Título: Espera por certidão
Autor: Couto, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 24/01/2010, Brasil, p. 11

Associação de quilombolas teme prolongamento do conflito com fazendeiros em Goiás

Antônia (ao fundo) com Vicentina: sonho de reaver as terras

Cidade Ocidental e Luziânia (GO) ¿ Desde 19 de maio de 2006, data em que foi emitida a certidão de autodefinição das terras do Povoado Mesquita pela Fundação Cultural Palmares (FCP), os quilombolas de Cidade Ocidental aguardam o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTD). ¿Se não emitirem logo, vão destruir nossos recursos naturais¿, avisa a vice-presidente da Associação Renovadora dos Moradores e Amigos do Mesquita (Areme), Sandra Pereira Braga. De acordo com ela, a gerente de fauna e flora da Secretaria de Meio Ambiente de Goiás, Viviane Vieira dos Santos, concedeu licença de exploração florestal para o desmatamento de uma grande área dentro do território reivindicado pelos quilombolas. ¿Isso é loucura. Sem falar nos empreendimentos imobiliários que estão construindo na região¿, reclama Sandra, que diz ter sofrido ameaças de morte pela incansável luta pelas terras de seu povo.

Procurada pela reportagem, Viviane Vieira informou que o analista ambiental Arailson da Rocha falaria em seu nome. Questionado se a Secretaria de Meio Ambiente tem conhecimento de que a área onde foi autorizado o desmatamento pertence a uma comunidade quilombola, o técnico disse que não sabia. ¿A licença de exploração ambiental foi concedida a partir da apresentação de uma certidão de registro de imóvel, datada de 5 de maio de 2009¿, rebate. Em nome da Taquari Empresa Imobiliária, o pedido para autorização de desmatamento refere-se a uma área de 84 hectares ¿ equivalente a 84 campos de futebol ¿ de um terreno total de 276 hectares. Arailson diz que a empresa pretende construir um condomínio de casas. ¿Não recebemos nenhum comunicado da Promotoria sobre regularização de território quilombola naquela região¿, afirma o analista.

Propriedade

Com 110 anos, Antônia Pereira Braga é a mais antiga moradora do Mesquita. Em todo esse tempo que vive na região ela afirma ter sido enganada algumas vezes. ¿Já assinei documento dizendo que receberia R$ 12 mil, mas, na realidade, eles me davam apenas R$ 2 mil. O dinheiro acabava logo¿, diz ela, que é viúva. A descendente de escravo mostra a frente da casa cercada por uma grande propriedade. ¿Quando tenho que sair de casa, preciso andar um bom pedaço até chegar na pista principal¿, reclama. Antônia tem esperança que o governo regularize a área quilombola. Quem faz coro com ela é a sobrinha Vicentina Pereira, 65 anos: ¿Seria uma felicidade ter as terras de volta¿, diz.