Título: Alemanha quer acordo amplo com o Mercosul
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 04/01/2005, Brasil, p. A4
O governo alemão, um dos principais defensores da aproximação da União Européia com o Mercosul, rejeita um acordo "light" entre os dois blocos e cobra urgência na retomada das negociações para a criação de uma área de livre comércio "abrangente". Os dois lados precisam dar agilidade às discussões, mas tendo claro que a pressa não deve sobrepor-se ao conteúdo, afirma o novo embaixador da Alemanha no Brasil, Prot von Kunow. "É óbvio que cada ano representa muito para os fluxos de comércio, mas devemos priorizar o conteúdo. Queremos um acordo que seja abrangente, não light", avisa Kunow, em português perfeito, aprendido na primeira temporada no país, quando foi cônsul em São Paulo, entre 1977 e 1980. Para o embaixador, é preciso investir nas negociações entre os dois blocos porque a rodada Doha de liberalização mundial custará a apresentar resultados. "Os acordos da Organização Mundial de Comércio (OMC) não saem antes de 2006 e vão demorar muito para serem implementados", diz Kunow, que assumiu o cargo em setembro. Mais do que a inflexibilidade de parte a parte, ele responsabiliza a falta de tempo pelo fracasso das discussões. Mercosul e UE não chegaram a um entendimento até o fim de outubro do ano passado, prazo fixado para concluir as conversas. Mas o embaixador observa que as negociações só começaram, para valer, após a apresentação de um pacote de propostas em julho. Sem correria para buscar o atendimento de novos prazos, agora existem mais chances de avanços. Kunow enfatiza que, pelo menos do ponto de vista alemão, o atraso nas negociações da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) não mudam em nada a pressa ou o interesse no Mercosul. O importante é ter em mente que "comércio não é beneficência" e mais concessões devem ser postas à mesa para permitir avanços. Será mais difícil obter progresso nas negociações durante o primeiro semestre, mas ele aposta que o acordo estará concluído até o fim de 2006. Em momentos de dificuldade como o que o bloco do Sul está vivendo agora, Kunow sugere a preservação da "vontade de sucesso" e a decisão política de seguir em frente, sem recuos. "Um processo de integração tem vantagens e desvantagens", observa. "No final, as vantagens superam em muito as desvantagens. Mas é preciso fazer concessões para receber algo em troca, os benefícios não podem ser uma via de mão única." Kunow acha que o Mercosul já tem maturidade suficiente para criar mais instituições comuns e desenvolver uma espécie de "mini-Bruxelas". "O bloco poderia ter um órgão que centralizasse decisões", pensa o embaixador, elogiando a criação de um tribunal de arbitragem para conflitos comerciais. Após uma década e meia desde a queda do Muro de Berlim, em que a prioridade foi dada à unificação com a Alemanha Oriental e à abertura do Leste Europeu, os investimentos devem voltar-se com força a novas regiões. China e Índia são fortes concorrentes, mas o Brasil é alvo de elogios de governos e empresários, diz Kunow. "É o único país do mundo capaz de exportar um carro Fox à Europa por menos de 10 mil euros", afirma. Kunow terá uma agenda extensa em sua missão no Brasil. Além do fortalecimento das relações econômicas e comerciais, ele pretende reforçar o intercâmbio cultural e ressalta a importância da cooperação em meio ambiente. O programa é mediado pela UE, mas tem a Alemanha como principal financiador e já transferiu mais de US$ 250 milhões à preservação de matas brasileiras. Para Kunow, as relações Brasil-Alemanha vivem um excelente momento, "mas o mundo é dinâmico demais para dizer que as coisas estão bem e não precisamos trabalhar mais".