrigeradores.

Existe uma inquietação de que a abertura conseguida pelo Equador estimule outros países a acionar o mecanismo da OMC. Isso quando o comércio mundial continua em queda livre. O Banco Mundial identificou 89 novas restrições ao comércio desde outubro de 2008, das quais 23 desde a cúpula do G-20, em abril.

Resta que a medida do Equador não tem comparação, em termos de impacto no comércio global, com centenas de bilhões de dólares de subsídios que países ricos, a começar dos EUA, vêm dando a seus abalados bancos e indústrias.