Título: Empresas pesam 'custo oculto' da China
Autor: Engardio , Pete
Fonte: Valor Econômico, 08/06/2009, Internacional, p. A8

Como gerente de compras da subsidiária americana da Takata, fornecedora japonesa de autopeças, Fred Heegan estava acostumado a sentir pressões para migrar sua produção para a China. Mas quando um cliente citou uma autopeça "made in China" mais barata, Heegan questionou o interlocutor mencionando os problemas adicionais de qualidade, logísticos e desrespeito a especificações. "Há custos ocultos para empresas com linhas de suprimento que se estendem dos EUA à China", diz Heegan, cuja empresa fabrica autopeças nos EUA e no México.

Heegan agora parece um visionário. Um número crescente de companhias está deixando de computar apenas itens usuais - custos de mão de obra e de matérias-prima - no cálculo de "custo total de propriedade" para decidir onde estabelecer suas bases produtivas. Isso significa computar despesas associadas a fatores como armazenagem e atrasos. Sob essa ótica, o "custo China", que pareceu ser pelo menos 40% inferior aos custos americanos - de mobília de quarto a equipamentos para telecomunicações -, não é, na realidade, tão baixo. Na realidade a antes formidável vantagem chinesa em manufatura praticamente desapareceu em algum setores, segundo um novo estudo da AlixPartners, de Southfield, Michigan, que realiza pesquisas e oferece consultoria sobre terceirização.

A AlixPartners estudou cinco categorias de produtos usinados - de grandes peças de motores, que consomem muita mão de obra, a pequenos componentes de plástico, que consomem pouca. A mudança nos custos foi enorme. Em 2005, a AlixPartners verificou que no momento em que os itens chegavam a um porto americano, os componentes chineses eram, em média, 22% mais baratos do que os produzidos nos EUA. Mas, no fim de 2008, o diferencial médio dos preços tinha caído para 5,5%, que costuma não ser grande o bastante para justificar a complicação de fabricar do outro lado do mundo.

Ainda mais surpreendente é a comparação de custos com o México. Embora três anos atrás o custo total de produção de bens na China fosse 5% menor do que no México, processos de manufatura na China são, atualmente, cerca de 20% mais caros. Em comparação com os EUA, as reduções de custo no México alargaram-se de 16% para 25%. "Alguns anos atrás, optar por terceirização na China era uma decisão evidente", diz Stephen T. Maurer, diretor-gerente da AlixPartners. Não é mais assim, diz ele.

Os maiores fatores por trás da acentuada mudança são flutuações monetárias e custos trabalhistas. O yuan valorizou cerca de 11% frente ao dólar desde o fim de 2005 e os salários subiram de 7% a 8% ao ano. Para conter as indústrias poluentes, Pequim eliminou isenções tributárias beneficiando exportadores de alguns produtos industriais pesados. Ainda assim, as vantagens de fabricar na China continuam enormes. As fábricas pagam salários médios de US$ 1,26 por hora, por isso continua sendo difícil superar a China nos casos de produtos intensivos em mão de obra, como brinquedos e vestuário. A China também está em rápida ascensão em setores como módulos de energia solar e automóveis, graças a demanda interna e incentivos governamentais.

Mesmo com a erosão das vantagens de preço, a China conservou sua base de suprimento de peças e matérias-primas sem rival em alguns setores. O país continua sendo rei em aparelhos eletrônicos de consumo e fabricação de PCs. "O fator de dissuasão à mobilidade dessa indústria é o fato de a cadeia de suprimentos inteira estar hoje na Ásia", diz Michael Andrade, gerente, para a América do Norte, da Celestica, fabricante terceirizada de componentes eletrônicos, que tem sua sede em Toronto. Transplantar esse ecossistema para a América do Norte levaria anos.

Devido à recessão, dizem consultores, a maioria dos fabricantes americanos está adiando decisões importantes. O que poderiam economizar transferindo a produção pode não justificar o custo e o esforço de relocar uma fábrica moderna e eficiente, com gerentes experientes e trabalhadores bem treinados. Além disso, diz Maurer, "ninguém quer migrar tudo para o México - e depois ver o yuan despencar como pedra, tornando o custo China novamente baixo".

De todo modo, a reavaliação de custos parece ter se contraposto à mentalidade de manada que impulsionou a ida de muitas companhias americanas para a China, de 5 a 10 anos atrás, em busca do que se revelaram ser ganhos marginais. "Muitas atividades levadas do México para a China provavelmente não deveriam ter ido", diz Maurer. A produção de eletrônicos de ponta, como comutadores para telecomunicações e computadores servidores, está começando a retornar para as Américas, para que os insumos possam ficar mais perto dos clientes americanos, diz Andrade, da Celestica. Outra variável é o custo de consertar e substituir equipamentos, que pode ser surpreendentemente elevado no caso de itens eletrônicos complexos.

A necessidade de manter estoques enxutos também coloca a China em desvantagem. As mercadorias levam em média 45 dias para chegar às praias americanas. A recessão tornou mais difícil prever a demanda, os fabricantes estão sendo forçados a manter produtos não vendidos armazenados por períodos mais longos. E o custo de atender necessidades emergenciais de suprimentos é, inevitavelmente, mais alto na China, devido aos fretes aéreos e rodoviários.

Esses fatores reforçam a convicção de Heegan, da Takata, de que é preferível comprar componentes mais próximo de onde acontece a montagem final. Ele cita o exemplo de chicotes elétricos para automóveis - feixes de fiação isolada -, que podem custar US$ 1 cada, e são produzidos aos milhões.

Heegan diz que poderia comprar chicotes na China por 15% a menos do que no México. Mas, se uma especificação for alterada depois que um lote de chicotes chineses já tiver sido embarcado em Xangai, a empresa teria de arcar com os custos de até seis semanas de transporte e da descarga de componentes obsoletos. E há as complicações de fusos horários diferentes, idiomas e tempos de viagens. Um fornecedor mexicano que fale inglês pode chegar a uma indústria americanas em poucas horas. (Tradução de Sergio Blum)