Título: China investe na expansão internacional de suas empresas
Autor: Nakamoto , Michiyo
Fonte: Valor Econômico, 12/06/2009, Especial, p. A10

Os chineses, nitidamente, têm a sensação de que levam a pior com muita frequência. Após sofrer grandes prejuízos com seus investimentos em bancos e empresas europeias e americanas, eles parecem ter modificado suas prioridades de investimento. Agora, estão investindo crescentes parcelas de recursos dos seus fundos soberanos em suas próprias companhias, para ajudá-las em suas estratégias de expansão internacional.

Essa mudança de tática parece mais evidente no insucesso na primeira tentativa do Banco da China de adquirir uma grande participação na Compagnie Financière Edmond de Rothschild, uma das mais aristocráticas casas europeias de "private banking". O negócio parecia praticamente fechado, cerca de um ano atrás, mas as autoridades chinesas, posteriormente recusaram-se a aprovar a transação.

Um dos principais executivos do Banco da China que mais defendiam o investimento no Rothschild foi recentemente descrito por uma alta autoridade chinesa como tendo absorvido uma dose algo excessiva do "espírito de Wall Street", o que talvez explique porque Pequim não deu sinal verde ao negócio.

Os chineses ainda estão sentindo as dores do intenso choque financeiro que sua seguradora Ping An sofreu no caso Fortis, e agora parecem decididos a impedir a proposta aquisição da marca Hummer, da General Motors, pela Sichuan Tengzhong, argumentando que o negócio pode envolver riscos demais.

Curiosamente, os chineses parecem agora estar adotando táticas russas, que há muito tempo vêm usando a Gazprom como instrumento para a construção de um império econômico. Na França, por exemplo, a GDF-Suez teve de ceder uma fatia de mercado ao grupo russo no setor energético como contrapartida para assegurar seu suprimento de gás.

Os chineses, por seu turno, parecem estar centrados em sua crescente experiência nos negócios com equipamentos para telecomunicações, e parecem acreditar que o setor poderá ser sua ponta-de-lança não apenas em outros mercados emergentes, mas também na Europa e na América do Norte. Os fundos soberanos chineses estão dando apoio financeiro à Huawei, mais importante fabricante de equipamentos para telecomunicações, e à ZTE, concorrente doméstica de menor porte.

Já ficaram no passado os dias em que a China era o lugar onde se ia para terceirizar - a baixo custo e despreocupadamente - cópias de artigos pelos quais se costuma pagar uma verdadeira fortuna no Ocidente.

No mundo das telecomunicações, bem como em qualquer outro, a China tornou-se uma potência. Não apenas estão no país algumas das maiores operadoras do mundo, como também seu vibrante elenco de fabricantes de equipamentos está competindo com respeitados nomes já tradicionais no Ocidente, como Ericsson e Alcatel-Lucent.

Os altos e baixos no desempenho dessas companhias europeias abriram caminho, para os chineses, por meio dos serviços que proporcionam a sua clientela após firmar contratos.

Evidências pontuais de algumas das principais operadoras de telecomunicações da Europa sugerem ser aqui que as recém-chegadas chinesas estão começando a roubar o espetáculo - e os contratos.

Mas essas operadoras também estão preocupadas com que, a persistir essa tendência, haverá risco de que os chineses tornem-se automaticamente os fornecedores predominantes - o que poderia ter consequências preocupantes para algumas das já desafiadas companhias europeias. Isso, por sua vez, aumenta a pressão sobre empresas como a Alcatel-Lucent para que disseminem urgentemente uma melhorada - e atualmente insuficiente - cultura de serviços, para ajudar a manter os chineses a distância e felizes seus atuais consumidores.

Se os europeus não reagirem, duas coisas poderão acontecer. As Alcatel-Lucents do mundo desaparecerão, deixando o campo livre para as Huaweis e ZTEs, ou então as grandes operadoras europeias suas clientes usarão seu poder de compra para impor mudanças na administração de suas tradicionais distribuidoras domésticas.

O que está em jogo atualmente é suficientemente valioso para sugerir que a segunda hipótese poderá ser o cenário mais provável - e em futuro não muito distante.