Título: Dos juros à educação, indústria define metas para o Brasil até 2015
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2005, Especial, p. A10

Cerca de 250 líderes empresariais e consultores brasileiros decidiram sofisticar as demandas ao governo e a estratégia para aumentar a eficiência da economia. Eles passarão a aplicar um método usado no setor privado para avaliar o desempenho do país nos próximos anos. O método, chamado "balanced scorecard", usado em empresas como a Gerdau, mas adotado também pelo México presidido por Vicente Fox, inspirou a criação de um Mapa Estratégico da Indústria. Ele será divulgado no fim de março, com indicadores e metas para os próximos dez anos, em aspectos tão diversos para a competitividade do país quanto as taxas de juros, a produtividade da indústria e o desempenho educacional dos brasileiros. "Não existe solução mágica, ações isoladas que garantam o crescimento", comenta o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, um dos principais coordenadores do trabalho que levou o Fórum Nacional da Indústria a aprovar o mapa estratégico. "A vantagem do mapa é nos dar condições de acompanhar com maior transparência o que está acontecendo em relação aos nossos objetivos estratégicos", defende. Jorge Gerdau Johannpeter, um dos empresários convidados especialmente para a série de reuniões que, desde o segundo semestre do ano passado, preparou a lista de prioridades da indústria, comemora a adoção de uma ferramenta de gestão privada no trabalho político dos líderes industriais. "Antes criávamos uma numerologia e não sabíamos depois o que se passava; agora ganhamos visão estratégica", diz ele. A discussão da "visão estratégica" a que se referem os empresários fez com que eles incluíssem, pela primeira vez entre suas prioridades, a discussão sobre os rumos da educação no país, entre outros indicadores sociais, como os de distribuição de renda. Também pela primeira vez farão parte da estratégia de atuação política dos empresários o acompanhamento e discussão de indicadores de segurança pública, como o número de mortes violentas, o custo do crime para o ambiente de negócios (calculado pelo Fórum Econômico Mundial) e os índices de confiança na polícia. Antes incorporada ao discurso dos líderes do setor privado em termos vagos, a preocupação com o atraso educacional do país ganhou realce com estudos e comparações internacionais que mostram a formação da mão-de-obra como um dos principais fatores de sucesso nos países que ampliaram sua competitividade. O Fórum Nacional da Indústria, criado pela CNI com associações setoriais e federações estaduais de empresários, passará a cobrar medidas, por exemplo, para melhorar o desempenho brasileiro em testes internacionais, como o PISA, uma avaliação do desempenho de estudantes de quase 40 países feita pela Organização para Cooperação e desenvolvimento Econômico (OCDE), na qual o Brasil tem obtido os últimos lugares, atrás de países emergentes como México, Chile, Tailândia e Indonésia. "Na próxima divulgação do PISA, ele não será discutido só pelo Ministério da Educação. A indústria também vai fazer barulho", avisa o diretor-executivo da CNI, José Augusto Fernandes. No último PISA (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Alunos), os brasileiros foram os piores do mundo em matemática. O mapa estratégico da indústria aponta como meta elevar a nota média do Brasil, nas provas de matemática, ciências e leitura, dos 383 alcançados em 2003 para 486 em 2015, retirando o país da lista dos piores resultados. Mais da metade dos estudantes brasileiros não chegou, nas provas de matemática, ao nível 1 do PISA, o mínimo indicador de compreensão do assunto. Entre os pouco mais de 70 indicadores escolhidos pelos empresários, 18 deles foram selecionados como principais pontos de um programa de metas para o país. Além do PISA, serão acompanhados de perto o índice de produtividade de indústria, que mescla dados do IBGE e da CNI, os dados de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e do PIB industrial, a taxa de desemprego, a relação entre a oferta de crédito e o PIB, indicadores de juros, carga tributária, disponibilidade de infra-estrutura, de renda, bem-estar social e investimento privado em inovação. Com os indicadores, a CNI e os representantes de associações setoriais que serão responsáveis pelo acompanhamento das metas definirão os programas e ações necessários para chegar aos objetivos escolhidos pelo setor privado. Como admitem os autores do mapa, é uma "agenda carregada", com 63 "programas estratégicos", que incluem desde ação política para limitar o uso de medidas provisórias pelo governo à formulação de uma Política Nacional Contra o Roubo de Cargas, apoio ao combate à pirataria, unificação dos órgãos de defesa da concorrência, limite a gastos públicos, eliminação de gargalos do transporte, propostas de mecanismos novos de crédito e de redução do spread (taxas adicionais) cobrado pelos bancos. Os autores do mapa definem como "complexa" a estratégia de competitividade da indústria brasileira, por incluir medidas de produtividade e eficiência como "fontes primárias", o acesso a tecnologia e a qualidade da infra-estrutura como fatores "críticos" , a inovação como "essencial" e a educação e o conhecimento como "pilares" do roteiro montado pelo setor privado. Entre as metas incluídas no mapa, cerca de 10 são indicadores de percepção do empresariado, em relação à políticas públicas ou à condições de atuação do setor privado. A CNI vai elaborar, por exemplo, um indicador sobre o abuso oficial na aplicação de leis ambientais. Mas vai, também, acompanhar a evolução do número de empresas com certificação de cumprimento das normas de produção com respeito ao meio ambiente. "Vamos aperfeiçoar indicadores, modificá-los, se surgirem melhores", informa José Augusto Fernandes. "O importante é termos, de agora em diante, uma base segura para orientar nossas estratégias", ressalva Armando Monteiro Neto.