Título: Senado sugere como medir o spread
Autor: Safatle , Claudia
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2009, Finanças, p. C1

O relatório da Comissão de Acompanhamento da Crise, que será lido hoje pelo relator, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), traz uma série de recomendações para que o Banco Central mude pontos relevantes da metodologia de cálculo do spread bancário. Ao debruçar, por três meses, nos estudos para compreensão de por que os spreads no Brasil são tão elevados , os técnicos envolvidos na preparação desse trabalho para a Comissão do Senado se defrontaram com dificuldades conceituais na mensuração feita pelo BC. Segundo esses técnicos, os dados do Banco Central permitem que a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) e a Federação das Indústrias do estado de São Paulo (Fiesp) façam leituras diametralmente opostas do problema.

"Todos falam no país em reduzir o spread. Mas poucos falam em como ele é medido", constata o relatório preliminar que será apresentado hoje pela manhã na reunião da Comissão de Acompanhamento da Crise Financeira e da Empregabilidade, presidida pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ). O texto faz, também, uma análise dos impactos das políticas macroeconômicas e dos ambientes de incertezas jurídicas na formação do spread bancário.

O mesmo dilema conceitual ocorreu no início deste ano, quando houve acirrada discussão no governo sobre spread bancário - definido como a diferença entre as taxas de juros pagas na captação e cobradas na aplicação dos recursos - ocorrida entre o Banco Central e a direção do Banco do Brasil, quando o primeiro apontou que o segundo, o BB, teria liderado a elevação dos spreads após a crise financeira global, disparada em setembro de 2008. Os números colhidos pelo BC não eram referendados pelo BB, por divergências metodológicas.

Para superar essa dificuldade de se chegar a uma exata radiografia de como se mede e qual é o tamanho do spread cobrado pelos bancos no país, tido como dos mais altos do mundo, a Comissão de Crise do Senado - encarregada desse tema no acompanhamento da crise - listou um leque de recomendações para que o BC aprimore a medição dos spreads, premissa necessária para se saber que medidas aplicar para reduzir essa que é uma parte importante do custo do dinheiro no Brasil.

Entre as principais propostas, constam a sugestão para que a autoridade monetária leve em conta no cálculo do custo médio de captação dos bancos não só o do CDB, mas inclua nessa conta os depósitos com custo de captação nulo (como os à vista) e os depósitos cujo custo de captação é inferior ao do CDB (como a poupança). "Não há razão técnica ou argumento prático que recomendem a desconsideração dos depósitos à vista na formação do custo real de captação dos bancos. Ora, os depósitos à vista têm custo financeiro nulo para os bancos. Quando não são considerados, os custos financeiros dos bancos são artificialmente elevados e, consequentemente, os spreads bancários são subestimados", argumenta o relatório, que conclui: "Desconsiderar os depósitos à vista - que têm custo zero na base de captação das instituições - tem como efeito matemático a subestimação do spread bancário e, consequentemente, a subestimação da margem líquida dos bancos.

Outra questão refere-se ao cálculo dos custos administrativos dos bancos. A comissão recomenda que o BC aprimore os métodos de medição dos custos administrativos dos bancos e elimine as eventuais distorções produzidas pela metodologia de 2004, do BC, que eliminou como centro de receitas dos bancos operações rentáveis como tarifas bancárias e administração de fundos. O BC considera como fontes de receitas dos bancos as operações de créditos livres, de crédito direcionadas, de câmbio e de tesouraria.

"A possibilidade de subestimação sistemática dos custos administrativos na composição do spread bancário suscita preocupações quanto à possível desatenção da autoridade reguladora para os aspectos potencialmente prejudiciais à concorrência do processo de concentração bancária", alerta o texto.

Um terceiro aspecto que o relatório destaca é o tratamento dado aos depósitos e operações direcionadas. O relatório sugere um tratamento mais detalhado dos dados para dar transparência ao spread efetivamente cobrado pelas instituições que captam recursos direcionados. Outras propostas são, ainda, concentrar a apuração nas operações nas instituições mais representativas e ampliar o arcabouço dos estudos sobre spread, incorporando, por exemplo, uma avaliação da rentabilidade sobre o patrimônio das instituições líderes, inclusive com o uso de comparações internacionais.

O trabalho que o BC vem desenvolvendo desde 1999 é relevante e mostra a necessidade de se adotar medidas que reduzam a inadimplência, a margem líquida, os impostos e os custos administrativos dos bancos. Muitas medidas já foram tomadas para diminuir a inadimplência, mas nenhuma que induza os bancos a montarem carteiras menos arriscadas. Uma forma poderia ser, indica o relatório, tributando mais suavemente bancos que estimem corretamente a inadimplência de sua carteira. O tema é muito importante e o trabalho da comissão pode ser um ponto de partida para a retomada do debate, principalmente num momento em que os juros são os mais baixos da história recente do país.